Edição especial  
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A miséria brasileira  
DOI 10.36638/1981-061X.2025.30.1.757  
J. Chasin e a via colonial de objetivação do  
capitalismo: uma reflexão marxista sobre nossa  
formação sócio-histórica1  
J. Chasin and the colonial path of capitalism: a Marxist  
reflection on our socio-historical formation  
Vânia Noeli Ferreira de Assunção*  
Resumo: Apresentam-se nesse texto os  
principais lineamentos da via colonial de  
objetivação do capitalismo, tal como elaborados  
pelo filósofo paulistano J. Chasin. Expomos,  
assim, as principais determinações que Chasin  
encontrou nessa forma específica de objetivação  
capitalista, como seu caráter autocrático,  
incompleto e excludente, a subordinação ao  
capital estrangeiro e o que o autor qualificou de  
encerramento deste caminho histórico, bem  
como os dilemas postos às esquerdas nesse  
quadro.  
Abstract: This text presents the main outlines of  
the colonial path of capitalism, as elaborated by  
the philosopher from São Paulo J. Chasin. We  
expose the main determinations that Chasin  
found in this specific form of capitalism, such as  
its autocratic, incomplete and exclusionary  
character, the subordination to foreign capital  
and what the author called the closure of this  
historical path, as well as the dilemmas posed  
to the left in this context.  
Keywords: Colonial path; Brazilian socio-  
historical formation; J. Chasin (1937-1998);  
Bonapartism; autocracy.  
Palavras-chave: Via colonial; formação sócio-  
histórica brasileira; J. Chasin (1937-1998);  
bonapartismo; autocracia.  
Aqui, tudo parece que é ainda construção  
E já é ruína  
Caetano Veloso, sobre Claude Lévi-Strauss  
O paulistano J. Chasin (1937-98) foi um filósofo e professor universitário  
marxista. Pesquisador do tema da marxologia, da politicidade e da ontologia,  
comparece nesta coletânea pela sua elaboração da noção de via colonial de entificação  
do capitalismo, apresentada em artigos publicados dos anos 1970 aos 1990 e  
1
Resultante de curso oferecido pelo canal no YouTube do Grupo de Estudos Marxistas da UFF Rio  
das Ostras durante o período da pandemia, este texto foi publicado originalmente na coletânea  
Pensando o Brasil (ASSUNÇÃO; MELO; JIMENEZ, 2023). A autora agradece imensamente a Ângela Maria  
Sousa e Ester Vaisman pelos argutos comentários a versões anteriores deste texto.  
*
Professora da Universidade Federal Fluminense (UFF Rio das Ostras) e coeditora da Verinotio –  
Revista on-line de Filosofia e Ciências Humanas. E-mail: vanianoeli@uol.com.br. Orcid: 0000-0003-  
4119-9987.  
Verinotio  
ISSN 1981 - 061X Edição especial: A miséria brasileira; v. 30, n. 1 jan.-jun., 2025  
nova fase  
   
Vânia Noeli Ferreira de Assunção  
posteriormente coligidos no livro A miséria brasileira (1964-1989): do golpe militar à  
crise social, lançado após seu falecimento precoce. Infelizmente muito pouco  
conhecido no Brasil do século XXI, o autor em pauta é um pensador fundamental para  
a compreensão deste país.  
Chasin dedica sua vida a duas tarefas complementares, indissociáveis e  
retroalimentadas: a redescoberta de Marx em particular, a recuperação do estatuto  
ontológico da sua obra e a determinação ontonegativa da politicidade (cf. CHASIN,  
2000a) e a compreensão da particularidade da entificação capitalista no Brasil. Neste  
texto, trataremos apenas do último tema, ou seja, nosso objetivo é expor as suas  
principais descobertas sobre a formação social brasileira. Tal será feito de forma  
introdutória, mas completa, permitindo ao leitor ter uma visão geral da reflexão  
chasiniana sobre a matéria.  
Assinale-se que, bem distante de resultar de uma mera curiosidade  
enciclopédica, a aproximação chasiniana do tema da via colonial deveu-se a embates  
prático-teóricos efetivos, no interior dos quais se fazia necessária análise e tomada de  
posição em face de cenários específicos. Desta maneira, o assunto é tratado em  
variados textos, escritos no decorrer de aproximadamente 30 anos e nos quais houve  
níveis de aproximação diferentes e significativas mutações do próprio objeto, a  
realidade brasileira. Sem acompanhar em detalhe as mudanças socioeconômicas e o  
amadurecimento teórico de Chasin no trato do assunto, optamos aqui pela exposição  
apenas dos principais momentos relativos ao tema em tela, tomando como ponto de  
partida seu momento mais desenvolvido.  
Chasin, inspirando-se em Marx, busca entender o caminho específico pelo qual  
o capitalismo se objetivou no Brasil, concluindo que este tinha sido diferente daquele  
dos países ditos clássicos (a exemplo de França e Inglaterra) e dos chamados países  
retardatários (como Alemanha e Itália, de via prussiana), dessemelhanças que  
obrigavam à destilação de uma nova categoria: a via colonial de entificação do  
capitalismo, assunto deste texto.  
Antes, porém, de adentrar no tema propriamente dito, apresentamos ao leitor  
alguns momentos importantes da vida de Chasin. Em seguida, introduzimos o assunto  
com um brevíssimo apontamento preliminar acerca da questão das formas de  
objetivação do capitalismo e da relação entre universal e particular. Por fim, nos  
tópicos seguintes discutimos aspectos da via colonial (que são inextricáveis, separados  
aqui apenas para fins didáticos): a industrialização e a constituição de um capital  
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J. Chasin e a via colonial de objetivação do capitalismo  
atrófico, as formas de dominação burguesa, a incompletude das classes e as  
dificuldades da esquerda e, por fim, o encerramento da via colonial no processo de  
globalização.  
1. J. Chasin: momentos biográficos de uma trajetória ímpar  
A formação universitária de José Chasin (nascido em São Paulo, no dia 6 de  
janeiro de 1937) se iniciou em 1959, quando ingressou no curso de filosofia da antiga  
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, onde foi aluno  
de professores como João Cruz Costa, José Arthur Giannotti, Gilles-Gaston Granger e  
Michel Debrun. Ali, teve uma inserção no Partido Comunista (PCB), ainda que pontuada  
por divergências, e participou do movimento estudantil, inclusive tornando-se vice-  
presidente da Campanha pela Defesa da Escola Pública (presidida por Florestan  
Fernandes), enquanto representante da União Nacional dos Estudantes (UNE). Pouco  
antes de concluir a graduação, em 1962, aos 25 anos, coordenou uma pesquisa acerca  
do I Congresso Nacional dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas ocorrido em Belo  
Horizonte (1961). Neste período, Chasin estava próximo de Caio Prado Jr., que o  
influenciou decisivamente na compreensão da formação sócio-histórica brasileira.  
Chasin se tornou professor na Escola de Sociologia e Política de São Paulo em  
1972. Por esse período, tomando como inspiração A destruição da razão de G. Lukács,  
passou a estudar um dos fenômenos ideológicos típicos do Brasil, o integralismo.  
Numa pesquisa que rastreou e fez a análise imanente de toda a obra do líder  
integralista Plínio Salgado, incluindo a literária e os discursos políticos, o filósofo  
paulistano buscou compreender a gênese, a determinação e a função sociais do  
pensamento pliniano no Brasil dos anos 1930. Neste trabalho ele se afastava da  
análise tradicional, que tomava (com base em semelhanças no plano da aparência) o  
integralismo por uma mera cópia do fascismo europeu, demonstrando que não só o  
discurso integralista pliniano tinha características completamente diferentes daquelas  
do nazi-fascista como as suas raízes sociais eram totalmente díspares. A ausência do  
elemento racial e o distanciamento da agressividade conquistadora imperialista –  
substituída pela regressividade a um passado idílico e por uma postura anticapitalista  
romântica típicas de um país colonizado e com forte presença da grande propriedade  
rural eram duas das maiores diferenças entre o ideário do líder integralista e o nazi-  
fascista. A tese O integralismo de Plínio Salgado: forma de regressividade no  
capitalismo hiper-tardio (1999), orientada por Mauricio Tragtenberg (um amigo leal  
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durante toda a vida de Chasin), foi defendida em 1977 na Escola de Sociologia e  
Política. A banca julgadora, da qual participou Antonio Candido, reconheceu o rigor e  
o brilhantismo do trabalho.  
Após um autoexílio de quase dois anos em Moçambique, aonde foi por ser  
então sua única oportunidade de trabalho, em 1980 Chasin se tornou professor na  
recém-fundada Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Ali, foi presidente da  
Associação dos Docentes (Adufpb) e membro do comando nacional da greve de 1980,  
a primeira grande greve das instituições federais de ensino superior. Contribuiu para  
a estruturação na região Nordeste da Sociedade de Estudos e Atividades Filosóficas  
(Seaf), entidade que era um importante fórum de debates à época. Também participou,  
em 1983, em Diamantina, da criação da Associação Nacional de Pós-Graduação em  
Filosofia (Anpof), de cuja diretoria foi membro duas vezes.  
No final dos anos 1980, já trabalhando na Universidade Federal de Minas Gerais  
(UFMG), criou o grupo de pesquisa Marxologia: Filosofia e Estudos Confluentes e veio  
a orientar pesquisas sobre a formação e o amadurecimento do pensamento marxiano,  
num projeto coletivo de grande envergadura.  
A busca de estudar e compreender a realidade brasileira e o marxismo o levou  
à editoria diversas vezes durante sua vida. Ele acreditava que o desenvolvimento de  
pesquisas rigorosas e a sua divulgação deveriam ser feitas simultaneamente e por  
canais próprios. Daí que tenha criado, juntamente com seu irmão, a editora Senzala2,  
que acabou falindo em 1968. Em 1977, junto com Nelson Werneck Sodré e outros  
teóricos significativos, fundou a revista Temas de Ciências Humanas.  
Já em 1984 veio à luz a Ensaio, um movimento de ideias articulado em três  
fundamentos: a produção teórica rigorosa, com a recusa e a crítica das objetivações  
materiais e espirituais do capital, do marxismo vulgar e da nova esquerda; a divulgação  
do resultado das pesquisas; e a orientação teórico-prática metapolítica, que tomava  
como norte a emancipação revolucionária do gênero humano (e poderia, futuramente,  
dar origem a um agrupamento partidário). O coletivo de pesquisas, a editora3 e a  
Revista Ensaio eram, assim, elementos de um mesmo projeto, em prol da compreensão  
2 Por esta editora foram publicados Marxismo ou existencialismo (1967), de G. Lukács, Navalha na carne  
(1967), de Plínio Marcos, e Hai-kais (1968), de Millôr Fernandes, entre outros títulos.  
3 A Ensaio publicou obras de István Mészáros (Filosofia, ideologia e ciência social, O poder da ideologia  
e outros); Ernest Mandel (A crise do capital), Victor Serge (O ano I da Revolução Russa), Heinrich Mann  
(A juventude do rei Henrique IV) e Goethe (Os anos de aprendizado de Wilhelm Meister), entre muitos  
outros.  
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J. Chasin e a via colonial de objetivação do capitalismo  
rigorosa e da transformação radical da realidade. Nesse período, articulou-se em torno  
de Chasin um grupo de pesquisas de fôlego sobre o movimento operário-sindical e  
sobre vertentes do pensamento conservador aqui existente (em particular, os que  
foram elaborados durante a última ditadura), o que contribuiria para a compreensão  
da formação sócio-histórica brasileira, bem como sobre o legado ontológico de Marx  
Em 1997, depois da inviabilização da Editora Ensaio, Chasin criou a Estudos e  
Edições Ad Hominem e a revista Ensaios Ad Hominem, às quais se dedicava quando  
faleceu precocemente, em 31 de dezembro 1998, em Belo Horizonte, vítima de um  
ataque cardíaco.  
2. A relação das sociedades locais com o sistema capitalista global4  
Argumentando que o reconhecimento e o estudo das formas particulares de  
objetivação do capitalismo estiveram presentes em Marx da juventude às últimas  
obras, Chasin, em sua busca de desvendar o Brasil, faz um movimento de retorno ao  
filósofo alemão. Para este, em sua época, nos países europeus e nos por estes  
colonizados, a sociedade era capitalista, em estágios mais ou menos desenvolvidos,  
conforme uma série de processualidades históricas; e o estado, embora mudasse de  
fronteira para fronteira, era sempre determinado pela sociedade civil. De forma que “a  
sociedade pode se apresentar mais ou menos desenvolvida do ponto de vista  
capitalista, mais ou menos expurgada de elementos pré-capitalistas, mais ou menos  
modificada pelo processo histórico particular de cada país” (CHASIN, 2000, p. 38).  
