DOI 10.36638/1981-061X.2024.29.2.727  
O caminho de Marx para Hegel:  
a busca do conceito e a crítica do existente  
The Marx's path to Hegel:  
The search for the concept and the criticism  
of the existing  
Murilo Leite Pereira Neto*  
Resumo: Neste trabalho, buscamos expor, a  
partir da leitura imanente dos textos do próprio  
Marx, a filiação do pensador alemão ao  
pensamento de Hegel e ao hegelianismo.  
Caminhou-se, no presente texto, pelas veredas  
que levaram o “vigoroso andarilho”, como Marx  
se intitula na carta ao pai (1837), ao pensamento  
hegeliano, pois, apesar da vasta bibliografia  
disponível sobre a relação entre Marx e Hegel,  
ainda é diminuto o material que procura analisar  
o modo pelo qual Marx adere ao hegelianismo.  
Pode-se debater em que medida Marx se  
manteve hegeliano ao longo do seu itinerário  
intelectual, qual a medida do distanciamento que  
o autor de O capital guardou em relação ao  
último filósofo do Idealismo Alemão, se houve  
ruptura e o grau dessa ruptura. Antes, contudo,  
é necessário compreender como o jovem alemão  
se tornou discípulo de Hegel e que tipo de  
discípulo foi Marx. Nossa análise percorreu os  
diversos textos do período acadêmico do autor,  
os quais contemplam variados materiais, como  
correspondências, escritos literários, anotações e  
o que restou da sua tese doutoral. Procuramos  
Abstract: In this paper, we seek to expose the  
Marx’s affiliation to the thoughts of Hegel and  
hegelianism, from the standpoint of an  
immanent reading of Marx’s own writings. We  
tread the narrow paths that took the ‘vigorous  
strider’, as Marx labels himself in his Letter from  
Marx to his Father (1837), to hegelian thought.  
We do so, because despite the widely available  
bibliography in several languages on the  
relations between Marx and Hegel, there is still  
not enough material dedicated to the manner  
according to which Marx complied with  
hegelianism. One can debate on how much did  
Marx abide by hegelianism throughout his own  
intellectual itinerary; or how far did the author  
of Das Kapital keep himself from German  
Idealism’s last philosopher; or whether there  
has been any severance and its degree. Yet,  
before that, it’s necessary to understand how  
the young German became Hegel’s disciple, and  
what kind of disciple Marx was. Our analysis  
traverses along many texts from the author’s  
academic timespan. These comprise various  
subjects, such as mail, literary writings, notes  
and the remains of his doctoral thesis. We’ve  
aimed at demonstrating that Marx’s adherence  
to hegelianism happened in 1837. He critiqued  
Kant’s and Fichte’s idealism.  
demonstrar que  
a
adesão de Marx ao  
hegelianismo ocorreu em 1837, a partir da crítica  
ao idealismo de Kant e Fichte.  
Palavras-chave: Marx; Hegel; hegelianismo.  
Keywords: Marx; Hegel; hegelianism  
Introdução  
Procuramos apreender o caminho de Marx ao hegelianismo no conjunto de  
escritos do seu período acadêmico, compreendido de 17 de outubro de 1835, data  
*
Doutor em direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Professor efetivo do curso de  
direito na Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg), campus Ituiutaba.  
Verinotio  
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O caminho de Marx para Hegel: a busca do conceito e a crítica do existente  
em que se matriculou na Universidade de Bonn, onde permaneceu até 22 de outubro  
do ano seguinte, quando ingressou na Universidade de Berlim, em 15 de abril de  
1841, data da sua diplomação como doutor em Filosofia pela Universidade de Jena.  
Nesse período, Marx produziu textos literários, nos quais aparecem as primeiras  
menções a Hegel, excertos de obras, anotações preparatórias para a tese, a própria  
tese doutoral e um conjunto de correspondências. Foram 32 cartas enviadas a Marx  
nesse período. O pai de Marx e Bruno Bauer são seus principais correspondentes.  
Infelizmente, foram preservadas apenas três cartas escritas por nosso autor1. Duas  
dessas cartas possuem caráter unicamente biográfico, ambas enviadas em abril de  
1841. A primeira, datada de 6 de abril, destinava-se ao envio da tese doutoral à banca  
examinadora e endereçava-se a Karl Friedrich Bachmann; na segunda, enviada no dia  
seguinte, Marx agradecia o professor Oskar Ludwig Bernhard Wolff, por apressar a  
emissão do seu diploma2. Assim, para este trabalho, do período acadêmico de Marx,  
apenas interessa uma dessas três cartas preservadas, a que foi escrita na madrugada  
de 10 para 11 de novembro de 1837, destinada ao seu pai, chamada, por isso, de  
Carta ao pai.  
Analisaremos mais detidamente a Carta ao pai e o material referente à tese  
doutoral, sem, contudo, descuidar dos demais textos que possam iluminar o caminho  
de Marx para Hegel e o hegelianismo. Na Carta ao pai e na tese doutoral, encontramos  
dois momentos complementares da adesão de Marx ao pensamento hegeliano.  
Explicitar esses dois momentos é o objetivo deste trabalho, pois, além do valor em si,  
de revelar a fisionomia intelectual de Marx em um período tão pouco estudado,  
acreditamos que a compreensão do modo pelo qual Marx se posicionou diante de  
Hegel e do hegelianismo poderá auxiliar no devido entendimento das primeiras  
1
Não há dúvida, após análise das correspondências, que parte do epistolário de Marx foi perdido,  
aplicando-se bem aquilo que os estudos epistolares chamam de quebra do pacto epistolar, haja vista  
que o responsável pelo cuidado e arquivamento da carta é o destinatário. Marx foi, sem dúvida, melhor  
guardião das cartas que recebeu do que os seus correspondentes, pelo menos, para o período aqui  
estudado.  
