Os porquês de “Por que Lukács?”
nacional” romeno e os intelectuais que há tempos nutriam desconfiança em relação ao
ocidente, de modo que a “megalomania nacionalista do regime” (Tertulian, 2023, p.
195) encontrou ali amplo substrato intelectual. Nesse contexto, o pensamento
heideggeriano e sua crítica à modernidade ocidental, ao “frenesi da técnica e da razão
instrumental” (Tertulian, 2023, p. 192) floresceu e certos intelectuais romenos
passaram a buscar no “culto heideggeriano do Ser a salvação diante das anomalias e
das malformações da civilização ocidental” (Tertulian, 2023, p. 192).
Em meio a isso, no pensamento de intelectuais como Theodor Adorno, Jean-Paul
Sartre e, principalmente, Lukács, Tertulian via um poderoso antídoto contra tanto o
“marxismo” distorcido do partido, quanto à tendência que se observava de rejeição da
“análise lúcida das contradições da sociedade” (Tertulian, 2023, p. 191) em prol de
uma “ressurreição das ideologias conservadoras, cuja moeda corrente era a crítica
romântica da modernidade, com seu cortejo de representações religiosas e místicas”
(Tertulian, 2023, p. 191). Em razão disso, dedicava-se à divulgação do pensamento
desses autores na Romênia, tanto por meio de traduções quanto de cursos que
ministrava na Faculdade de Filosofia da Universidade de Budapeste. Esse projeto de
divulgação foi recebido com grande satisfação por Lukács, com quem Tertulian
desenvolveu forte amizade, tendo o autor húngaro expressado em uma carta ao jovem
romeno seu grande contentamento com a dedicação de Tertulian em divulgar sua obra
e seu pensamento para o público romeno.
O fato de Tertulian ter conseguido publicar diversas obras de Lukács na Romênia
de Ceaușescu pode parecer contraditório, mas, ironicamente, foi possibilitado
justamente pela própria política do regime romeno. Buscando afirmar o nacionalismo
e a independência da Romênia em relação à linha da URSS, o regime era marcado por
certa tolerância na política editorial, a fim de mostrar a aparência de trilhar em um
caminho distinto dos países do Pacto da Varsóvia, assegurando, assim, sua desejada
“autonomia nacional”, e, o mesmo tempo, não perder o controle absoluto sobre o país,
por meio de uma “ditadura do mais puro tipo neostaliniano” (Tertulian, 2023, p. 48).
Todavia, ainda que a obra de Lukács fosse recebida entre os ideólogos oficiais com
silêncio e desprezo, Tertulian obteve grande sucesso na publicação de várias obras de
Lukács, como O romance histórico, A teoria do romance, Para uma ontologia do ser
social e A peculiaridade do estético. Entretanto, não havia como defender um
pensamento que não só se opusesse ao marxismo stalinista, mas também ao
Verinotio
ISSN 1981 - 061X v. 28 n. 2, pp. 429-442 - jul-dez, 2023 | 433
nova fase