Fundamenta, assim, a ideia de que não há um só caminho de efetivação do capitalismo,  
de que este modo de produção não é um estêncil do qual se faz uma nova cópia numa  
folha em branco, idêntica ou com apenas pequenas alterações, mas é “uma totalidade  
anatomicamente ordenada e em processo, apta e obrigada a colher o particular  
concreto” (CHASIN, 2000, p. 38). Dessa maneira, “há modos e estágios de ser, no ser  
e no ir sendo capitalismo, que não desmentem a universalidade de sua anatomia, mas  
que a realizam através de objetivações específicas” (CHASIN, 2000, p. 13).  
Ele também critica duramente as tentativas marxistas de apreensão da  
especificidade do capitalismo brasileiro até então existentes que ora generalizavam  
acriticamente as características universais do capitalismo aqui como alhures, ora  
4
Dado o caráter introdutório deste texto, não nos deteremos nos fundamentos filosóficos do debate  
sobre a relação universal, particular e singular, senão que apenas abordaremos os elementos  
estritamente necessários para a compreensão do tema que nos propusemos a expor (cf. CHASIN, 2021).  
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superevidenciavam as singularidades, negligenciando os liames com a universalidade.  
Afasta-se, por isso, dessas interpretações, nas quais “a relação entre universal e  
singular (...) se mostra[va] como uma relação entre categorias exteriores uma à outra”,  
que confundiam singularidade concreta com dado empírico, não compreendiam o que  
é o universal concreto e desprezavam os caracteres ontológicos por desconhecerem  
a categoria da particularidade, que faz a mediação real entre universal e singular  
(CHASIN, 2000, p. 12-3).  
O autor em pauta desenvolve, a partir de Marx, a ideia de que o capital industrial  
era até então a forma matrizadora do regime capitalista, era o motor das  
transformações nas sociedades havia mais de 150 anos e o seu domínio é que  
instaurava o “verdadeiro capitalismo”. As vias de objetivação do capitalismo são  
justamente formas específicas pelas quais este se pôs, alavancado pelo processo de  
industrialização. De maneira que se atingem os nódulos centrais de cada formação  
social capitalista quando se analisa como se deu seu processo de industrialização, ou  
seja, seu ritmo e intensidade ao longo do tempo, seus vínculos com outras esferas da  
produção da vida e o modo como procederam os diferentes agentes sociais diante de  
tais demandas. Enfim, trata-se de avaliar o modo e a cadência do desenvolvimento das  
forças produtivas a partir do momento em que emerge o capital em sua forma  
“verdadeira”, a industrial.  
Apenas para ilustrar aqui o mais fundamental da questão (cujo aprofundamento,  
embora necessário, ultrapassa os objetivos deste texto), lembremos as muitas  
comparações feitas por Marx no tocante à história de países como Inglaterra, França e  
Estados Unidos, de um lado, e a alemã, de outro. Nos primeiros, países que  
percorreram a via clássica5 ao capitalismo, a burguesia assumira o papel de  
representante dos interesses universais das classes subjugadas sob o feudalismo e  
realizara uma revolução, e seu triunfo significara não a vitória de uma classe específica  
sobre o antigo sistema político, mas a instituição de todo um novo sistema social. A  
5
Conforme Chasin, tais caminhos são clássicos “porque mais coerentes, mais congruentes ou  
consentâneos, no plano da sua própria totalidade, enquanto totalidade capitalista, na qual as diversas  
partes fundamentais imbricam entre si e em relação ao todo de forma mais amplamente orgânica”  
(CHASIN, 2000, p. 43). Por isso, em suas obras econômicas Marx se ocupou mais detalhadamente da  
forma de objetivação do capitalismo que se pode denominar clássica muito especialmente, a do  
capitalismo inglês , tendo em vista o desenvolvimento normal do capitalismo que ocorreu ali, quer  
dizer, no qual não houve obstáculos ou impedimentos postos externamente e que o tivessem impedido  
ou deturpado. A classicidade de uma fase de desenvolvimento se refere, pois, a que tal transcurso tenha  
se dado de forma mais pura e nítida, sem que houvesse a contaminação por elementos a ele estranhos,  
o que possibilita levar a configuração de tais processos e das suas relações a sua máxima potência.  
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burguesia efetivara suas tarefas históricas ainda nos séculos XVII (Inglaterra) e XVIII  
(França), com a realização concreta de uma economia e uma sociedade capitalistas,  
mutuamente articuladas, organicamente estruturadas em sua interdeterminação e na  
integralidade de sua condição (CHASIN, 2000, p. 216), estabelecendo sua dominação  
econômica e política “na identidade formal da soberania popular” (CHASIN, 2000, p.  
158).  
Coisa distinta ocorreu em países retardatários, como Alemanha, Itália e Japão,  
típicos da via prussiana. Chasin toma por base principalmente a análise feita por Marx  
do seu país natal, a Alemanha, cujos dilemas o filósofo de Trier sintetizou na expressão  
miséria alemã. Aborda, dessa maneira, o atraso do processo histórico alemão (sua  
industrialização se iniciou já em meados do século XIX e só se acelerou com a  
unificação, em 1871), a ausência de revoluções e, portanto, o seu caráter conciliador  
com a antiga ordem, engendrando uma situação que era a combinação de novos e  
velhos males, de regressão e desenvolvimento. Chasin recorre também aos estudos  
acerca da via prussiana feitos por Engels, que salientava como a burguesia prussiana  
se impôs sem um processo revolucionário, tendo renunciado ao poder político,  
estabelecendo-se por meio de concessões e acordos com as classes representantes da  
antiga ordem e excluindo as grandes massas, dominadas pela força. Ainda assim, foi  
capaz de dar acabamento às suas tarefas econômicas, completando a industrialização,  
com uma importante indústria de base. Em suma, a “burguesia prussiana é  
antidemocrática, porém autônoma”, quer dizer, “realiza um caminho econômico  
autônomo, centrado e dinamizado pelos seus próprios interesses” (CHASIN, 2000, p.  
104). Nosso autor remete, ainda, a Lênin no que diz respeito às diferentes formas de  
resolução da questão agrária, para comentar a manutenção da grande propriedade  
rural alemã na transição para o capitalismo. E sintetiza os principais caracteres da via  
prussiana, segundo os autores clássicos: desenvolvimento do capitalismo de forma  
tardia, lenta, resistente ao progresso e conciliada entre os representantes da sociedade  
nascente e os daquela em desaparição, portanto, na ausência de uma ruptura  
revolucionária que incluísse as categorias sociais subalternas, de maneira que a  
sociedade sofreu formas de dominação heteróclitas, que combinavam iniquidades de  
várias formas de estado.  
Chasin, como outros autores, chama a atenção para as similitudes de tais  
caracteres com o caso brasileiro. Assim, “no afã de tracejar um contorno interpretativo  
geral do caso brasileiro”, afirma, “é precisamente enquanto modo particular de se  
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constituir e ser capitalismo que o caminho prussiano tem para nós importância teórica  
básica” (CHASIN, 2000, p. 15). Nunca, entretanto, como modelo, mas como uma via  
histórica concreta de objetivação do capitalismo, como a nossa, contrastante com a  
clássica. Quais eram as determinações mais gerais que aproximavam as duas formas  
não clássicas de objetivação do capitalismo mencionadas?  
(...) tanto no Brasil quanto na Alemanha, a grande propriedade rural é  
presença decisiva; de igual modo, o reformismo pelo alto”  
caracterizou os processos de modernização de ambos, impondo-se,  
desde logo, uma solução conciliadora no plano político imediato, que  
exclui as rupturas superadoras, nas quais as classes subordinadas  
influiriam, fazendo valer seu peso específico, o que abriria a  
possibilidade de alterações mais harmônicas entre as distintas partes  
do social. Também nos dois casos o desenvolvimento das forças  
produtivas é mais lento e a implantação e progressão da indústria,  
isto é, do “verdadeiro capitalismo”, como distinguia Marx, do modo  
de produção especificamente capitalista, é retardatária, tardia,  
sofrendo obstaculizações e refreamentos decorrentes da resistência  
de forças contrárias e adversas (CHASIN, 2000, p. 15-6).  
Temos, pois, que há importantes traços comuns entre as formações sócio-  
históricas que objetivaram o capitalismo pela via prussiana e o Brasil. É, contudo, pela  
via do contraponto que Chasin avança na reflexão sobre o caso brasileiro. Isso porque,  
inobstante os avizinhamentos entre os dois caminhos, havia dessemelhanças que os  
distanciavam radicalmente. De fato, as características apontadas como análogas  
referem-se a abstrações razoáveis, que nos aproximam dos objetos de estudo,  
destacando e fixando elementos comuns, mas não esgotam o seu entendimento. Isto  
porque estes são “um conjunto complexo, um conjunto de determinações diferentes e  
divergentes”, “síntese de várias determinações”, tornando-se decisivo para sua  
apreensão conhecer a forma como se singularizam em formações específicas.  
Nesse mister, Chasin frisa as grandes distinções entre os casos prussiano e  
brasileiro tão grandes que mais os distanciam dos casos clássicos do que os  
aproximam entre si. Assim, a gênese da grande propriedade mencionada é totalmente  
distinta (na Alemanha, o latifúndio feudal; no Brasil, a empresa colonial, numa  
economia mercantil). Bem assim, se ambos passaram a trilhar o caminho da  
industrialização tardiamente em comparação aos países clássicos, a industrialização  
germânica ocorreu ainda no século XIX, foi rápida e completa, alçando o país ao  
panteão imperialista; em Terra Brasilis, por sua vez, a industrialização ocorreu  
tardiamente em relação à própria Alemanha, já num contexto de guerras imperialistas  
(a partir de 1930). E a burguesia prussiana manteve-se autônoma neste processo, bem  
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J. Chasin e a via colonial de objetivação do capitalismo  
ao contrário do que ocorreu no caso brasileiro. De sorte que, insiste Chasin, não há  
justificativa possível para equiparar a situação de países como Alemanha, Itália e Japão  
– “elos débeis da cadeia imperialista, portanto fenômenos do capitalismo altamente  
avançado, entidades da fase superior do capitalismo” – à do Brasil na mesma quadra  
histórica, momento crucial do seu processo de industrialização, quando era objeto da  
disputa interimperialista (CHASIN, 2000, p. 58).  
Continuando a comparação entre Brasil e Alemanha, no caminho para o  
progresso histórico-social, palmilhado por ambos de forma irregular, intermitente e  
lenta, carregam os dois um pesado encargo, contudo, essa herança do passado era  
bastante distinta. E não se tratava de um mero atraso cronológico, que poderia ser  
superado com o tempo, antes ao contrário, em tal situação, o retardamento histórico  
significava estar em outro patamar histórico:  
Enquanto a industrialização tardia se efetiva num quadro histórico em  
que o proletariado já travou suas primeiras batalhas teóricas e  
práticas, e a estruturação dos impérios coloniais já se configurou, a  
industrialização híper-tardia se realiza já no quadro da acumulação  
monopolista avançada, no tempo em que guerras imperialistas já  
foram travadas, e numa configuração mundial em que a perspectiva  
do trabalho já se materializou na ocupação do poder de estado6 em  
parcela das unidades nacionais que compõem o conjunto  
internacional. Ainda mais, a industrialização tardia, apesar de  
retardatária, é autônoma, enquanto a híper-tardia, além de seu atraso  
no tempo, dando-se em países de extração colonial, é realizada sem  
que estes tenham deixado de ser subordinados das economias  
centrais. (CHASIN, 2000, p. 34)  
Híper-retardatário, o capitalismo brasileiro, na sua forma propriamente  
industrial, tornou-se realidade em circunstâncias históricas nas quais as lutas de  
classes já estavam bem avançadas não só em relação às dos países clássicos, mas  
inclusive comparativamente àquelas que ocorreram no momento da industrialização  
dos países de via prussiana. Diferentemente da alemã, tardia mas completa, a  
industrialização brasileira nunca se completou, o que teve repercussões amplas e  
determinou que o capital aqui presente não tenha se posto em sua figura integral e  
organicamente articulada em seus diversos elementos. Ademais, as classes dominantes  
brasileiras nunca romperam sua subordinação aos centros hegemônicos,  
6 Trata-se, aqui, de uma situação em que o poder de estado foi reivindicado em nome da classe operária,  
mas que acabou sendo voltado contra ela. Ainda jovem, Chasin já é crítico do stalinismo. Depois atesta  
o fracasso das transições intentadas no Leste Europeu e congêneres, embora tenha tido graus diversos  
de amadurecimento em relação ao tema, ao tempo que reafirma até o fim da vida a necessidade histórica  
e a possibilidade objetiva da revolução social, em prol da emancipação humana (cf. CHASIN, 2017).  