2
Essas duas correspondências são provas cabais da pressa de Marx para obter o título de doutor,  
sentimento que já pode ser sentido nas cartas escritas por Bruno Bauer ao nosso autor. O título de  
doutor era fundamental para que Marx conseguisse viver da docência universitária, algo que nunca  
chegou a se realizar. O cerco da censura prussiana à juventude hegeliana se fechou quando nosso autor  
concluía sua tese. Mas em abril de 1841 ainda havia alguma esperança, ainda que dominada pelo  
sentimento de urgência. Marx escreve a Karl Friedrich Bachmann: “Solicito também, sinceramente, caso  
meu trabalho seja suficiente, que o corpo docente acelere a concessão do doutorado, para o mais breve  
possível. Por um lado, só posso ficar mais algumas semanas em Berlim, por outro lado, as circunstâncias  
externas tornam muito desejável obter o doutorado antes de partir.” (MARX; ENGELS, 1975b, p. 19,  
tradução nossa)  
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intervenções do jovem autor no debate público alemão, nas páginas da Gazeta Renana,  
o “periódico democrático” (ENGELS, 2010, p. 530), bem como ajudar na medida e nos  
motivos da ruptura com Hegel e com o hegelianismo, que ganha força nos Manuscritos  
de Kreuznach, conhecidos como Crítica da filosofia do direito de Hegel. Este trabalho  
se insere, portanto, em um projeto mais amplo que busca analisar o itinerário  
intelectual de Marx, pois, acompanhando seu desenvolvimento, será possível dizer com  
rigor o que foi o pensamento marxiano.  
Sobre a formação acadêmica de Marx: uma crítica a Roberto Lyra Filho  
Apesar do doutoramento em filosofia pela Universidade de Jena, a formação  
acadêmica de Marx ocorreu no curso de Direito e cameralística3, contudo, essa segunda  
área de formação parece não ter recebido tanta atenção por parte do jovem estudante  
alemão4. Não deixa de ser curioso que Marx venha, anos depois, a ter que estudar  
economia política e temas correlatos, não mais para servir ao estado, mas para criticá-  
lo. De outro lado, os estudos jurídicos do período acadêmico podem ser caracterizados  
como, no mínimo, consistentes. Marx cursou inúmeras disciplinas jurídicas, em maior  
quantidade que todas as outras somadas (cf. PEREIRA NETO, 2022). Assim, um estudo  
cuidadoso do período acadêmico de Marx demonstra o equívoco de Lyra Filho ao  
apontar no autor alemão certa indisposição psicológica em relação ao direito. Segundo  
o autor brasileiro, parte das críticas de Marx ao direito, principalmente, as mais  
contundentes se deveram às “decepções estudantis” vivenciadas durante o período  
universitário:  
há uma eterna ambiguidade, uma frequente oscilação, um ir-e-vir entre  
3
Segundo Flávio Oliveira (2021, p. 1), “concebido para assessorar o governo monárquico quanto à  
solução de questões práticas de administração pública, política econômica e finanças, o cameralismo  
produziu efeitos de longo prazo, constituindo os alicerces sobre os quais se assentam, de um lado, a  
Nationalökonomie, e de outro a perspectiva orgânica inerente à organização estatal alemã”.  
4 Em missiva datada entre fevereiro e março de 1836, época em que Marx ainda estava na Universidade  
de Bonn, Heinrich Marx, ao discutir os estudos do filho, após reclamar das poucas cartas que este último  
tinha enviado até então, recomendou que curse, antes de transferir-se para Berlim, “apenas uma  
introdução geral à cameralística, porque é sempre bom ter uma visão geral do que se deve fazer um  
dia” (MARX; ENGELS, 1975b, p. 293, tradução nossa). Em 20 de agosto, Marx parece ter amenizado a  
preocupação paterna quanto a esta área de estudo, pois seu pai assim escreveu: “Depois de seus  
projetos, parece-me desnecessário preocupá-lo com a cameralística” (MARX; ENGELS, 1975b, p. 315,  
tradução nossa). Pouco tempo depois, em carta datada de 16 de setembro de 1837, portanto, já em  
Berlim, ele volta a questionar o filho acerca da profissão a ser exercida no futuro e pergunta: “por que  
você não diz nada sobre cameralística?”. Em seguida, na mesma correspondência, seu pai aconselha,  
ainda tomando os planos de Marx em seguir, também, uma carreira literária: “Não sei se estou enganado,  
mas parece-me que poesia e literatura são mais propensas a encontrar patronos na administração do  
que no judiciário, e um conselheiro de governo cantor parece-me mais natural do que um juiz cantor.”  
(MARX; ENGELS, 1975b, p. 318, tradução nossa)  
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afirmação e negação de certo direito, às vezes inflado em negação do  
Direito tout court, que, entretanto, se revela, menos como uma  
questão de princípio, do que como reflexo e vestígio das decepções  
estudantis (LYRA FILHO, 1983, p. 42).  
