Da crítica ao politicismo à determinação ontonegativa da politicidade
que tomavam individualidades e situações como excepcionalidades, com o que
buscavam fazer crer que a “verdadeira política” havia sido deturpada pelos
oportunistas, ocultando a possibilidade de os representantes políticos “normais”
poderem se tornar patológicos e o fato de que a política tem na desigualdade e no
fato de ser administradora da dominação social seu pecado original.
Ao final da vida, mas sem que tenha tido oportunidade de desenvolver mais
adequadamente a reflexão, o filósofo em pauta salientava que a globalização expusera
mais explicitamente o papel ao estado, que agora era cada vez mais claramente agente
do capital. Este, uma vez posto de forma incontrastada – desde o desaparecimento
dos países pós-revolucionários do Leste europeu e congêneres –, tem dispensado a
política, evidenciando-se o predomínio do âmbito da economia em relação a esta
última, como demonstra o declínio dos estados nacionais ocorrido pelo menos
parcialmente no período final do século XX. No interior desta, a própria via colonial –
o caminho específico que o país seguiu para a instituição do capitalismo – encontrou
seu fim, configurando-se num marco de uma nova era para o país, na qual as
possibilidades futuras latejam, pejadas de contradições. Trata-se de um tema cuja
pesquisa é urgente e que demanda esforços coletivos, para que escape às avaliações
tópicas, subjetivistas ou conservadoras.
A propósito das eleições de 1989, Chasin analisava ainda uma vez as renitentes
debilidades e equívocos da esquerda – análise que concluía dizendo que esta havia
morrido. Retomou a discussão sobre as principais teorias que embasavam a atuação
da esquerda no pós-ditadura, de forma mais detalhada e em profundidade, com
especial atenção às teorias da sociologia e filosofia paulistas, por ele denominadas de
analítica paulista67. Conforme nosso pensador, uma das conquistas marxianas
67
Para ficarmos com um exemplo, citemos a crítica chasiniana a Fernando Henrique Cardoso, um dos
grandes nomes dessa corrente, feita no texto Rota e prospectiva, de 1999. De acordo com nosso autor,
FHC, em sua busca por descartar o reducionismo economicista, acabava incorrendo em um reducionismo
inverso, de vez que – tratando os “planos” econômico e social como divorciados entre si, bem como
vendo a economia e a política como “fatores” – elevava a política ao papel determinante. Dito de outro
modo, FHC fazia a “separação de faces ontológicas indissociáveis”, o “que permite, operativamente, o
encadeamento de uma ordenação aleatória ou de suficiente indeterminabilidade para que o político
possa, na armação discursiva, aparecer como determinação de última instância, ou seja, decisiva em
qualquer ordem explicativa, do que redunda o politicismo". A dura e basilar crítica chasiniana dizia
respeito, portanto, ao fato de Cardoso e cia. envidarem a separação entre a atividade sensível dos
homens – o trabalho – e a atividade suprassensível, excessivamente ressaltada, resultando do processo
uma desvinculação ontológica de fenômenos reais, uma desobjetivação, “uma reenfatização teórica da
subjetividade e de um suposto caráter arbitrário ou aleatório da lógica dos processos reais”. Tratava-
se, não menos que isso, do próprio caroço do politicismo, em torno do qual FHC desenvolvia sua teoria
e sua prática política – no caso particular desta, o politicismo era limitado pela importância da correlação
de forças para o sociólogo na presidência. Cf. CHASIN, Ad Hominem: rota e prospectiva..., op. cit., p. 17.
Verinotio
ISSN 1981- 061X v. 28, n. 1, pp. 86-122 - 2º. sem. 2022/1º. sem. 2023| 117
nova fase