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diferentemente de sua congênere alemã.  
Chasin frisa, dessa forma, a necessidade de compreender a especificidade da  
objetivação do capitalismo nos países subordinados. Em seus termos:  
Na medida em que um país de economia subordinada não é distinto  
dos países subordinantes simplesmente em grau; na medida em que  
sua estrutura e seu processo histórico são de natureza apropriada e  
decorrente à sua condição de subordinado, seus fenômenos  
particulares não podem ser simplesmente igualizados aos fenômenos  
de aspecto semelhante que se verificam nos países dominantes.  
(CHASIN, 1977a, p. 134)  
Dessa maneira, em face das abissais discrepâncias entre os países de via  
prussiana e o Brasil, ressalta Chasin, é forçoso reconhecer não uma, mas ao menos  
duas formas particulares não-clássicas de objetivação do capitalismo, a via prussiana  
e aquela percorrida pelo Brasil, que ele denomina via ou caminho colonial. Nesta  
expressão que combina a dimensão histórico-genética (relativa às origens da  
formação social brasileira) e as interdeterminações categoriais , o adjetivo “colonial”  
diz respeito à subordinação estrutural, e não à política ou cultural. Chasin destaca,  
ainda, que, tal como cunhada, ou seja, como particularidade da objetivação do  
capitalismo quer dizer, enquanto mediação objetiva entre a universalidade do  
capitalismo e sua efetivação singular –, a via colonial segue o oposto da “‘criação’ de  
novos universais, tal como se dá quando, a colonial, se antepõe modo de produção”  
(CHASIN, 2000, p. 17).  
Por fim, observa, identidade nacional é algo distinto de aspectos pitorescos no  
campo cultural ou social, está associada à “equação relativa à produção e reprodução  
das categorias sociais que a integram(CHASIN, 2000, p. 220-1). Para compreender  
a identidade nacional brasileira, vamos, então, perscrutar a produção e reprodução  
social efetivada em seu seio.  
3. Contradições, intermitências e incompletude da objetivação do capitalismo  
industrial no Brasil7  
A industrialização brasileira foi um processo que teve vários adventos e surtos  
desde o século XIX, os quais inicialmente não prosperaram, depararam-se com diversos  
óbices e foram objeto de desacordos e oposições. Ademais de híper-tardia, a  
7 Neste item, esperamos desfazer confusões e restabelecer a especificidade do pensamento chasiniano  
em relação a outros autores que trataram do tema da formação nacional, indo, portanto, em direção  
diferente daquela que tomamos em texto anterior (“Constituição do capitalismo industrial no Brasil: a  
via colonial”, publicado em 2002).  
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J. Chasin e a via colonial de objetivação do capitalismo  
entificação do capital industrial no Brasil “atravessou toda a primeira metade deste  
século [XX] em tentativas e contramarchas” e permaneceu incompleta (CHASIN, 2000,  
p. 34). Tais dificuldades deitam raízes na configuração econômica existente no país,  
de caráter agroexportador.  
Recorrendo a Francisco de Oliveira e Caio Prado Jr., Chasin explica que o Brasil  
havia se especializado na produção de algumas poucas mercadorias agrárias, e dentre  
estas daquelas exportáveis, cujo valor se realizava externamente. Aprofundando-se  
essa opção, com base na falácia da “vocação agrária” do país, gerou-se um círculo  
vicioso, segundo o qual a realização do valor na economia agroexportadora dependia  
do financiamento externo, e este implicava a manutenção da mesma forma de  
produção do valor, agroexportadora. Era necessária a reiteração do círculo vicioso da  
intermediação comercial e financeira externa para que o processo pudesse ter  
continuidade, implicando, por exemplo, a desatenção ao mercado interno. O que foi  
levado a tal ponto que as exigências desse mecanismo passaram a corroer todo o valor  
produzido pelo sistema agroexportador, consumido no processo de intermediação  
comercial e financeira estrangeira, porquanto, na distribuição do mais-valor entre  
lucros internos e lucros e juros externos, estes últimos foram largamente favorecidos  
(CHASIN, 2000, p. 56).  
Gastava-se, nesse mister, a maior parte do excedente social produzido pela  
totalidade do sistema econômico, na medida em que se transferiam recursos e rendas  
dos demais setores econômicos para o agroexportador. De maneira que os princípios  
da economia agroexportadora a inviabilizavam e, concomitantemente, bloqueavam o  
avanço da divisão do trabalho na direção do capitalismo industrial e, por conseguinte,  
o desenvolvimento das forças produtivas. Em síntese, a economia agroexportadora  
estava estruturada em prol dos interesses das burguesias subordinantes e direcionada  
para o exterior, de maneira que não houve uma acumulação interna revertida para a  
consubstanciação das bases necessárias à industrialização. Assim, as duas fases, a do  
auge e a da inviabilização da economia agroexportadora, significaram um bloqueio ao  
avanço do capitalismo industrial no Brasil, num quadro de subordinação ao  
imperialismo, mormente o inglês.  
O grande período de expansão da ordem agroexportadora havia sido  
subitamente interrompido e descambado em crise acelerada a partir de 1930. Apenas  
nesse contexto de auge e crise subsequente da economia agroexportadora (e do  
desequilíbrio crônico das contas externas do país) é que se tornaram necessárias  
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atividades econômicas alternativas, uma das quais veio a ser a indústria (CHASIN,  
2000, p. 56-7). Ou seja, o fim da hegemonia agroexportadora só veio a se pôr no  
horizonte na terceira década do século XX, quando se deu início definitivo à (várias  
vezes intentada) industrialização, e nos anos 1950, à predominância da estrutura  
produtiva urbano-industrial. Trata-se, pois, de um processo ultrarretardatário mesmo  
com relação aos países de capitalismo tardio, que naquela quadra já estavam  
envolvidos em contendas imperialistas. O Brasil, que ainda estava em estágio  
incipiente no tocante ao modo de produção estritamente capitalista, fazia parte  
justamente do território em disputa.  
A modernização da economia brasileira antes agroexportadora, agora  
industrial não alterou, entretanto, a lógica da produção determinada pelo exterior, a  
associação subordinada da burguesia nacional à estrangeira e a produção para um  
mercado interno restrito, com base na superexploração do trabalho. Exemplifique-se  
com o (mal) chamado “milagre econômico”, um “surto” econômico de crescimento dos  
que (como as ditaduras), longe de serem excepcionais, “fazem parte, lamentavelmente,  
do que há de mais característico, profundo e dominante da nossa formação histórica”  
(CHASIN, 2000, p. 59). Centrado na produção de produtos para exportação e/ou  
consumo das classes médias urbanas, em condições de carência de bases internas que  
lhe permitissem crescer autonomamente, implicou “concomitante, irreversível e  
determinantemente” a importação dos bens de produção e outros não produzidos  
internamente (CHASIN, 2000, p. 65). De fato, aduz Chasin, com uma boa dose de  
ironia, a formação e estrutura coloniais do país foram conservadas sob diferentes  
formas, com maior ou menor grau de complexificação, desde o “milagre” da exploração  
açucareira colonial, passando pelo da mineração, do café e, finalmente, o “milagre” da  
industrialização de 1968-73, o mais curto de todos, que alcançou muito rapidamente  
a inviabilização com os próprios pressupostos (CHASIN, 2000, p. 60).  
A via colonial de objetivação do capitalismo é marcada, antes de tudo o mais,  
pelo “estabelecimento da existência societária do capital sem interveniência de  
processo revolucionário constituinte”, característica que “é responsável por traços  
fundamentais do modo de ser e de se mover da formação nacional” (CHASIN, 2000,  
p. 220). “Toda revolução para ele é temível, toda transformação uma ameaça, até  
mesmo aquelas que foram próprias de seu gênero.” (CHASIN, 2000, p. 169) Sem a  
organicidade proporcionada por um processo revolucionário, o que constituiu o Brasil  
foi uma unidade territorial e linguística cuja subsunção formal ao capital se deu por  
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meio de uma sociedade escravista, radicalmente excludente e exploradora, inorgânica,  
desagregada, sem identidade econômica ou cultural, a que unia apenas uma ilusória  
autonomia política. Inserida nos processos de universalização do capital, foi  
experimentando o cosmopolitismo ao tempo que se mantinha provinciana,  
subnacional.  
Saliente-se, em acréscimo, a essência parasitária do capital atuante no país, “um  
aventureiro que abomina riscos e nunca os assume, e se acredita sempre no direito de  
ser financiado”, “sempre disposto (...) a se apropriar dos lucros e a impor a socialização  
dos prejuízos” (CHASIN, 2000, p. 170). Consoante tal inclinação íntima, este capital  
atribuiu frequentemente ao estado a realização dos pressupostos ao capitalismo,  
adquirindo o péssimo sestro de transferir para o estado os investimentos mais pesados  
e as atividades que não gerassem lucro líquido e certo num prazo relativamente curto,  
incluindo aí a indústria de base. As burguesias que se objetivaram pela via colonial,  
acomodadas à mesquinhez de sua situação, não realizaram as tarefas econômicas que  
as burguesias clássicas e prussianas levaram a cabo. Foi, pois, o estado que aqui atuou  
para firmar os fundamentos de uma economia capitalista, socializando eventuais  
prejuízos e privatizando lucros.  
Chasin adita um importantíssimo elemento, lembrado por Florestan Fernandes:  
na periferia, a acumulação se dá pela articulação da sucção da riqueza e dos recursos  
naturais e humanos ali existentes levada a efeito por mecanismos complexos e  
estrategicamente localizados nos setores e estruturas mais avançados e produtivos –  
com a institucionalização de taxas de mais-valor altíssimas. Estas são necessárias  
porque o excedente econômico passa por uma apropriação dual, qual seja, precisa  
abastecer simultaneamente as burguesias externa e interna sendo que para esta  
última resta uma parcela muito menor do espólio. De maneira que o ônus da  
acumulação de capital é carregado pelos países periféricos, enquanto os efeitos  
multiplicadores são absorvidos pelas economias centrais (CHASIN, 2000, p. 167).  
Entretanto, longe de se revoltar com tal situação, amplas frações burguesas do capital  
atrófico perceberam a própria fraqueza e subsumiram conscientemente ao estrangeiro,  
aceitando seu papel de sócio menor.  
No Brasil, de fato, a burguesia nasceu e cresceu à sombra de suas congêneres  
metropolitanas e “não é capaz de perspectivar, efetivamente, sua autonomia  
econômica, ou o faz de um modo demasiado débil”, é “incapaz, por iniciativa e força  
próprias, de romper com a sua subordinação ao imperialismo(CHASIN, 2000, p. 103-  
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4). Em suma, a incompletude do capital perfaz também a tibieza conata das categorias  
sociais que engendra, a qual se manifesta especialmente mas não se limita a ela –  
na burguesia, “classe que em seu bojo supostamente deveria ocupar o espaço  
hegemônico” (CHASIN, 2000, p. 34).  
Nesse cenário, em que “a evolução nacional é reflexa, desprovida  
verdadeiramente de um centro organizador próprio, está implicada a “própria  
excludência do progresso social” (CHASIN, 2000, p. 221). De fato, dinâmica a ponto  
de estar entre as maiores economias do mundo o que é antes um “índice da pobreza  
da maioria das nações” –, a economia brasileira também é campeã em miséria social  
(CHASIN, 2000, p. 167). Aqui, as categorias sociais não foram organicamente inseridas  
num projeto de integração nacional proveniente do capital, pelo contrário, a própria  
constituição deste implicava a exclusão de vastos contingentes populacionais. Sua  
própria compleição levava o capital atrófico ao pagamento de salários abaixo do seu  
valor histórico, à superexploração do trabalho que acarretava o pauperismo  
generalizado. Em outros termos, a exclusão social, que se ampliava na mesma medida  
em que a economia se tornava mais moderna e complexa (já que esta atualizava as  
mesmas características essenciais enquanto crescia e se complexificava), era  
consequência inevitável desse mecanismo. Os assim chamados excluídos são, portanto,  
produto genuíno da produção brasileira, do capital atrófico, “que reitera de modo  
particularmente agigantado a lógica intrínseca de todo capital: a produção em paralelo  
de imensa riqueza e de imensa miséria” (CHASIN, 2000, p. 166).  