Antes, o autor de Diálogo com Marx sobre o direito nos oferece um exemplar  
raro de imputação e impropriedade, pois, ele escreve:  
Marx era filho de advogado e principiou seu roteiro universitário como  
estudante de Direito. Sua desilusão e rompimento com a carreira  
jurídica tem muita semelhança com o equívoco de tantos jovens  
contemporâneos. Quando chegam aos bancos acadêmicos, no  
alvoroço de inquietações e ideias apresadas e não isentos de  
impaciência e sentimentalismo, defrontam-se com as patacoadas  
rotineiras, os catedráticos subservientes, a dogmática obtusa e  
alienante, o estômago de avestruz dos positivistas engolindo qualquer  
pacote das prepotências estatais que o famoso “toque de midas”  
kelseniano transforma em “neutros” produtos “jurídicos”. Diante  
disso, muitos rapazes e moças progressistas logo se deixam tomar  
por um nojo não injustificado, que, porém, injustificadamente, vai  
tender à equiparação do lixo legislativo com o íntegro universo  
jurídico, sem perceber, sequer, que, dialeticamente, o estrume das  
estruturas corruptas serve também de adubo à contestação e  
florescimento de afirmações jurídicas para, supra e metalegais,  
oriundas de classes e grupos espoliados e oprimidos. (LYRA FILHO,  
1983, p. 40)  
Definitivamente, não foram esses os motivos que levaram Marx a criticar o  
direito, menos ainda foram esses os motivos que o levaram a concluir sua formação  
acadêmica com uma tese de doutorado em filosofia. Com relação à crítica de Marx ao  
direito, o ponto de inflexão ocorre nos escritos de Kreuznach, a partir da crítica que  
Chasin chamou de crítica ontológica ao pensamento especulativo, embora, mesmo  
nesses textos, a crítica não se dirija ao direito tout court, e sim a certo direito presente  
na monarquia constitucional, forma de Estado não democrática. Já na Gazeta Renana,  
sem ainda formular uma crítica à filosofia do direito hegeliana, portanto, sem uma  
crítica direta à monarquia constitucional, o que encontramos é certamente uma defesa  
do direito, embora em oposição ao direito positivo então existente na Prússia ou  
aquele saído dos debates da Dieta Renana. Essa defesa só pode ser bem entendida  
quando se compreende o modo pelo qual Marx adere ao pensamento hegeliano, que,  
também, servirá de explicação dos motivos que levaram Marx a concluir sua formação  
acadêmica com a tese doutoral sobre Epicuro e Demócrito. Muito distante de qualquer  
indisposição psicológica.  
Além disso, não é necessário muito esforço para desmontar a cena criada pelo  
lyrismo, afinal, o anacronismo é patente. Fiquemos apenas com o sentido geral, isto é,  
supostamente, Marx teria se decepcionado com o curso de direito, com o ensino da  
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matéria, portanto. E disso decorre sua oposição ao direito, que, como dissemos, sequer  
se inicia nesse momento, mas, no mínimo, dois anos depois. Contra o lyrismo, podemos  
argumentar que a relação de Marx com seu pai, advogado de profissão, poderia ter  
inspirado o filho a seguir os caminhos do velho Heinrich Marx. Com relação aos  
professores, Marx seguiu alguns cursos de Savigny e de seus alunos, figura de proa  
do movimento conservador alemão, alvo de inúmeras críticas posteriores de Marx, mas,  
por outro lado, Marx também acompanhou dois cursos de Eduard Gans, grande nome  
da escola hegeliana e importante para o movimento liberal alemão do Vormärz. Os  
estímulos psicológicos, chamemos assim, são múltiplos, pois, e não há provas textuais  
para atribuir peso destacado a qualquer desses estímulos. Há provas textuais, no  
entanto, para descartar o argumento de Lyra Filho, além dos já aludidos neste texto,  
pois, na famosa Carta ao pai, escrita quando Marx cursava direito e cameralística, a  
tese psicológica sofre mais um revés. Nessa carta, lemos a seguinte declaração do  
jovem estudante universitário, quando debatia com o pai sobre seu futuro  
profissional5:  
Quanto à questão da carreira de cameralista, meu querido pai, conheci  
recentemente um assessor Schmidthänner, que me aconselhou a  
continuar como justitiarius após o terceiro exame jurídico, o que me  
agradaria muito mais já que eu realmente prefiro jurisprudência à  
ciência administrativa [Verwaltungswissenschaft]. (MARX; ENGELS,  
1975b, p. 293, tradução nossa)  
A passagem supracitada é provavelmente uma resposta à carta anterior de seu  
pai, na qual este opina que uma carreia de cameralista se adequaria mais às pretensões  
artísticas do filho que uma carreira como advogado, talvez, pela maior segurança  
financeira, afinal, diz o pai, “parece-me que poesia e literatura são mais propensas a  
encontrar patronos na administração do que no judiciário” (MARX; ENGELS, 1975b, p.  
318, tradução nossa). A carreira de Marx foi discutida com certa recorrência na  
comunicação epistolar de ambos, pai e filho, e nela não encontramos nenhum vestígio  
da indisposição psicológica do jovem estudante com a profissão e com a matéria em  
si.  
Tomando como parâmetro de leitura a análise imanente proposta por J. Chasin  
(2009), a qual foi bem explicada por Vaisman e Fortes ao dizerem que essa “não se  
trata de simples alinhavo de paráfrases ou de atulhamento do escrito com citações em  
5
Como é de se esperar de um pai preocupado, discussões sobre a carreira do filho são bastante  
recorrentes na comunicação epistolar de Marx com seu pai.  
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O caminho de Marx para Hegel: a busca do conceito e a crítica do existente  
grande quantidade, enumeradas acriteriosamente pelo intérprete de acordo com suas  
próprias crenças e convicções”, pois constitui “procedimento investigativo de rigor que  
almeja identificar a estrutura categorial das obras”, sendo, por isso, “atitude de  
respeito ao texto, em que o intérprete se subordina ao sentido nele existente  
objetivamente”, podemos afirmar com segurança que o juízo de Lyra Filho segue pelo  
caminho oposto àquele da “atitude de espeito ao texto”. Este último adota postura  
mais cômoda ao “atribuir ao material estudado o significado que subjetivamente [ele  
foi] capaz de formular, à revelia da própria tessitura significativa presente no[s]  
escrito[s]” (VAISMAN; FORTES, 2020, p. XII), neste caso, de Marx. Trata-se de pura  
imputação do jurista brasileiro, que no seu diálogo com Marx falou mais que escutou.  
Mesmo o método que se chama divinatório ou psicológico de Schleiermacher  
não prescinde do texto. Lyra Filho foi longe demais, pois desconsidera que antes de  
se tornar crítico do direito tout court, Marx foi durante o período acadêmico e da  
Gazeta Renana um defensor do direito, transitando para a crítica ao direito tão somente  
a partir dos escritos de Kreuznach, posição que evolui ao longo de seu itinerário  
intelectual6. Por desconsiderar as mudanças ocorridas ao longo do itinerário intelectual  
de Marx, Lyra Filho atribui diversas posições do autor alemão frente ao direito e acaba  
por acusar Marx de paralogismos.  
