A produção teórica do marxismo no Brasil é decepcionante
civilizadas de atuação. De maneira que as injustiças sociais, as aberrações de suas
formas de exploração não viessem à tona com as formas gritantes de seus primeiros
tempos.
DN: E de que decorre essa durabilidade estendida do capital?
JC: Decorre, a meu ver, não apenas de suas virtudes intrínsecas, mas de um fenômeno
muito grave, que se dá ao nível daquilo que pretendeu ser uma ruptura com o capital
em nível internacional. Refiro-me, naturalmente, à configuração contemporânea do
mundo pós-capitalismo, para dizer Leste europeu e países da mesma ordem, que
acreditaram, no começo do século e no desdobramento de décadas posteriores, que
estavam rompendo com o capital, transitando para o socialismo. Dadas as
características históricas em que este processo se verificou, ocorreu, no entanto, que
o rompimento com o capital de fato não se deu; houve um rompimento com o
capitalismo, mas não com o capital. Em poucas palavras, isso ocorreu porque – para
tomar o exemplo maior, que é o da Revolução Russa – o nível econômico, social e
cultural de onde partiu esta Revolução era de tal ordem miserável que o processo se
viu encarregado de construir, isto sim, o capital industrial e acabou por se verificar que
a construção do capital industrial se deu; porém, a superação do capital, ele próprio,
não se realizou. De tal maneira que surgiu uma nova forma de capital, que hoje faz o
desafio teórico e político dos nossos tempos. Junto ao drama de, necessariamente,
reconhecer que a experiência da Revolução Russa, tão extraordinária, tão motivadora
de esperanças, quando da sua efetuação, acabou por se configurar numa melancólica
falência, contra a qual não cabe nem adianta deblaterar, mas que é preciso entender
na sua realidade para que o processo de tentativa de superação do capital,
efetivamente, possa ser visualizado e tentado. Ou seja, em lugar de termos hoje, no
mundo, um sistema do capital e um sistema socialista, nós temos dois subsistemas do
capital, diversos entre si, mas confluentes no sentido de universalidade do capital. Não
há capital privado no panorama do Leste europeu, mas há o capital vinculado a uma
figura que denomino – por falta de melhor nome – de capital coletivo/não-social; isto
é, o capital não é dominado e dirigido por todos, quando, então, ele desaparec[er]ia,
mas ele é controlado por um segmento da sociedade, à revelia do conjunto da
sociedade. Vale dizer, não se configurou no Leste europeu aquela colocação de Marx
que é a dissolução, em última instância, ou a apropriação coletiva dessa energia social
que é o capital e que é a matriz lógica das formações sociais. Tanto drama angustiante,
e este fim de século tem neste ponto o grande desafio.
Verinotio
ISSN 1981 - 061X, v. 30, n. 1, pp. 385-391 – jan.-jun., 2025 | 387
nova fase