Sintetizando em poucas palavras, à via colonial de efetivação do capitalismo é  
inerente o estrangulamento da potência autorreprodutiva do capital, a limitação  
acentuada da sua capacidade de reordenação social e a redução drástica da sua força  
civilizatória”, mantendo em irresolução crônica as questões mais elementares, a  
contradição estrutural entre o capital e o trabalho” (CHASIN, 2000, p. 221). Muitos  
dos que se debruçaram sobre a extrema desigualdade social brasileira deixam de  
apreendê-la como resultante da prática fundante da superexploração do trabalho e  
propuseram como solução mecanismos distributivos, desconsiderando a inter-relação  
dialética entre produção, distribuição, circulação e consumo (que tem na produção seu  
momento preponderante). A reprodução ampliada da miséria brasileira é, porém,  
resultante da forma como a produção se organiza e é esta que precisa ser desmontada  
(CHASIN, 2000, p. 174).  
A subordinação, a exclusão social (e a autocracia, como veremos) não eram,  
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portanto, superficiais e externos, mas efetivamente formas de existência típicas do  
capital aqui constituído que Chasin designou, a certa altura de suas pesquisas, de  
atrófico, justamente por essa sua má formação congênita, cujos caracteres sintetizou  
assim:  
na particularidade a que pertence o caso brasileiro, acumulação  
moderna e dinâmica e pauperismo estrutural ou superexploração do  
trabalho perfazem os membros contraditórios de uma mesma equação  
unitária do capital. Amálgama que reproduz, com toda sorte de  
tensões e desequilíbrios, junto com a modernização e o pauperismo,  
a subordinação estrutural do “hospedeiro”, e nesta a figura da  
incompletude de classe do capital que o caracteriza, a saber, sua  
fraqueza econômica (e política) relativa e sua falta de autonomia, sem  
as quais a associação desigual seria impossível (CHASIN, 2000, p.  
167).  
Este conjunto de mazelas “é o território precípuo de nossas categorias  
dominantes”, “não abstraídas suas equações modernizadoras e nem mesmo seus  
eventuais e pretensos arroubos menos acanhados” (CHASIN, 2000, p. 160). Não se  
tratava, dessa forma, simplesmente de modernizar a economia e a sociedade  
brasileiras para que se alçassem a novo patamar, num percurso que teria sido outrora  
percorrido pelos países centrais e no decorrer do qual seriam corrigidas as suas piores  
mazelas. Chasin frisa que o capital atrófico era estruturalmente incompleto e  
incompletável e que, pela sua forma de existir e de se mover, reiterava  
permanentemente sua condição de subalternidade no seu processo de constituição e  
modernização  
que se tornava “imediatamente reafirmação de sua  
incontemporaneidade”, isto é, “modernização sem ruptura é meramente a reciclagem  
do arcaico” (CHASIN, 2000, p. 214).  
Do exposto, resta evidenciado que à incompletude de classe de nossos  
proprietários estão emaranhadas sua subordinação às burguesias estrangeiras, seu  
congraçamento com os capitais mais atrasados, sua incapacidade de cumprir suas  
tarefas históricas já que promoveu a transferência das propriamente econômicas para  
o estado, enquanto deixou irrealizadas as políticas, como se abordará no próximo item.  
4. Autocracia e bonapartismo: formas de dominação burguesa na via colonial  
Vimos que o traço mais marcante da sociabilidade forjada pelo capital no Brasil,  
que objetivou hiper-retardatariamente a configuração social capitalista em sua fase  
industrial (que exige e impulsiona o desenvolvimento de todo um conjunto orgânico  
aqui nunca plenamente posto), é a inexistência de um processo revolucionário. A  
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burguesia colonial abandonou qualquer veleidade revolucionária, que implicaria  
ampliar os processos decisórios pela participação popular e, igualmente, a  
disseminação de ideologias e esforços práticos de instituir a democracia e o  
liberalismo, tal como observou Carlos Nelson Coutinho, citado por Chasin.  
Nesta forma de ser específica, os proprietários estão impedidos de  
desempenhar o papel de representantes dos interesses conjuntos da sociedade, como  
fizeram as classes burguesas ascendentes na aurora do capitalismo, função que aqui  
dá lugar à conciliação com os representantes da economia agroexportadora. Após  
1848, as burguesias clássicas acabaram também, por fim, renunciando a todo elã  
revolucionário, tornando-se conservadoras, mas antes disso haviam forjado toda uma  
sociabilidade nova, como já mencionado. Já o ultrarretardatário capital industrial  
brasileiro foi encarnado em personae que, além de surgidas numa era  
contrarrevolucionária, nunca chegaram a empunhar as bandeiras humanistas,  
racionalistas e liberais clássicas da burguesia revolucionária, antes ao contrário:  
tiveram seus objetivos e atuação estreitamente delimitados, objetiva e subjetivamente,  
sempre estiveram mesquinhamente voltadas para seus próprios interesses  
particulares. Em poucas palavras, “para algumas burguesias a democracia chegou a  
ser um objetivo, enquanto outras jamais cogitaram tal possibilidade” (CHASIN, 2000,  
p. 131), sendo esta a situação daquela presente no Brasil.  
Como o caso concreto em terras tupiniquins muito se distancia daqueles nos  
quais nasceu a democracia moderna, em vez de tomá-la como regime político natural  
nos mais diversos tipos de capitalismo, seria necessário indagar da possibilidade  
objetiva do seu advento, das condições reais de sua efetivação, bem como dos sujeitos  
coletivos que a poderiam sustentar e, é claro, de quem seriam seus inimigos. A  
análise das possibilidades concretas de nascimento e consolidação, dos protagonistas  
e dos antagonistas de um regime democrático é fundamental, porquanto, de outra  
forma, “corre-se o risco de reduzir a luta pela democracia, pelo recurso sempre  
arbitrário da dilatação das ‘autonomias relativas’, a um pobre ato de vontade, e a  
resvalar do pretendido caráter estratégico para uma estiolada taticidade politicista”  
(CHASIN, 2000, p. 104).  
Deixando de lado o dever-ser e analisando realisticamente a formação social  
brasileira, o que se percebe é uma repulsa à democracia os liberais eram  
representados, no Brasil, por algumas poucas individualidades por parte da  
burguesia, cuja incompletude de classe entrelaça-se com sua “inapetência congênita  
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para a democracia liberal” (CHASIN, 2000, p. 156). Sua subserviência ao capital  
estrangeiro a impedia de desempenhar o papel centrípeto que o foi o das burguesias  
outrora e alhures. No Brasil, os interesses mais íntimos das massas implicavam, antes  
de tudo, mudanças na estrutura produtiva e na política econômica, a fim de que estas  
se voltassem ao atendimento de suas necessidades, passando, em primeiro e principal  
lugar, pelo fim da superexploração do trabalho (o que, por sua vez, implicava a  
eliminação da apropriação dual do mais-valor para remuneração das burguesias  
externa e, em menor escala, interna). Ou seja, sinteticamente, os interesses das massas  
só se realizariam com a mudança na estrutura produtiva e com o fim da subordinação  
ao capital estrangeiro, que encaixilhava as ações dos proprietários brasileiros. Ora,  
como poderiam as personae do capital brasileiro ceder espaço à soberania política  
popular se elas, além de estarem cativas de sua própria estreiteza orgânica, eram  
súditos das burguesias dos países centrais?  
Donde capital vassalo e soberania popular não se integrarem, sendo  
incapazes de efetivar, de modo minimamente coerente e estável, o  
círculo mágico e vicioso do “circuito institucional do capital, que  
consta da totalização recíproca entre sociedade civil e estado”,  
quando se trata da democracia liberal, ou seja, da democracia dos  
proprietários. (CHASIN, 2000, p. 156)  
A dominação material limitada, seu capital não autocentrado, nem autônomo,  
nem completável portanto, atrófico , bem como a época em que surgiu e se tornou  
hegemônico no consórcio no poder, implicava potência política acochada da burguesia  
tupiniquim, o que a compelia ao monopólio do poder.  
Desprovido de energia econômica e por isso mesmo incapaz de  
promover a malha societária que aglutine organicamente seus  
habitantes, pela mediação articulada das classes e segmentos, o  
quadro brasileiro da dominação proprietária é completado cruel e  
coerentemente pelo exercício autocrático do poder político. (CHASIN,  
2000, p. 221)  
Aqui a burguesia era obrigada, pois, a tomar distância, a um tempo, de uma  
solução orgânica e autônoma para a sua acumulação capitalista, e das equações  
democrático-institucionais, que lhe são geneticamente estranhas e estruturalmente  
insuportáveis, na forma de um regime minimamente coerente e estável” (CHASIN,  
2000, p. 124). Daí que se mantivesse em permanente conflito aberto com as  
categorias sociais dominadas, com maior ou menor grau de violência e repressão,  
enquanto mansamente se subordina ou concilia com aquelas que se emparelham na  
sua própria altura ou estão acima dela” (CHASIN, 2000, p. 128).  
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É por isso que, quando se investiga a história brasileira, fazendo dobradinha  
com os ciclos econômicos de crescimento subitâneo e efêmero que se sucederam  
continuamente, encontravam-se as formas autocráticas de dominação. Salta aos olhos,  
com efeito, a inexistência de uma democracia no país, mesmo nos moldes liberais,  
durante a quase totalidade de sua história (levando-se em conta, evidentemente, que  
estado de direito e democracia não são idênticos). Durante o período monárquico, a  
maior parte da população brasileira era escravizada, e na vigência da escravidão a  
existência de uma democracia moderna é uma absurdidade. Já na república, a “política  
dos governadores” dos seus primeiros 40 anos era, sob fachada liberal-democrática,  
uma “real ditadura das oligarquias rurais” (CHASIN, 2000, p. 60). Ainda nos anos  
1930, viu-se a ascensão do bonapartismo de Vargas. Em 1946, fim do Estado Novo,  
um militar na presidência, no espírito da guerra fria, reprimiu fortemente a sociedade  
em geral e os comunistas em particular, inclusive cassando os mandatos dos seus  
parlamentares e relegando o partido novamente à ilegalidade. Uma incipiente  
democracia teve lugar apenas, de acordo com Chasin, no curto período de menos de  
15 anos entre o segundo governo Vargas e o golpe de 1964 nos quais houve  
o suicídio de um presidente, a renúncia de um outro e a derrubada  
pela força de um terceiro; e tudo isto já sem contar com um pequeno  
enxame de golpes e contragolpes, e com o fato de que exclusivamente  
um único presidente da república conseguiu exercer, até o fim, o  
mandato que recebera em eleições diretas (CHASIN, 2000, p. 103).  
Foi, portanto, uma fase de menos “de década e meia, através da qual a  
democracia vigente, com todas as suas limitações, foi várias vezes duramente atacada,  
e ao cabo da qual não se conseguiu firmar” (CHASIN, 2000, p. 60). Por tudo isso,  
assevera, trata-se de conquistar a democracia, de fato, dado que ela não existiu de  
modo permanente e efetivo no país: “a democracia é o vir a ser, o historicamente novo,  
tendo, pois, de ser conquistada e construída, e não simplesmente reconquistada, dado  
que, num sentido legítimo e concreto, nunca a tivemos em nosso país [até este ano de  
1980]” (CHASIN, 2000, p. 103).  
Como nunca instituiu e nem mesmo desejou a democracia liberal, a burguesia  
da via colonial pôde, no máximo, comedir sua natureza autocrática e moldar  
civilizadamente o seu conservantismo (CHASIN, 2000, p. 153). Anuiu e se amoldou ao  
liberalismo econômico, mas nunca aspirou a ser democrática: “a ‘democracia’ possível  
da hiper-retardatária burguesia brasileira se resume na legalização, na  
institucionalização da sua insuperável negação da própria democracia” (CHASIN, 2000,  
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p. 132). Donde, por estas terras, as formas da dominação capitalista genuína oscilaram  
entre dois polos: o da truculência de classe manifesta(o bonapartismo, forma de  
dominação burguesa “em tempos de guerra”, expressão armada do politicismo) e o da  
imposição de classe velada ou semivelada(a autocracia institucionalizada, forma de  
dominação burguesa “em tempos de paz”, expressão jurídica do politicismo), tipos de  
soberania do mesmo capital atrófico (CHASIN, 2000, p. 128). Tal alternância bloqueou,  
obviamente, a possibilidade de uma hegemonia burguesa de viés integracionista e  
com participação de todas as categorias sociais, quer dizer, as classes dominantes  
brasileiras “estão impedidas de conceber e exercitar a forma menos perversa de sua  
dominação, que é a democracia de classe dos proprietários” (CHASIN, 2000, p. 153).  
Chasin conclui que, no Brasil, a burguesia pode ser arrastada ou compelida à  
democracia, esta pode ser feita à sua revelia, mas ela própria não é nunca o seu  
agente” (CHASIN, 2000, p. 131).  