Acreditamos que os equívocos observados na interpretação de Lyra Filho não  
ocorreriam caso o jurista tivesse medido melhor o peso da adesão do jovem Marx ao  
pensamento de Hegel, o que pretendemos fazer nas próximas páginas deste artigo, o  
qual percorre todo o período acadêmico de Marx e se divide em dois tópicos. No  
primeiro, analisamos a Carta ao pai, documento que registra as primeiras avaliações  
de Marx acerca do idealismo alemão e sua adesão ao pensamento de Hegel; ao passo  
que o tópico ulterior investiga o modo pelo qual Marx encarou a tarefa da filosofia no  
seu tempo a partir de cerca posição declarada frente ao movimento hegeliano e ao  
próprio pensamento do mestre, posição que prepara o terreno sobre o qual caminhou  
sua intervenção pública como redator da Gazeta Renana. No caso do segundo tópico,  
trataremos da tese doutoral e daqueles seus materiais preparatórios. Cotejaremos,  
sempre que necessário, com passagens retiradas das correspondências, dos excertos  
de textos e, também, da produção literária do autor.  
6 Para citar apenas um, cf. Sartori (2018a).  
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De Kant e Fichte a Hegel: a busca do Conceito  
No espólio de textos legados por Marx, há pelo menos dois dos seus escritos  
dedicados a delinear e analisar retrospectivamente o curso dos seus estudos e  
descobertas, o mais conhecido é o “prefácio” de Contribuição à crítica da economia  
política, muitas vezes chamado simplesmente de “Prefácio de 1859, no qual o autor,  
lembrando o que escreveu 22 anos antes, em 1837, sentiu-se “compelido a olhar o  
passado e o presente com os olhos de águia do pensamento, de modo a chegar à  
consciência de [sua] posição real” (MARX; ENGELS, 1975b, p. 9, tradução nossa). Nesse  
texto de 1859, Marx faz “algumas alusões sobre o caminho percorrido pelos [seus]  
próprios estudos político-econômicos” (MARX; ENGELS, 1961, p. 7, tradução nossa),  
e sua memória o leva aos primeiros passos dessa caminhada, dados ainda no período  
acadêmico. O outro escrito de prestação de contas e retrospectiva do seu próprio  
desenvolvimento intelectual, documento que será analisado neste tópico, é a Carta ao  
pai, escrita em novembro de 1837. Menos sistemática que o texto de 1859, esta carta  
é um pedido de Heinrich Marx para que seu filho apresente seu plano de estudos7.  
Como é possível depreender do epistolário de Marx, este costumava enviar seus planos  
de estudos e projetos acerca do futuro profissional ao pai, com menor frequência que  
o desejado pelo velho Marx.  
Seu pai não ficou nada contente com a carta, descontentamento que não  
escondeu do filho, pois, já na carta seguinte, queixou-se dizendo que: “depois de um  
período de dois meses, [...] recebo uma carta sem forma nem conteúdo, um fragmento  
rasgado, sem sentido, sem conexão com o que veio antes e sem conexão com o futuro!”  
(MARX; ENGELS, 1975b, p. 321, tradução nossa). Essa passagem da carta paterna,  
que provavelmente responde à missiva de novembro de 1837, transmite a monta da  
insatisfação paterna e do desafio analítico que este escrito impõe ao intérprete.  
A bagunça da carta, bem medida na avaliação paterna, possibilita-nos, também,  
compreender a dimensão da inflexão ocorrida no pensamento do jovem Marx naquele  
ano, além da personalidade instável, típica da juventude, diante de novas descobertas.  
Marx revelou nessa missiva a sua caminhada em direção a Hegel e apanhou seu pai  
de surpresa, afinal, até aquele momento, o grande filósofo alemão apenas havia  
recebido menções críticas e, muitas vezes, jocosas do jovem estudante universitário.  
7
Um dos pedidos de seu pai pode ser lido na carta de 20 de agosto de 1837: “Se você tiver tempo  
livre e me escrever, ficarei grato se você esboçar um plano conciso de quais estudos jurídicos positivos  
você realizou este ano.” (MARX; ENGELS, 1975b, p. 315, tradução nossa)  
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O caminho de Marx para Hegel: a busca do conceito e a crítica do existente  
Hegel aparece algumas vezes no material literário do nosso autor, sempre de maneira  
depreciativa8. É bastante provável que Marx só tenha lido, de fato, Hegel em 1837,  
portanto, essas menções eram carregadas de preconceito9.  
Então, ao invés de enviar organizadamente as informações solicitadas pelo pai,  
Marx escreveu, na visão paterna, uma carta fragmentariamente picotada, por isso, sem  
forma ou conteúdo e, além disso, o que é ainda mais preocupante, a carta refletia uma  
pessoa em conflito interno, dilacerado10. A carta do pai é bastante severa, como se  
pode verificar na passagem transcrita abaixo:  
Falando francamente, meu querido Karl, não gosto dessa expressão  
moderna em que todos os fracos se disfarçam quando brigam com o  
mundo, de modo que eles não possuem palácios bem mobiliados com  
milhões de carruagens sem todo o trabalho e esforço. Esse  
dilaceramento [Zerrissenheit] é repugnante para mim, e eu não espero  
isso de você. Que razão você pode ter para estar deste modo? Tudo  
não sorriu para você desde o berço? A natureza não o presenteou  
maravilhosamente? Seus pais não o abraçaram com amor pródigo?  
Você já falhou em satisfazer seus desejos razoáveis? E você, da  
maneira mais incompreensível, não ganhou o coração de uma garota  
que milhares o invejam? E a primeira adversidade, o primeiro desejo  
malsucedido, mesmo assim, produz dilaceramento [Zerrissenheit]! Isso  
é força? Isso é caráter masculino? (MARX; ENGELS, 1975b, p. 321,  
tradução nossa)  
Foi dessa maneira que seu pai respondeu a carta de 1837, texto confuso e, até  
certo ponto, enigmático, mas que registra o caminho de Marx para Hegel. O primeiro  
tinha consciência que aquele ano marcava uma “nova direção” para a sua vida  
8 Cf. uma série de epigramas intitulado “Hegel”, presente no caderno endereçado ao seu pai por conta  
do aniversário desse último, no início de 1837, no qual Marx, comparando Hegel a Kant e Fichte, adota  
posição favorável aos últimos (MARX; ENGELS, 1975a, pp. 644-6). Ainda, no fragmento do seu romance  
humorístico, intitulado Escorpião e Félix, também presente no caderno oferecido ao pai, no capítulo 21,  
das “reflexões filológicas”, há uma passagem em que se lê: “De acordo com o exposto, uma vez que  
entre os velhos alemães o nome se originava de diversos adjetivos e expressava o caráter de seu  
portador – como Krug, o cavaleiro; Raupach, o conselheiro da corte; Hegel, o anão” (MARX, 2018b, p.  
20). Interessante perceber que, além de relacionar Hegel à pequenez, os outros nomes que figuram ao  
seu lado são de personalidades menores do pensamento alemão, o primeiro Wilhelm Traugott Krug  
sucessor de Kant em Königsberg; e o outro é Ernst Raupach, sucessor de Friedrich Schiller. Páginas  
adiante, no mesmo fragmento de romance, fica explícita a desdenha de Marx em relação a Hegel: “os  
primeiros são demasiado grandes para este mundo; por isso são lançados fora. Os últimos, porém,  
deitam raízes e permanecem, como os atos nos mostram, pois o champanhe deixa um perseverante e  
repulsivo sabor final, o heroico César deixa atrás de si o ator Otaviano; o imperador Napoleão, o rei  
burguês Luís Filipe; o filósofo Kant, o cavaleiro Krug; o poeta Schiller, o conselheiro a corte Raupach; o  
celeste Leibniz, o aprendiz Wolff; o cão Bonifácio, este capítulo” (MARX, 2018b, p. 40).  
9
Nossa afirmação encontra fundamento na própria carta ao pai, onde lemos que, primeiramente, ele  
“havia lido fragmentos de filosofia hegeliana cuja grotesca melodia rochosa” não o agradou; e mais a  
frente, na carta, ele diz ao pai que durante sua temporada em Stralow, onde foi se recuperar de um  
mal-estar, estudou “Hegel do começo ao fim” (MARX; ENGELS, 1975b, pp. 16-7, tradução nossa).  
10  
Assim escreve o pai de Marx: “Eu havia escrito várias cartas, algumas das quais solicitavam  
informações. E em vez disso, uma carta fragmentária, e o que é ainda pior, uma carta amargurada...”  
(MARX; ENGELS, 1975b, p. 321, tradução nossa)  
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privada11 e, especialmente, para a sua vida intelectual. Ele escreveu a tão solicitada  
Carta ao pai em um daqueles “momentos da vida que são como um marco de um  
tempo passado e que, simultaneamente, apontam com firmeza uma nova direção”  
(MARX, 2018a, p. 425). Foi, portanto, posicionado do “ponto de inflexão” do seu  
pensamento, podemos dizer, do primeiro ponto de inflexão, quando “tudo o que [lhe]  
era mais sagrado foi dilacerado [zerrissen], e novos deuses tinham de ser encontrados”  
(MARX, 2018a, p. 429), que o jovem Marx procurou compreender sua “verdadeira  
posição”, expondo-a ao pai, ainda que sem forma ou conteúdo.  
É certo que a “nova direção” tomada exigia que se abandonasse uma série de  
concepções que nutriu sua vida intelectual até então, obrigando-o à crítica  
avassaladora do seu passado e à busca desenfreada, como um “vigoroso andarilho”,  
da nova concepção capaz de abrigar seu pensamento atual. Nesse sentido, é possível  
destacar duas frentes de ataque às suas velhas posições: uma no campo da estética e  
outra no campo daquilo que poderíamos chamar de filosófico-jurídico.  
Na primeira frente, Marx teria realizado várias tentativas. Inicialmente, dedicou-  
se à poesia lírica, mas, ao final, deu-se conta que “tratava-se de uma poesia puramente  
ideal” (MARX, 2018a, p. 426), chega mesmo a avaliar criticamente as produções  
poéticas contidas nos dois cadernos enviados a Jenny: “não obstante, talvez certo calor  
sentimental e uma luta por impulso também caracterizem todos os poemas dos três  
primeiros cadernos que enviei a Jenny” (MARX, 2018a, p. 426). A caracterização da  
crise estética como uma crise da forma que acaba por comprometer o conteúdo pode  
ser bem apreendida na passagem abaixo:  
Meu céu e minha arte tornaram-se mundos tão distantes quanto meu  
amor. Assim, desfoca-se todo o real, e tudo o que é desfocado não  
tem limites, culminando em ataques ao presente, sentimentos  
abrangentes e disformes, sem nada de natural, tudo construído da lua,  
exatamente o contrário daquilo que é e daquilo que deve ser,  
reflexões retóricas em vez de pensamentos poéticos. (MARX, 2018a,  
p. 426)  
A autocrítica desse período impactou sobremaneira sua produção literária, a  
ponto de ter queimado todo o material produzido12. É comum se afirmar que essa crise  
estética é a crise da posição romântica de Marx, hipótese que não parece desprovida  
11  
Diz Marx ao pai: “quando deixei vocês, um novo mundo havia se aberto para mim, o do amor [...]”  
(MARX, 2018a, p. 426).  
12 Marx relata na carta: “queimei todos os poemas, os esboços de novelas etc., na louca ilusão de que  
poderia assim, deixar tudo isso para trás – o que parece, até agora, de fato funcionar” (MARX, 2018a,  
p. 431).  