Nos países clássicos, o capital protege o modo de produção capitalista de  
qualquer impugnação radical (teórica e prática), mas nesse mister tolera  
questionamentos que proponham soluções reformistas. Este capital, posto de forma  
mais orgânica e coerentemente articulada, tem condições de suportar tais  
contestações, o que explica, segundo Chasin, a importante presença da social-  
democracia nos países de via clássica. Nos países subordinados, por sua vez, não há  
espaço para nenhuma indulgência:  
o capitalismo subordinado da periferia, como o brasileiro, não  
possuindo a folga daquele, sempre roído pelo seu subordinante, e  
compelido a roer superlativamente seus subalternos, não só preserva  
na generalidade o modo de produção, mas nega qualquer gênero de  
questionamento econômico, pois não pode lhe escapar que, dentro  
da realidade de sua estreiteza capitalista, toda alteração significativa  
só pode provir da angulação das massas, implicando, mesmo quando  
não fere seu arcabouço fundamental, uma parcela de sua  
desmontagem, algo, portanto, em seu detrimento, no prejuízo  
imediato e na abertura de uma perigosa perspectiva (CHASIN, 2000,  
p. 133-4).  
Premida por amarras tão apertadas, a burguesia encontrou uma forma de se  
preservar de críticas e pressões transformadoras: o politicismo. De fato, em suas  
análises concretas da história brasileira, Chasin percebe uma politicização dos  
processos e debates8, ou seja, neles se promovia, em detrimento da determinação  
8
Bem entendido, não se está falando aqui da “consideração de que todo grande problema é um  
problema político, no sentido de que as grandes questões sociais têm sempre a magnitude dos negócios  
públicos”; nem de politizar, já que este ato “implica partir de uma equação da totalidade,  
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econômica, o isolamento e a supervalorização do político, “o desossamento do todo”  
(CHASIN, 2000, p. 8), que ficava esvaziado, desenraizado e sem concretude (isso para  
não falar dos que adstringiam ainda mais o campo, reduzindo o próprio debate político  
aos seus aspectos político-institucionais). Uma compreensão politicista reduz a  
totalidade social, articulada e complexa, exclusivamente a um dos seus elementos o  
político, ou seja:  
Considera, teórica e praticamente, o conjunto do complexo social pela  
natureza própria e peculiar de uma única das especificidades (política)  
que o integram, descaracterizando com isto a própria dimensão do  
político, arbitrariamente privilegiada. (CHASIN, 2000, p. 123)  
Dissolvendo-se a complexa realidade concreta em uma sopa política,  
transformava-se a “totalidade estruturada e ordenada do real complexo repleto de  
mediações – num bloco de matéria homogênea”, promovia-se a hipertrofia do político,  
que, além de constituir uma falsificação intelectual, “configura para a prática um objeto  
irreal”, resultado do desprezo das dimensões social, política, ideológica e,  
especialmente, das relações e fundamentos econômicos que constituem o ente  
concreto (CHASIN, 2000, p. 123).  
Tal procedimento secciona política e economia, tornando o segundo um  
epifenômeno ou uma derivação da primeira, desconsiderando suas interdeterminações  
e negando o caráter fundante, ontologicamente matrizador, do econômico (CHASIN,  
2000, p. 124). Ato contínuo, de forma despolitizada, propõe o debate (e põe,  
portanto, a possibilidade de aperfeiçoamento) do político, enquanto trancafia o  
econômico em minudências e tecnicalidades. É um modo de proceder tipicamente  
liberal, cujos princípios remetem a economia à vida privada vista como o ambiente  
dos interesses egoístas desbragados e conflituosos , enquanto a política, inchada  
formalmente, é dada como coisa pública, esfera dos debates e decisões públicos, do  
bem viver coletivo, da resolução dos conflitos.  
O politicismo implica a perda de potência e eficácia da atuação política, já que  
esta, autonomizada da economia (em que se deve buscar a anatomia da sociedade  
civil), é voluntarista e, assim, condenada à impotência. Com o apelo ao politicismo,  
restava protegida a espinha dorsal da dominação burguesa de via colonial, lastreada  
na economia (e, em particular, na superexploração do trabalho), a cujo debate  
enquanto importante assunto público se esquivava. O politicismo funcionava, pois,  
conceitualmente elaborada” (CHASIN, 2000, p. 8). O politicismo é, na verdade, um fenômeno simétrico  
ao economicismo e antípoda da politização.  
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como protetor da estreiteza econômica e política da burguesia” e, na medida em que  
efetivamente subtrai o questionamento e a contestação à sua fórmula econômica e  
aparentemente expõe o político a debate e a ‘aperfeiçoamento’”, “atua como freio  
antecipado, que busca desarmar previamente qualquer tentativa de rompimento deste  
espaço estrangulado e amesquinhado” (CHASIN, 2000, p. 124). É por isso que o  
politicismo não era meramente um recurso ideológico do conservantismo civilizado,  
senão que “é resultante primeira da obra prática de sua dominação de classe” (CHASIN,  
2000, p. 153). Ou seja, a burguesia brasileira tinha no politicismo sua “forma natural  
de procedimento”, estava “na forma de sua irrealização econômica (ela não efetiva, de  
fato e por inteiro, nem mesmo suas tarefas econômicas de classe) a determinante do  
seu politicismo. E este integra, pelo nível do político, sua incompletude geral de classe”  
(CHASIN, 2000, p. 124).  
Impedidas por natureza de efetivar sua autoedificação (porque vazias de  
identidade transformadora, apavoradas das revoluções), as personae do capital  
punham-se como figuras transformistas, termo que Chasin usa como sinônimo de uma  
forma de manipulação. Esta não era, assegura, atributo exclusivo das burguesias  
periféricas: em verdade, toda a burguesia de sua época estava trespassada pela  
“inteligência da manipulação”, sendo, porém, que nas burguesias do centro capitalista,  
esta veio depois que foi abandonada sua centelha revolucionária. O distintivo das  
burguesias subordinadas residia justamente em que nunca tiveram interesse ou  
condições de efetivar transformações, que substituíram pela manipulação (CHASIN,  
2000, p. 174). Não havia, na atuação manipuladora, espaço para transformação ou  
mudança qualitativa: toda alteração mantinha e reiterava as condições estruturais  
prévias e os lugares ocupados pelas categorias sociais, o que salientava desde logo  
sua eficiência, inobstante sua falsidade (CHASIN, 2000, p. 174). Muito mais importante  
que a mera trapaça ou engodo, subjazia aí a dispensa do senso e dos critérios  
objetivos de aferição do real e a substituição da verdade por fins utilitaristas, cuja  
perseguição imediatista orientava a prática.  
Obstada a transformação pela atuação das categorias sociais que  
personificavam o capital, dada sua incompletude, poder-se-ia abrir o espaço às que  
encarnavam a lógica do trabalho, que, diferentemente da burguesia, tinham a  
potencialidade universal de integralização (CHASIN, 2000, p. 164). O que quer dizer,  
na miséria brasileira: a irresolubilidade crônica do capital atrófico abriria possibilidades  
de transformação da perspectiva do trabalho. Nesse sentido, caberia ao proletariado  
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arrastar a burguesia para a democracia e não ser arrastado por ela ao campo dos  
formalismos liberais ou submetido sem subterfúgios a alguma forma de opressão  
despótica. Em suma, dada a particularidade da formação nacional, caracterizada pelo  
itinerário da via colonial, aqui “a construção democrática é possibilidade concreta  
apenas enquanto resultante das lutas sociais nucleadas pela ótica do trabalho”  
(CHASIN, 2000, p. 145) e “até mesmo os mais formais dos valores da democracia  
política” real e estável estariam associados à lógica e à ação do trabalho, então  
centradas na perspectiva operária (CHASIN, 2000, p. 105).  
O fato de o agente histórico do processo democrático (que pressuporia a  
ruptura com a via colonial) ser a massa trabalhadora, empuxada pelos trabalhadores  
da indústria em particular, denotaria necessariamente que “a motivação e o  
direcionamento não permanecem voltados, pura e simplesmente, para a objetivação  
de formas institucionais”, “mas implica necessariamente a democracia econômica, a  
democracia social, a democracia cultural”, ou seja, a totalidade concreta da vida em  
sociedade (CHASIN, 2000, p. 76; 131). Seria necessário efetivar medidas para superar  
a via colonial, cuja ruptura ainda que não se desse inicialmente enquanto superação  
do modo de produção, mas apenas do sistema produtivo alicerçado no arrocho  
salarial, o que não era pouco na realidade brasileira só era possível pela sua ação  
(CHASIN, 2000, p. 221). Em vez de garantir avanços institucionais para depois  
assegurar outros direitos (como os materiais), tratar-se-ia desde logo de articular as  
franquias legais com outras, mais substantivas: condições de salário e de trabalho sob  
as quais os trabalhadores produziam e reproduziam sua existência material, ou seja,  
modificar sensivelmente o enquadramento econômico do sistema e romper, assim, com  
o politicismo. A “desarrumação” e “desmontagem” de aspectos do aparato produtivo  
o impediria de reproduzir a superexploração do trabalho, abrindo espaço para uma  
democracia verdadeira, fundada na soberania dos trabalhadores (CHASIN, 2000, pp.  
132; 164).  
Similarmente à burguesia, a classe trabalhadora também foi, porém, afetada  
pelas condições históricas que presidiram o seu nascimento. Com isso, para Chasin, os  
representantes teórico-político-ideológicos da perspectiva do trabalho estiveram  
igualmente aquém de sua tarefa histórica, como se verá a seguir.  
5. Nascimento e morte das esquerdas no capital atrófico  
Chasin debate, embasado nos elementos formativos da realidade brasileira, não  
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só as características antiliberais da burguesia endógena como as graves deficiências  
das esquerdas. Também em relação a tal temática sua análise se distingue das mais  
corriqueiras, pois ressalta que as insuficiências e equívocos da esquerda dos países de  
via colonial estão diretamente ligados à incompletude de classe do capital. Assim, tais  
debilidades (“antes um indicador de qualidade do que um índice quantificador de  
força”, cf. CHASIN, 2000, p. 152) não são meramente devidas a incapacidades  
pessoais ou gremiais, mas remetem aos próprios segmentos da sociedade brasileira –  
os quais, por sua vez, têm sua forma de ser explicada pela atrofia da instituição  
histórica do capitalismo no país, consubstanciada por um capital atrófico. Inobstante,  
se “na débil torrente democrática do processo brasileiro, fraca é também a corrente  
proletária que nele atua”, em face da “incompletude de classe, que também atinge o  
proletariado no Brasil”, ela acabou sendo “superenfraquecida pela desorientação a que  
é submetida, sistematicamente, pelos partidos que o querem representar e conduzir”  
(CHASIN, 2000, p. 140).  
Para melhor compreendê-lo, façamos uma rápida referência comparativa aos  
países clássicos. Ali, o novo sistema social, o mundo burguês, um circuito orgânico  
formado pela economia capitalista e pela sociedade burguesa, foi instituído pelas  
revoluções burguesas, das quais as massas participaram e nas quais puderam,  
portanto, influir, introduzindo algumas das suas demandas sob o signo dos interesses  
universais. De tal maneira que, quando as revoluções de 1848 proclamaram a  
autoemancipação do proletariado, “a emersão social e política, prática e teórica, desta  
nova categoria social fez-se, lá onde alcançou seu significado mundial, contra a figura  
integralizada da burguesia(CHASIN, 2000, p. 157). Foi, pois, por sobre as  
reivindicações e realizações históricas progressistas da burguesia, retomadas e  
elevadas até o nível da ruptura revolucionária, que a perspectiva do trabalho se  
assentou em países clássicos. Com isto, ali, a crítica prática e teórica encetada pelos  
agrupamentos e ideologias representantes da perspectiva do trabalho teve início  
precisamente onde se estancou a crítica prática e teórica revolucionária dos  
proprietários. Não à toa, “a primeira aparição de um partido comunista  
verdadeiramente atuante se dá no seio da revolução burguesa” (CHASIN, 2000, p.  
158). Nessas condições, “a revolução do trabalho nasce como o melhor dos produtos  
da revolução do capital. Os trabalhadores retomam e elevam as bandeiras decaídas  
das mãos dos proprietários”, sua própria obra “começa por onde aquela termina”  
(CHASIN, 2000, p. 158).  
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Radicalmente distinta era a situação da esquerda na via colonial, porque nesses  
países jamais houve uma revolução burguesa. “A crítica prática e teórica dos  
trabalhadores, aqui, não principiou por onde os proprietários haviam concluído. Estes  
não só não haviam terminado, como não podiam terminar nunca.(CHASIN, 2000, p.  