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de sentido, contudo, não passa ainda de hipótese a ser verificada, afinal, também não  
faltam aqueles que procuram no romantismo “uma das fontes esquecidas de Marx e  
Engels” (LÖWY; SAYRE, 1995, p. 135), mas carecem de provas robustas. Atualmente,  
um bom ponto de partida, em termos de bibliografia secundária, parece ser a biografia  
de Marx escrita por Michael Heinrich (2018), pois acumula importantes informações,  
contudo não pode ser mais que isso, ponto de partida, afinal, é necessário encontrar  
nos próprios textos o romantismo do jovem literato Marx, analisá-lo e, então, tratar da  
sua crítica e da “nova direção” assumida. O suposto romantismo de Marx e sua  
superação precisa ser bem medido, ainda mais quando se trata do romantismo alemão,  
movimento que contempla inúmeras fases, autores que transitaram do romantismo ao  
classicismo, como Goethe; sem falar do abismo que separa um Herder de um Schlegel.  
Não nos parece suficiente identificar no autor temáticas antiburguesas e concluir por  
seu suposto romantismo. Pensamos que é necessário, além disso, ir à forma. Eis um  
ponto a ser mais bem trabalhado pela marxologia13.  
Na frente de ataque que chamamos aqui filosófico-jurídica, Marx é bem mais  
explícito no relato da sua antiga posição e na indicação daquela que seria sua nova  
direção. Primeiramente, vale ressaltar certa imprecisão de Marx quando,  
aproximadamente duas décadas depois do seu período acadêmico, ele relembra, no  
Prefácio de 1859”, sua formação e diz ter estudado direito, “minha especialidade”,  
tão somente “como disciplina subordinada ao lado de Filosofia e História” (MARX;  
ENGELS, 1961, p. 7, tradução nossa). Esse caráter de “disciplina subordinada” não  
parece ser uma lembrança tão precisa. Não é esse o espírito da Carta ao pai, na qual  
ele relata seus empreendimentos intelectuais envolvendo a matéria de sua  
especialidade. Na carta de 1837, nosso autor escreve sobre um projeto que tomou  
parte do seu tempo naquele ano, tratava-se de “um trabalho de quase trezentas  
folhas”, do qual, “como introdução, escrev[eu] frases metafísicas e desenvolv[eu] essa  
infeliz obra até o direito público” (MARX, 2018a, p. 426). Na mesma carta, Marx relata  
ter estudado uma série de juristas, como Johann Gottlieb Heineccius e Anton Friedrich  
Justus Thibaut, além das fontes de Savigny e de ter traduzido parte do Digesto, no  
entanto, diz ele que o fez “como um colegial”14, isto é, “de modo puramente acrítico”  
13 Além de Löwy e Sayre e da importante biografia de Michael Heinrich, sobre a relação de Marx com o  
romantismo, cf. Prawer (1978) e, no Brasil, Sartori (2018b; 2019) aporta importantes considerações  
nessa temática.  
14 O adjetivo utilizado por Marx foi schülerhaft. O sentido é francamente pejorativo, pois, segundo consta  
no famoso Deutsches Wörterbuch von Jacob Grimm und Wilhelm Grimm, o termo refere “todos os tipos  
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(MARX, 2018a, p. 426). Adiante ele diz ter lido Ernst Ferdinand Klein, seu Direito  
criminal e seu Anais e, depois, alude que passou um tempo dedicando-se  
“exclusivamente aos estudos positivos” (MARX, 2018a, p. 429). Segue abaixo seu  
relato:  
[...] li o trabalho sobre a posse de Savigny, o direito criminal de  
Feuerbach e Grolman, o De verborum significatione de Cramer, o  
sistema do Digesto de Wening-Ingenheim, o Doctrina pandectarum de  
Mühlenbruch, que ainda estou estudando, e, por fim, alguns títulos de  
Lauterbach que tratam do direito civil e, sobretudo, do direito  
canônico de cuja primeira parte, a Concordia discordantium  
canonum de Graciano, li e resumi o texto original quase integralmente,  
assim como o anexo, o Institutiones de Lancelotti. [...] também vi um  
pouco de direito germânico, mas apenas de modo indireto, ao estudar  
as capitulares dos reis francos e as cartas enviadas a eles pelos papas  
(MARX, 2018a, p. 430).  
O jovem estudante também relatou ter lido e tomado nota de outras obras15,  
como o “Laocoonte de Lessing, o Erwin de Solger, a História da arte de Winckelmann,  
a História alemã de Luden” e “anotando sempre algumas reflexões”, além de ter  
traduzido a Germânia de Tácito, a Tristia de Ovídio e partes da Retórica de Aristóteles,  
também leu “o De augmentis scientiarum do famoso Bacon de Verulâmio, [e se  
ocupado] muito com Reimarus e refleti[do] voluptuosamente sobre seu livro Acerca do  
instinto artístico dos animais”. Resta claro que Marx não se dedicou ao direito apenas  
como “disciplina subordinada”, pelo menos, não durante boa parte do seu período  
acadêmico. Infelizmente, as notas, resumos, reflexões e excertos que Marx  
possivelmente realizou durante esse período não foram preservados, pois os primeiros  
cadernos que temos publicados pela Mega datam do inverno de 1839, são as suas  
anotações preparatórias para a tese doutoral. Mas, como sumariado em Pereira Neto  
(2022), é certo que Marx não esteve matriculado em disciplinas jurídicas apenas nos  
dois últimos semestres universitários, no verão de 1839 e no inverno de 1840-41,  
quando, seguramente, suas energias já estavam voltadas para o estudo e escrita da  
tese, e os planos já eram tornar-se professor universitário.  
Segundo Marx, “chegando em Berlim”, depois de cortar todas as ligações com  
o mundo externo, tratou imediatamente de “imergir na ciência e na arte” (MARX;  
ENGELS, 1975b, p. 10, tradução nossa) e, diz ele, logo percebeu que “a poesia pôde  
de comportamento indecente dos alunos, comportamento de colegial, vestimenta ruim, modos  
indelicados, desempenho desleixado”.  
15  
“Nessa época, adquiri o costume de resumir todos os livros que lia [...].” (MARX, 2018a, p. 429)  
Costume que ele manteve até o final da vida.  