159) Relembremos, com Chasin, a gênese do PCB, agora centenário: “ressalvada meia  
dúzia de anos da década de [19]20 (sem entrar no mérito do elaborado), já ao final  
desta, com a adoção das teses genéricas sobre o mundo colonial do VI Congresso da  
III Internacional, engendra-se a postura deplorável da cópia intelectual bisonha”  
(CHASIN, 2000, p. 157). Esta inanição teórica tornou-se crônica e foi elevada à  
tragédia no período stalinista e à farsa pelo neosstalinismo, com o pragmatismo e a  
dissimulação que lhe são típicos. A existência de transições tencionadas cuja falência  
não foi reconhecida por longo tempo no Leste europeu e a consequente crise do  
movimento comunista internacional agravaram o problema. Da divisão do PCB  
resultaram um grupo atraído para o viscoso pântano do eurocomunismo (com o  
abandono da perspectiva revolucionária) e outro atracado ao lamentável referencial  
(sino)albanês (apegado a uma suposta sociedade de transição inexistente), na prática  
deixando aberto o caminho à instrumentalização do neoconservadorismo e à tomada  
de espaço pela nova esquerda.  
Tomou forma no Brasil, por conseguinte, uma esquerda (a tradicional, ligada às  
tradições comunistas) esquartejada entre duas opções: a busca por completar como  
acreditava que poderia , via revolução democrática, as tarefas burguesas  
abandonadas pela própria burguesia e que não poderiam jamais ser as suas; e a de  
realizar a (possibilidade genérica tomada abstratamente) própria revolução proletária  
ou, nos dizeres de Chasin, “dar início ao processo de integralização categorial dos  
trabalhadores(cf. CHASIN, 2000, p. 159). Não havia, evidentemente, condições  
objetivas (nem subjetivas) para uma revolução socialista no Brasil dos anos 1960-80,  
um solo em que o capitalismo mais avançado nem existia efetivamente. Entre esta  
revolução incogitável, posta apenas idealmente, e a força muito concreta, com seus  
conflitos e exigências efetivos, de um capital incompleto e incompletável, a esquerda  
tradicional do capital atrófico acabou se dobrando a esta última. Insipiente do papel e  
das tarefas que lhe cumpria realizar, do seu lócus de nascimento e tempo histórico,  
“toma os parâmetros abandonados desta [burguesia clássica] como se fossem os  
supostos de itinerário e de projeto da burguesia de extração colonial, dos quais nem  
esta nem ela própria poderiam pretensamente escapar” (CHASIN, 2000, p. 159).  
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Labutou, assim, por um projeto de capitalismo nacional que “supunha, em última  
análise, a reprodução do padrão integral do capital desenvolvido, autonomizado pela  
ruptura com o capital metropolitano, de modo que seria alcançado o traçado clássico  
do sistema do capital, abstraídas distinções quantitativas” – acreditava ser possível um  
“sistema capitalista internacional formado pela justaposição de parcelas similares”  
(CHASIN, 2000, p. 215).  
Ao fim e ao cabo, “o devaneio de principiar a integralização de classe dos  
trabalhadores reduz-se a miserável voto piedoso” e “a empresa impossível de levar à  
completude o capital incompletável se amesquinha, progressivamente, em simples e  
melancólico ativismo caudatário” (CHASIN, 2000, p. 160). A esquerda tradicional  
passou, então, a atuar a reboque de uma suposta burguesia “nacional”, em prol de  
uma revolução democrático-burguesa que cumpriria uma etapa necessária para só  
depois se bater pela revolução socialista, a ser atingida posteriormente e  
necessariamente – a esta. Assim, ficou “entravada entre o revolucionarismo abstrato e  
o ativismo caudatário” e “neste movimento pendular consumiu quase toda sua  
capacidade teórica” (CHASIN, 2000, p. 161).  
Ademais, desacerto no imo do equívoco, a esquerda dita marxista deixou-se  
seduzir pelo ideário liberal (ao qual já havia abdicado a própria burguesia ali onde  
outrora fora revolucionária) que configurava, naquele momento, uma subsunção aos  
supostos anseios do conservantismo civilizado, que parecia liberal comparativamente  
à autocracia burguesa instituída em 1964. Aqui como alhures, estas foram  
enclausuradas na hegemonia ideológica burguesa e presas, junto com os defensores  
ideológicos do sistema, ao politicismo que “corresponde à faixa de segurança onde se  
movem em terreno próprio” (CHASIN, 2000, p. 125). Apropriaram-se e reproduziram,  
sob parâmetros dos ideários neoliberais internacionais, “os diagnósticos de realidade  
e os projetos de ação do conservantismo civilizado nacional” (CHASIN, 2000, p. 156).  
Manifestava-se, nessa mimese, sua astenia, mas também sua renúncia à independência  
teórica que, como sua tibieza, não era nova, tampouco involuntária. Assim, a  
esquerda tradicional, com diagnósticos equivocados e práticas desorientadas e  
desorientadoras, teve um lastimável papel na perda de uma importante oportunidade  
histórica, as lutas envidadas no pré-64. Reboquista, etapista, determinista e atrelada  
ao estado, acabou não estando à altura do desafio que foi o golpe de 1964 e o  
bonapartismo que se seguiu a este.  
Crítica à esquerda tradicional, surgiu no final dos anos 1970, no bojo das  
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greves operárias do ABC paulista, uma “nova esquerda”, assumidamente não marxista.  
Chasin analisa muito diversamente aqueles movimentos, pelo menos em sua  
potencialidade, e a esquerda dali originada. As greves traziam “em seu bojo o  
direcionamento histórico da conquista e da construção democráticas, das quais o  
programa econômico alternativo é a vertebração” (CHASIN, 2000, p. 102). Ressalva  
que os trabalhadores grevistas em nenhum momento punham em causa o próprio  
capitalismo e nem mesmo tinham um programa econômico alternativo mais ou menos  
desenvolvido (como outrora foram as reformas de base), mas ao politicismo proposto  
pelo sistema contrapuseram, na prática, conteúdos relativos às bases, à economia,  
quais sejam, a liquidação da política econômica sobre a qual se sustentava a ditadura  
(a política salarial do arrocho). Pugnando por reivindicações econômicas, acabaram  
também tendo conquistas políticas (como a derrubada factual da lei antigreve). Como  
“democracia minimamente efetiva e arrocho salarial não coexistem, nem podem  
coexistir, a não ser na ‘democracia’ da autocracia burguesa institucionalizada” (CHASIN,  
2000, p. 132), punha-se, então, a possibilidade de uma verdadeira objetivação da  
democracia, sob a égide dos trabalhadores. O que implicava o rompimento com o  
politicismo, tendo por eixo um amplo desmantelamento de aspectos do aparato  
produtivo, impedindo-o, desta forma, de reproduzir a superexploração do trabalho e,  
assim, possibilitando a transformação das relações sociais.  
O que houve, porém, foi a perda de outra oportunidade histórica de romper  
com os mais danosos aspectos da via colonial, pois o sistema tratou de “encaminhar  
o desenho de outra forma de sustentar a mesma dominação”, efetivando uma  
passagem politicista do bonapartismo à autocracia institucionalizada (CHASIN, 2000,  
p. 127). E teve nas esquerdas um cúmplice voluntário ou não , tendo em vista que  
aquele percurso proposto pelas massas foi sustado pelas suas representações, que  
atuaram apenas no campo de segurança proposto pelo sistema e sucumbiram ao  
politicismo. As massas que, de moto próprio, não podem determinar os processos e  
direcionar os movimentos rumo a conteúdos presentes espontaneamente em algumas  
das suas iniciativas foram subordinadas e desfibradas pelas oposições ao regime  
bonapartista (CHASIN, 2000, p. 125). Para Chasin, “A dinâmica da construção  
democrática pelas bases não é, simplesmente, ter as massas em movimento, mas dotar  
o movimento das massas, ao mesmo tempo, da arma programática que reordena a  
sistemática da produção” (CHASIN, 2000, p. 132). Mas se deu exatamente o contrário  
no final dos anos 1970 e início da década seguinte, com as esquerdas pelejando para  
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redirecionar as lutas sociais que se davam nas fábricas, principalmente, mas também  
em comitês de apoio, nas ruas etc. para o campo institucional, quando, na verdade,  
as lutas sociais é devem determinar a ação parlamentar, “de modo que atualizassem  
sua potência de forçar a representação parlamentar (...), vindo assim a conferir a ela  
conteúdo e direção” (CHASIN, 2000, p. 145). Assim, “depois de uma longa trajetória,  
à qual não se nega o valor de resistência e até momentos de pesado sacrifício”, as  
esquerdas sucumbiram ao ardil do politicismo porque “mantiveram e reproduziram a  
ignorância prática da centralidade operária, desconheceram a necessidade de romper  
o politicismo, e não compreenderam o imperativo de um programa econômico de  
transição democrática(CHASIN, 2000, p. 133).  
Transitou-se, pois, sem transformação, num processo conduzido pelo sistema,  
que continuou mantendo fora de perigo seu cerne, a política econômica, mesmo que  
reformando alguns dos seus aspectos, com vistas à manutenção do poder. Na medida  
em que se limitaram à reivindicação (e de forma abstrata) das franquias democráticas  
e, no máximo, a uma irresolutiva redistribuição de renda, as oposições à ditadura  
militar, esquerdas incluídas, levadas de roldão pelo politicismo, não atenderam para o  
fato de que o projeto global do bonapartismo era antes de tudo econômico. Donde,  
não conseguiram entender e denunciar os esteios do projeto econômico da ditadura  
e suas consequências necessárias.  
Faceta não desprezível da obsequiosidade teórica da esquerda e da penúria de  
seus padrões de reflexão é o conjunto de conceitos do qual se valia, que em muitos  
casos emprega ainda hoje, para entender a realidade e combater suas mazelas.  
Sintetizado nas teorias da dependência e da marginalidade e nas críticas ao populismo  
e ao autoritarismo9, foi forjado nos altos-fornos da epistemologia liberal mas,  
inobstante, passou a ser identificado como interpretação oficial do marxismo para o  
Brasil. A esquerda tradicional, carente de um diagnóstico e um prognóstico da  
realidade nacional próprios, em vez de lhes dirigir a crítica radical e rigorosa que  
mereciam, assimilou elementos dessas teorias, amalgamando-as a suas antigas  
posições; e a nova esquerda as considerava sua essência, tomando-as como “aspectos  
válidosdo marxismo dos quais se valeria para fazer a crítica da esquerda tradicional.  
Ao fazer essa necessária – crítica, a proclamada “nova esquerda” perdeu-se  
nas brenhas de outro tipo de tentativa de finalização, a do poder liberal ininstaurado  
9 Não há espaço, aqui, para reproduzir as críticas a esse quarteto teórico feitas por Chasin. Remetemos  
os interessados aos textos originais deste (especialmente, CHASIN, 1989).  
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e inistaurável” (CHASIN, 2000, p. 161), ou seja, a questão da soberania política  
burguesa num país onde o liberalismo era impossível. É por isso que, tomando  
igualmente para si fósseis liberais, impôs-se uma escolha simplória entre  
democratismo e autoritarismo explicitando que sua diferença para com a esquerda  
tradicional era de acento, não de qualidade. No âmago de seu democratismo, um  
“participacionismo” – degeneração da participação, que reduz a força dos agentes à  
presença física e à quantidade, totalmente imerso no espontaneísmo que toma a  
política como o campo da vontade ou da invenção. Para Chasin, participar é estar  
jungido de forma consciente à política concreta pelas “demandas finitas de um  
momento histórico dado, no processo verdadeiramente infinito da autoedificação  
humana e de sua emancipação”, quer dizer, atua-se dentro de circunstâncias históricas  
determinadas, que impõem escolhas possíveis, mas sempre tendo como fim a  
emancipação humana. Já participacionar implica “servir como número à manipulação  
politicista, destituído de classe, consciência e individuação, sem vínculo concreto com  
a construção do humano e de sua liberdade”, é “a participação sem consciência  
participante ou a presença participante sem consciência”, tornada puro testemunho e  
cedida à instrumentalização em seus mais variados níveis(CHASIN, 2000, p. 161).  
No início dos anos 1980, em suma, o diagnóstico da situação das esquerdas  
no Brasil era bastante negativo. Estas não tinham independência teórico-ideológica  
nem autonomia política, eram “raquíticas em número e anacrônicas nas formas de  
organização” e não obstante haver “mártires e sacrificados, ofendidos e humilhados”,  
verdadeiros “heróis no equívoco e vítimas de todas as regressões” aos quais a mais  
digna homenagem “é a coragem de recomeçar” – acabaram conduzindo sua ação de  
uma forma “que atinge e desencanta, limita e desorienta o conjunto dos trabalhadores  
do país” (CHASIN, 2000, p. 160). A união entre o “embrião maldito do capital  
incompletável” e a “insubstancialidade teórica e prática” da esquerda é que determina  
a miséria brasileira, expressão que diz da gênese, processo e consequências da  
objetivação do capital no país.  