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[durfte] e houve de ser [sollte] apenas uma acompanhante” sua, afinal, confessa: “eu  
tive que [mußte] estudar Jurisprudência e, acima de tudo, senti o ímpeto de lutar com  
a filosofia” (MARX; ENGELS, 1975b, p. 10, tradução nossa). No “Prefácio de 1859,  
Marx se esqueceu de incluir a poesia, ou preferiu omitir essa informação. Quanto ao  
direito e à filosofia, percebe-se na Carta ao pai que nosso autor procurou conjugar  
ambas as matérias num só empreendimento, que ele assim o descreveu:  
Ambas foram conectadas de tal forma que, em parte, eu estudei  
Heineccius, Thibaut e as fontes de forma puramente acrítica, apenas  
de forma colegial, por exemplo, traduzindo os dois primeiros livros  
das Pandectas para o alemão, e em parte tentei realizar uma filosofia  
do direito por meio da esfera jurídica. Como introdução, avancei com  
alguns teoremas metafísicos e conduzi esta infeliz opus até o direito  
público, uma obra de quase 300 folhas. (MARX; ENGELS, 1975b, p.  
10, tradução nossa)  
Esse projeto de “realizar uma filosofia do direito”, diz Marx, resultou numa  
divisão em duas partes, intituladas “metafísica do direito” e “filosofia do direito”, que,  
por sua vez, contaria com duas seções, “doutrina formal” e “doutrina material do  
direito”. Ainda segundo nosso autor, a Metaphysik des Rechts cuidaria dos “princípios,  
reflexões conceituais, separados de todo direito efetivo e de cada forma efetiva do  
direito”; ao passo que a Rechtsphilosophie deveria tratar:  
[...] [d]a análise do desenvolvimento das ideias no direito positivo  
romano, como se o direito positivo, no desenvolvimento de suas ideias  
(não me refiro a suas determinações puramente finitas), nem sequer  
pudesse ser algo diferente da formação do conceito de direito que  
deveria ser abordado na primeira parte (MARX, 2018a, 427).  
Ainda sobre a sua Rechtsphilosophie, Marx escreve na carta que a seção sobre  
a doutrina formal do direito “descreveria a forma pura do sistema em sua sucessão e  
em sua correlação, além da divisão e da extensão”, ao passo que a segunda seção,  
doutrina material do direito, “trataria do conteúdo, ou seja, do condensar-se da forma  
em seu conteúdo”. É de se lamentar que esse material de quase 300 folhas não tenha  
sido preservado, o que termina por limitar material e objetivamente nosso trabalho de  
investigação. No entanto, a partir do relatado ao pai, é possível deduzir alguns  
elementos desse projeto que nos aproxima de certas feições intelectuais do jovem  
estudante alemão.  
Ele afirma que a parte referente à Metaphysik des Rechts ele a fez “como na  
obra de Fichte”, mas, no seu caso, “de modo mais moderno e com menos conteúdo”.  
Essa avaliação de Marx é interessante ao esclarecer que nosso autor sempre procurou  
estabelecer uma relação mediata com o pensamento de outros filósofos, ainda que se  
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nutrindo deles. Sobre a segunda parte, sua Rechtsphilosophie, Marx avalia como um  
equívoco a separação entre forma e conteúdo, “um erro partilhado com o sr. Savigny,  
como descobri mais tarde em sua erudita obra sobre a posse”. Marx somente leu Das  
Recht des Besitzes (1804) do jurista da Escola Histórica do Direito algum tempo  
depois da sua tentativa de conjugar filosofia e direito, o que resultou naquela obra de  
quase 300 folhas. Além de Fichte e Savigny, Marx revela que “na conclusão do direito  
privado material, vi que o todo estava errado, - em seu fundamento, aproximava-se de  
Kant; na execução, divergia completamente dele” (MARX, 2018a, 429). E mais adiante,  
Marx revela que seu pensamento havia sido “comparado e nutrido com ideias kantiana  
e fichtiana” (MARX, 2018a, p. 430). Como afirmamos anteriormente, comparar-se a  
certas ideias e nutrir-se delas não impediram Marx de procurar formar sua própria  
fisionomia intelectual, seja fazendo “de modo mais moderno e com menos conteúdo”  
que Fichte, seja divergindo de Kant na execução da obra. Contudo, o fato de boa parte  
dos seus escritos dessa época terem se perdido, em especial o seu trabalho de quase  
300 folhas, limita o trabalho de análise e reconstituição dessa fisionomia intelectual.  
A partir disso, puxemos um pouco o fio da meada e veremos o quanto conseguimos  
desenrolar o novelo confuso, sem “forma ou conteúdo”, como dissera seu pai, que é  
essa carta.  
Então, comecemos o desenrolo por Fichte, figura destacada do idealismo  
alemão, que exerceu grande força de atração em várias parcelas da intelectualidade  
alemã do Vormärz e que foi o primeiro reitor eleito da Universidade de Berlim. A  
medida da importância de Fichte pode ser bem compreendida quando se conhece o  
lugar ocupado por ele, segundo uma das principais figuras intelectuais da Alemanha,  
Friedrich Schlegel. Em 1798, nos Fragmentos do Athenaeum, escreveu Schlegel: “A  
Revolução Francesa, a Doutrina da ciência, de Fichte, e o Meister, de Goethe, são as  
grandes tendências de nossa época” (SCHLEGEL, 1987, p. 60). Não é de se estranhar  
que o jovem estudante tenha buscado em Fichte as bases para seu empreendimento  
malsucedido. Diante do que escreveu Marx na Carta ao pai, que seu idealismo à época  
tinha sido alimentado por Kant e Fichte, e da impossibilidade material de acessar essa  
obra que se perdeu na qual pretendia unir filosofia e direito naquilo que ele mesmo  
chamou de “desenvolvimento filosófico do direito”, podemos, no máximo, sem incorrer  
em imputação, suspeitar que nessa obra perdida haveria similaridades com  
Fundamento do direito natural segundo os princípios da doutrina da ciência (cf.  