Segundo Chasin, na sua acepção desenvolvida historicamente, direita e  
esquerda são “campos políticos de natureza diversa, compreendidos pela dinâmica  
excludente entre as lógicas do capital e do trabalho e suas respectivas formas  
societárias”, e, assim, o que qualifica o campo da esquerda é ser figura organizada  
pela lógica humano-societária do trabalho” (CHASIN, 2000, p. 229). Diante da  
derrocada da União Soviética e outros países pós-revolucionários (que se deveram,  
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antes de tudo, a problemas internos) e do estabelecimento incontestado do domínio  
global do capital, houve um retraimento da esquerda até seu completo  
desaparecimento enquanto esfera de atuação política da perspectiva do trabalho. Num  
fenômeno que manteve similitudes com o que ocorreu no restante do mundo, no Brasil,  
a esquerda, enquanto representante da lógica onímoda do trabalho, após dissensões  
e dissidências e um agudo empobrecimento teórico, cedeu passo a representantes  
postos no lado esquerdo do campo do capital, que em solo não revolucionado soam  
como radicais.  
Restaram ou sugiram alguns organismos partidários, de portes  
distintos, que, perdidos em suas pobres diferenças, desvalidos para  
tudo que não sejam disputas irrelevantes de caráter bizantino, se  
igualizam como organizações políticas que ocupam posições na  
esquerda do arco político do capital. (CHASIN, 2000, p. 231)  
De tal maneira que, a partir do final dos anos 1980, o campo da esquerda foi  
o grande ausente10, existindo, no máximo, individualidades e agrupamentos “situados  
no polo da radicalidade burguesa, espaço que o capital subordinado nunca preencheu,  
dado o caráter autocrático de sua dominação, que implica a exclusão dos de baixo,  
isto é, do povo e do princípio de sua soberania” (CHASIN, 2000, p. 233).  
A morte da esquerda se somou à extensão da utilidade histórica do sistema do  
capital para proliferar os obstáculos e dilemas da via colonial. A extraordinária  
transformação imposta pela globalização determinou o fim de todas as possibilidades  
de romper com a via colonial a partir das condições dadas no próprio país, como se  
verá a seguir.  
6. Via colonial: encerramento sem ruptura  
Desde meados dos anos 1970 Chasin aponta os equívocos e limites da atuação  
das esquerdas, especialmente a não apresentação de um projeto econômico, pensado  
da perspectiva do trabalho, alternativo ao do sistema. Mas não só: considera parte da  
tarefa da crítica fixar alguns marcos acerca de elementos que jamais poderiam deixar  
de estar incluídos neste. Assim, com diferentes graus de formulação, por meio de  
10 Constatar a morte da esquerda não significa abdicar da revolução social e desacreditar da perspectiva  
do trabalho: esta não foi extinta nem pode sê-lo, pois persiste enquanto houver trabalho, ou seja,  
humanidade. Bem ao contrário de derrotismo ou pessimismo, trata-se de reconhecer objetivamente a  
situação histórica e, por sobre um balanço da produção teórico-ideológica e da atuação prática, embasar  
um possível renascimento da esquerda, desta vez, quiçá, efetivamente assentada sobre a autêntica  
perspectiva do trabalho, que forje os diversos instrumentos organizacionais necessários e adequados  
às lutas social, sindical e política no momento de sua gênese (CHASIN, 2000, p. 201).  
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aproximações sucessivas (que aqui não há espaço para reproduzir11), ele traz à tona  
transformações que seriam necessárias e factíveis para que houvesse a ruptura  
com os mais danosos caracteres da via colonial. Tais medidas subentendem um  
combate realizado no campo adequado, e justamente aquele que tem sido  
resguardado e protegido pelo capital atrófico, qual seja, o econômico. Trata-se, pois,  
de “fundir luta econômica com luta política”, procedendo-se à substituição da política  
econômica vigente por outra, elaborada da perspectiva do trabalho. Seria alcançado,  
dessa forma, um crescimento verdadeiro e resolutivo, que articulasse progresso social  
a evolução nacional. Assim, se alguns momentos da primeira transição aqui  
apresentada se transformaram conforme a conjuntura, foi mantida sua ossatura.  
O conjunto de medidas apresentado por Chasin não se esgotaria em si mesmo,  
antes ao contrário, faria parte de um movimento mais amplo constituiria a primeira  
etapa de um processo articulado de superação do capital, o qual ele chamou de dupla  
transição. As disposições que apresentamos constituem justamente o seu momento  
inicial, a primeira transição, de ruptura com um capital induzido, subordinado e  
excludente, de maneira a transformar o perfil do sistema produtivo mas sem querer  
saltar imediatamente, por sobre as condições (in)existentes, para outro modo de  
produção. A primeira transição tomaria como arena de luta justamente a incompletude  
econômica e política do capital atrófico, a qual combateria não no sentido de completá-  
la, mas de desmontar os pressupostos do sistema produtivo (ainda defensivamente,  
no âmbito do mesmo modo de produção) para, assim, abrir caminho para uma segunda  
transição, esta sim já no terreno próprio da lógica do trabalho (CHASIN, 2000, p. 281-  
2). Em síntese, a primeira transição está vinculada em sua distinção à transição  
socialista, consubstancia as transformações imediatamente possíveis e abre  
estruturalmente para a transição última, que projeta para além do capital(CHASIN,  
2000, p. 219).  
Sua propositura se caracterizava, em primeiro lugar, justamente por não supor  
uma constituição ideal do capitalismo no país, mas ser realista, partir da configuração  
do capital particularmente instituído por estas plagas. Tal significa não pleitear, por  
11 Não cabe, aqui, o acompanhamento do programa proposto para cada momento histórico, tampouco  
o deslindamento da densa elaboração de Chasin acerca dos diversos temas nos muitos artigos e  
editoriais que escreveu (muitos deles, vale lembrar, realizados a quente, durante os acontecimentos e  
para embasar posicionamentos que julgava importantes). Dados os objetivos deste texto, apenas  
apresentamos os aspectos mais importantes de um percurso possível e o itinerário realmente percorrido,  
tomando por parâmetro a primeira transição pensada nos primórdios da globalização.  
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exemplo, a tentativa de chegar a alguma forma de capitalismo modernizado que  
desconsideraria sua real constituição e seus nexos visceralmente subordinados, bem  
como a crença algo ingênua num distributivismo redentor autônomo com relação às  
estruturas produtivas subordinadas e excludentes mas a tentativa de superá-las.  
Chasin não se deixa, assim, engolfar nem pelo fatalismo (pois a primeira transição não  
se tratava de destino inelutável), nem pelo caudatarismo (de vez não era o caso de ela  
tomar para si as tarefas incompletas e incompletáveis da burguesia), nem pelo  
etapismo (já que não era uma etapa necessária e inescapável para se chegar a outro  
patamar). Bem entendida, estava posta no gradiente das possibilidades concretas, era  
uma “alternativa real da perspectiva do trabalho, inscrita no campo dos possíveis da  
atualidade brasileira(CHASIN, 2000, p. 282). A processualidade da dupla transição  
também permitiria escapar do maniqueísmo que contrapunha abstratamente reforma  
a revolução, já que reafirma o socialismo ao mesmo tempo que reconhece a  
impossibilidade de sua realização imediata, sem conduzir ao imobilismo e sem permitir  
que a afirmação socialista seja transformada em discurso melancólico da mais nobre  
volição ou da mais tacanha teimosia” (CHASIN, 2000, p. 219).  
A proposição passava, antes de tudo, por levar a cabo tarefas para promover  
uma grande transformação qualitativa no campo das relações internacionais do  
capital12, para o rompimento das relações subordinantes, de que depende toda  
alteração interna (CHASIN, 2000, p. 282-3). Chasin realça que uma estreita inter-  
relação no âmbito das relações econômicas internacionais fez parte de todo o  
incompleto processo de constituição do Brasil enquanto nação. Com tal histórico, e  
sendo um país de grande porte e complexidade econômico-produtiva, sua dissociação  
da revolução tecnológica e do mercado global era impossível (e indesejável, pois  
equivaleria a isolar-se, estagnar e regredir num mundo cada vez mais universal). De  
forma que se tratava de discutir a qualidade da inserção.  
Umbilicalmente vinculada, e como ponto fulcral da proposta, a redefinição do  
12  
As propostas contidas na primeira transição mantiveram uma coerência interna fundamental, para a  
qual foi necessário ir ajustando medidas concretas às mudanças históricas pelas quais passou o país.  
Nesse sentido, o papel do estado, p.ex., foi bastante modificado dos anos 1970 para meados dos anos  
1990, bem como a importância da transformação das relações internacionais. Nessa mesma direção,  
nos anos 1970 e 80, Chasin realça a importância da plataforma de luta pela democracia, que deveria  
articular e potencializar, a seu tempo, a anistia, a convocação de uma assembleia constituinte e todas  
as diversas prerrogativas democráticas, sempre cuidando de avançar do plano institucional para as  
efetivas condições de vida e trabalho da imensa maioria da população. Já nos anos 1990, ele salienta  
a conquista de certa estabilidade democrática, sem que os mourões da via colonial tivessem sido  
derribados.  
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aparato produtivo por meio de medidas de curto, médio e longo prazos para inativar  
as dimensões mais perniciosas do capital atrófico mormente a superexploração do  
trabalho para, então, eliminar pela raiz a causa da exclusão social endêmica no país  
(CHASIN, 2000, p. 74; 237) , no interior de  
um programa econômico de recomposição da malha dos setores  
produtivos, do redirecionamento de prioridades e da alocação de  
recursos (privados e públicos), de maneira que o aparato de produção  
e reprodução material da vida seja posto a serviço da sociedade  
global (CHASIN, 2000, p. 283).  
O enfrentamento da questão agrária também era inescapável (“a estrutura no  
campo é a matriz histórica [da] excludência”, cf. CHASIN, 2000, p. 284), com especial  
atenção às reivindicações trabalhistas dos assalariados do campo, tão desatendidas  
historicamente e tão desapercebidas pelas esquerdas. No mesmo bojo, deveriam ser  
tomadas providências variadas, de maneira a dar conta da diversidade do campo  
brasileiro, prevendo propriedades de tipos e caracteres diferentes (incluída a  
propriedade social, de contornos comunais, não estatal), voltadas ao atendimento de  
necessidades e especificidades de distintos setores, considerando-se a permanência  
do empreendimento diante do desmonte dos mecanismos da superexploração do  
trabalho, a sua viabilidade econômica e os avanços de produtividade (CHASIN, 2000,  
p. 286).  
E, finalmente, a formação dos blocos econômicos internacionais, com a  
promoção da integração econômica latino-americana o que subentenderia a  
desmontagem das relações subordinantes com as economias centrais , que teria um  
grande peso sobre o sistema mundial (CHASIN, 2000, p. 286). Se deixado a sua  
própria lógica, o capital atrófico poderia, no máximo, reiterar sua subalternidade  
estrutural ao capital metropolitano, em vez de empreender a formação de um mercado  
único latino-americano capitaneado pelas nações mais fortes articuladas aos demais  
países (forma de alcançar algum poder de pressão no cenário global). Nesse sentido,  
o início dos anos 1990 trazia amplas perspectivas ao Brasil, país que fazia parte do  
pequeno agrupamento de países periféricos (com Argentina e México) para os quais a  
inserção na nova forma de acumulação ampliada do capital poderia ser mais proveitosa  
(para além de ser inescapável, sob pena de retrocesso) (CHASIN, 2000, p. 286).  
O perfil inicialmente defensivo das transformações econômicas fazia parte da  
visão objetiva que, ao mesmo tempo, era talhada de molde a induzir uma ampla  
reconfiguração econômico-societária, desordenar a lógica do capital atrófico, se não  
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extinguindo, ao menos moderando a (des)ordem social posta por ele, ao controlá-lo  
socialmente (e não politicamente, como tem sido a regra no campo da pseudoesquerda  
voluntarista). Tais medidas, por desorganizarem aspectos centrais da estruturação do  
capitalismo no país, ainda que pudessem resultar em “fortalecimento do capital local  
e da continuidade da exploração do trabalho, é inverossímil que seja muito dificilmente  
seria operada, agora ou depois, sob a égide do capital atrófico(CHASIN, 2000, p.  
164; 169): somente poderiam ser consumadas por uma frente político-eleitoral  
articulada a partir das massas, fortemente estacada nas necessidades populares, tendo  
por eixo a aliança entre trabalhadores urbanos e rurais, mas articulando em torno de  
si a pequena e média burguesias, interessadas na ampliação do mercado interno.  
A possibilidade concreta de ruptura com os caracteres mais perniciosos da via  
colonial esteve presente especialmente em alguns momentos da história brasileira,  
como mencionado, com destaque para as lutas do imediato pré-64, para as greves do  
final dos anos 1970 e para as eleições presidenciais de 1989, as primeiras após o  
bonapartismo instituído pelo golpe em 1964). Em nenhuma delas houve o rompimento  
desejado, graças a diversos fatores (os quais, por sua vez, se devem a diversas  
questões das quais já mencionados algumas); vários dos descaminhos trilhados pelo  
país se devem a equívocos da autointitulada esquerda lamentavelmente, diz Chasin,  
no Brasil, “as melhores forças têm primado em perder oportunidades” (CHASIN, 2000,  
p. 294).  
Durante quase todo o século XX, a produção de mercadorias no plano  
internacional tinha gradações ainda despretensiosas, e sua circulação dava-se quase  
sempre por meio de relações bilaterais em mercados controlados pelas potências  
centrais restritos ou cativos. A partir dos anos 1990, com a globalização, tudo isso  
desapareceu em face da “produção ampliada a grandezas sem limites e [d]o  
intercâmbio comercial elevado ao primado das trocas infinitas e superpostas, sem  
embaraços de fronteira” (CHASIN, 2000, p. 304). Certos capitais, antes circunscritos,  
ultrapassaram seus antigos limites à busca de lócus mais amplos para sua reprodução  
ampliada, alçando-se ao nível global, entre nações dispostas em graus diferentes e  
hierarquizados agregadas em blocos também desigualmente constituídos e que  
competem entre si e internamente. Com as imensas implicações da revolução  
tecnológica, as fronteiras se tornam mais dúcteis, mas não são eliminadas, bem como  
as relações de subsunção e o desenvolvimento desigual e combinado típicos dos  
movimentos do capital.  
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Nos novos marcos da revolução tecnológico-produtiva, há apenas um capital  
social global e os mercados interno e externo não mais se distinguem. Essa “nova  
(des)ordem internacional do capital” é “o mundo real a ser vivido por todos, embora  
sob a diversidade com que os países estejam habilitados a participar dele por efeito  
do desenvolvimento desigual que os enforma” (CHASIN, 2000, p. 304). Crescer agora  
é ocupar nichos na infinitude da malha produtiva e no mercado único globais,  
certamente com contradições (muitas delas inimagináveis) inéditas e em proporções  
gigantescas das quais já foi possível ter algumas amostras. Mercado mundial e novo  
patamar produtivo que não são opções ideológicas ou conspirações bem elaboradas  
e insidiosas, mas uma realidade inelutável, uma nova forma de existência humana,  
ainda sob o capital.  
A existência nacional, sob os influxos de uma nova realidade, passa, então, a se  
conformar pela “lógica sem precedentes da nova fase de acumulação ampliada do  
capital, ou seja, pelos nexos operantes do novo patamar tecnológico e da  
mundialização do mercado” (CHASIN, 2000, p. 302). Nesse sentido, só integrado a  
esta seria possível existir civilizadamente a partir de então inclusive para, no futuro,  
labutar pela ultrapassagem do mundo regido pela lógica do capital.  
A nova configuração do capital, à qual o Brasil está atrelado, põe em patamar  
diferente todos os parâmetros de debate e de atuação possíveis. Este novo estágio  
produtivo global reformula completamente o quadro no qual se desenrolam os  
processos internos a cada país, impossibilitando alternativas resolutivas que em algum  
momento haviam se posto no interior das fronteiras nacionais. A revolução tecnológica  
elimina os vestígios de uma lógica do capital (já esgotado havia muitas décadas) que  
nutria a ilusão da possibilidade de autonomia do capital nacional, que no Brasil se  
encarnou até na “esquerda”. A via colonial encontra seu fim num processo que significa  
o fechamento de ciclos que se deram internamente ao país ainda apenas parcialmente  
inserido nas relações internacionais (em comparação com a globalização) e, no mesmo  
passo, inviabiliza soluções no âmbito nacional. Trata-se, enfatize-se, do fim de um  
longo ciclo da história brasileira, no decorrer do qual se cristalizaram determinados  
aspectos da nossa sociabilidade sem que fossem enfrentados revolucionariamente e  
que encontraram um encerramento “natural”, coerente com sua existência. Tomar em  
conta essa nova realidade, afirma Chasin, é imprescindível para compreender o tempo  
histórico e prospectivar o futuro.  
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Considerações finais  
Nos seus aspectos mais gerais, a via colonial de objetivação do capitalismo  
descoberta por Chasin foi a instituição da economia e da sociedade burguesas que  
não teve um processo revolucionário por parteiro. Marcada pela grande propriedade  
rural já empresarial, de origem colonial , resistiu ao processo de industrialização,  
que só se afirmou após muitas intermitências, resistências e recomeços, híper-  
tardiamente, em condições de subordinação aos interesses das burguesias dos países  
centrais, tendo o estado por um dos seus principais agentes e sem nunca se completar  
totalmente. Tratava-se de um capital atrófico, porque incompleto e incompletável, que  
deixou irresolvidas suas mais elementares questões estruturais, ademais (e em  
consequência) de nunca romper com sua condição subserviente aos polos  
hegemônicos da economia internacional.  
Ausente a revolução burguesa que instituiu a sociabilidade do capital nos países  
de via clássica, objetivou-se uma formação que dissociava a evolução nacional (aqui,  
determinada desde o exterior) do progresso social, quer dizer, em que a sociedade  
evoluiu e se modernizou sem que sua classe dominante encarnasse o papel de  
representante universal dos interesses das classes dominadas, enjeitadas e mantidas  
à margem, excluídas e/ou reprimidas pela violência abertamente bonapartista ou  
institucionalizada. Na via colonial o progresso só se pôs por meio de acertos e  
acomodações com os representantes da ordem agroexportadora, instituindo-se um  
reformismo pelo alto impeditivo de uma hegemonia burguesa em moldes liberal-  
democráticos, integracionista. Assim, por estas plagas o fenômeno da exclusão social,  
os graus abissais de desigualdade e a dominação autocrática que frequentemente  
resvalava para a ditadura não se deviam ao atraso, mas eram uma forma de ser e ir  
sendo do capital na qual a classe dominante, embrionariamente contrarrevolucionária,  
abandonou suas tarefas históricas e sujeitou-se docilmente às burguesias estrangeiras.  
Totalmente dedicada aos próprios interesses mesquinhos, servil às classes dominantes  
estrangeiras, selvagem com as classes dominadas, a burguesia dominou com mão de  
ferro “em tempos de guerra” e impôs-se com concessões desconfiadas “em tempos de  
paz”.  
Em síntese, a via colonial  
particulariza formações sociais economicamente subordinadas,  
socialmente inconsistentes e desastrosas, politicamente instáveis em  
sua natureza autocrática e culturalmente incapacitadas de olhar para  
si com os próprios olhos e traçar um horizonte para seus dilemas  
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específicos na universalidade dos impasses mundiais. Sob os influxos  
e refluxos do capital metropolitano, produzem e reproduzem a miséria  
de sua incontemporaneidade, armada sobre a incompletude de seu  
capital incompletável e, por isto, sobre a natureza invertebrada de  
suas categorias sociais dominantes e, por decorrência, sobre a  
inorganicidade de suas categorias sociais subalternas (CHASIN, 2000,  
p. 212).  
Como a classe dominante não efetivou seu papel histórico, as classes  
dominadas não puderam concretizar suas próprias tarefas partindo do patamar de um  
mundo já transformado pela revolução burguesa a incompletude de classe é a ferida  
supurante do capital atrófico. Assim, as classes dominadas, superexploradas e  
reprimidas, e vendo tolhido o conflito que é o demiurgo das classes, não tiveram  
condições de exercitar sua organização política independente e desenvolver-se teórica  
e ideologicamente de forma autônoma. Seus representantes teóricos, desatentos às  
específicas características da nossa sociabilidade, gastaram rios de tinta em querelas  
abstratas e embrenharam-se pelo cipoal de rematar as tarefas que foram outrora  
efetivadas pelas burguesias clássicas, fossem elas as econômicas (caso da esquerda  
tradicional) ou as políticas (caso na esquerda não marxista). Nesse processo, as  
esquerdas foram se confundindo, cindindo e apequenando até a desaparição. Restam  
representações que ocupam o arco à esquerda do capital, que na via colonial aparece  
como radical. Mas, frise-se, para Chasin, a morte da esquerda realmente existente não  
significa o fim da perspectiva do trabalho.  
Até os anos 1990, Chasin afirma que a eliminação pela raiz da miséria brasileira  
era tarefa dos trabalhadores em geral, então empuxados pelo proletariado industrial.  
A imensa transformação promovida pela revolução tecnológica e pela globalização,  
que engolfa (subordinadamente) o capital atrófico, modifica a configuração geral13 e  
reenquadra as possibilidades de cada país. De acordo com Chasin, as economias  
nacionais têm de se adequar a determinados protocolos do sistema de produção  
global nos quais estão profunda e desigualmente imersas. No caso brasileiro, isso  
significa que as inviabilidades típicas da via colonial são transpostas para um quadro  
de universalização da produção capitalista que é o único no qual poderiam ser  
solucionadas. Inexequível agora qualquer transformação substancial nos estreitos  
marcos da nacionalidade; dado o novo patamar de determinação internacional do  
13  
E, nesta, o agente revolucionário deixou de ser a classe operária, ultrapassada com a perda de  
importância da indústria, cabendo investigar quem é o mais lídimo representante da lógica onímoda do  
trabalho em sua mais nova e revolucionária configuração histórica (cf. CHASIN, 2000).  
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capital, verifica-se que se encerra todo um período histórico no qual o país poderia ter  
escolhido o caminho a percorrer, ou a velocidade da marcha, ou ao lado de quem  
avançaria, ou ainda quem carregaria as tralhas de viagem e quem aproveitaria as  
delícias da paisagem. Findo o percurso, põe-se, antes de mais, o desafio de entender  
a nova realidade dada e de manter a lucidez, ato revolucionário em tempos obscuros.  
Do início ao fim de sua vida teórica, Chasin se dedica à crítica teórica e prática  
da sociabilidade brasileira, corrigindo, aprofundando, atualizando, especificando  
suas reflexões sobre o tema, num processo ininterrupto e infinito de aproximação de  
um objeto também ele em constante movimento. Importante salientar que, como  
intentamos demonstrar, ele não faz uma “teoria da história” brasileira, abstrata, mas  
decanta categorias a partir da própria concretude. Distancia-se dos modelos teórico-  
metodológicos e típico-ideais, bem como das interpretações que ora destacavam as  
mazelas internas, ora salientavam a subordinação ao exterior, quebrando a estreita  
dialética que unia as duas pontas da miséria brasileira. Ao se debruçar sobre a  
realidade brasileira, ele captura por sobre os caracteres culturais, linguísticos e  
outros suas principais determinações sócio-históricas, da produção e reprodução  
material da vida tal como possível no processo efetivo pelo qual se objetivaram as  
categorias do capital no contexto sócio-histórico dado no país.  
Como o próprio autor frisou, que não se tratava de uma teoria plenamente  
desenvolvida, mas de uma tematização em processo, que impunha “sucessivas  
aproximações cada vez mais concretizantes” (CHASIN, 2000, p. 12) e da qual  
algumas críticas e caracterizações foram menos desenvolvidas que outras, que  
restaram, assim, mais abstratas. A colaboração de pesquisadores de áreas diversas  
havia, inclusive, sido expressada como necessária para o aprofundamento e o  
desenvolvimento das análises, mas acabou em larga medida não sendo concretizada.  
Adite-se que, dado o encaminhamento da sociabilidade brasileira (inserida no mundo  
global) nesses quase 25 anos desde sua morte, é nossa a tarefa urgente de avaliar  
a pertinência, a atualidade e a necessidade de aprofundamento dos diversos elementos  
de sua análise, cujo rigor, de resto, esperamos ter demonstrado.  
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Como citar:  
ASSUNÇÃO, Vânia Noeli Ferreira de. J. Chasin e a via colonial de objetivação do  
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Rio das Ostras, v. 30, n. 1, pp. 1-39, Edição Especial: A miséria brasileira, 2025.  
Verinotio  
ISSN 1981 - 061X, v. 30, n. 1, pp. 1-39 jan.-jun., 2025 | 39  
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