FICHTE, 2012), de Fichte, publicada entre 1796 e 1797, e com A metafisica dos  
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costumes (cf. KANT, 2013), escrita por Kant de quem Marx também revela ter se  
nutrido e se comparado –, cuja primeira parte, chamada “Princípios metafísicos da  
doutrina do direito”, havia sido publicado no mesmo período da obra fichtiana.  
Antes de prosseguir, cabe destacar que o debate sobre o direito natural  
predominava entre as principais publicações da época, fins do século XVIII e início do  
XIX, e sob forte influência da filosofia kantiana. Conforme José Lamego:  
à altura, a publicação de ensaios sobre o direito natural no espírito da  
filosofia crítica era abundante. Só em 1795, ano em que Fichte realiza  
as investigações que irão culminar na publicação de Fundamento do  
direito natural, são publicados na revista Philosophisches journal einer  
Gesellschaft Teutscher Gelehrten, de que Fichte era coeditor, entre  
outros, os seguintes ensaios: Johann Paul Anselm Feuerbach (1755-  
1833), “Yersuch über den Begriff des Rechts”; Salomon Maimon  
(1754-1800), “Ueber die ersten Gründen des Narurrechts”; Johann  
Benjamin Erhard (1 766-1827), “Ueber das Rechts des Yolks zu einer  
Revolution” e “Beitrage zur Theorie der Gesetzgebung”. Também o  
grande divulgador da filosofia de Kant e antecessor de Fichte em Jena,  
Karl Leonhard Reinhold (1758- 1823), dá à estampa, em 1797,  
“Aphorismen über das aussere Recht überhaupt und insbesondere das  
Staatsrecht” (LAMEGO, 2012, p. VII).  
Da lista supracitada, destaca-se Johann Paul Anselm Feuerbach, de quem Marx  
afirma ter lido, naquele ano, a obra de direito criminal, escrita em conjunto com Karl  
Grolman. Mas o quadro apresentado por Lamego pode perfeitamente ser completado  
com outras duas grandes publicações, referimo-nos a Nova dedução do direito natural,  
de Schelling (2019), obra escrita na forma de aforismas e que aparece logo após a  
publicação da primeira parte do livro de Fichte, em 1796. Schelling, nesse livro, se  
encontra “próximo das teses de Fichte sobre o modo como o ‘Eu’ é condicionado pela  
atividade de autoposição de outros sujeitos e sobre a dedução transcendental da  
‘relação jurídica’”. Lyra Filho chega mesmo a tentar uma aproximação entre Marx e  
Schelling a partir da Nova dedução, no entanto, tudo ao modo do lyrismo, pouca prova  
e muita imputação16. É verdade que na carta de 1837, o jovem Marx chega a citar  
Schelling, entretanto, sem nos oferecer maiores detalhamentos, pois apenas diz ter  
estudado, de certo modo, “ciências naturais, Schelling e história” para escrever “um  
diálogo de 24 folhas: Cleantes ou Do início e da necessária continuação da filosofia”,  
mais um trabalho que não nos chegou, provavelmente, devido à fúria flamejante do  
16 Escreve Lyra Filho: “Cotejando-se a Neue Deduktion com as ideias jurídicas marxianas seria possível,  
inclusive, esclarecer melhor, à luz um dos seus antecedentes mais importantes (porém, não  
mencionados), o sentido e alcance de elementos da própria obra marxiana, em termos de liberdade e  
necessidade, direitos originários, contradições entre a liberdade individual e a ‘vontade geral’, separação  
entre direito e legalidade, Direito de resistência e assim por diante” (1983, p. 46).  
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nosso autor. Por fim, podemos incluir, finalizando esse esforço do idealismo alemão  
de dar conta do direito natural, a obra seminal de Hegel (2022), Linhas fundamentais  
da filosofia do direito: direito natural e ciência do estado no seu traçado fundamental,  
de 1820, última obra escrita e publicada pelo autor.  
O tratamento hegeliano do direito, como delineiam Lefebvre e Macherey  
(1999), em um esforço de síntese bibliográfica, começa ainda no fim do século XVIII,  
em Tübingen (1788-1793), quando reagiu de modo apaixonado à Revolução Francesa,  
interesse que continuou vivo no período de Berna (1793-96) e Frankfurt (1796-1800),  
interesse documentado nos escritos sobre a constituição alemã. No entanto, esse  
esforço intelectual alcança mais solidez no período de Jena (1800-1807), nos seus  
primeiros anos como professor, afinal, data desses anos as elaborações iniciais do  
conceito de Sittlichkeit. Em 1803, Hegel publicou um texto inteiramente dedicado à  
discussão do direito natural, além do manuscrito System der Sittlichkeit, publicado  
postumamente; ainda é do período de Jena a Fenomenologia do Espírito, publicada  
em 1807, na qual o direito foi tematizado no seu capítulo 6. Do período de Nüremberg  
(1808-1816) e de Heidelberg (1817-18), datam a sua Ciência da Lógica (1812-16) e  
a Enciclopédia das ciências filosóficas (1817), respectivamente, então, o direito passa  
a ter lugar no sistema hegeliano, ocupando a terceira parte, a qual trata do “Espírito  
objetivo”. Há nítida evolução do grau de importância do espírito objetivo na obra  
hegeliana, consequentemente, também, do direito. Conforme mostra Konzen, são 53  
parágrafos na 1ª edição da Enciclopédia, 70 na 2ª e 3ª edições, saltando para 360  
parágrafos na Filosofia do direito, obra escrita no período em que lecionou na  
Universidade de Berlim (1818-31), onde acabou, literalmente, fazendo escola. Marx,  
como é bem conhecido, matriculou-se em dois cursos, Direito criminal e Direito  
fundiário na Prússia, entre 1837 e 1838, ambos ministrados por aquele que foi um  
dos principais alunos de Hegel, Eduard Gans. Este último chegou a ministrar ao tempo  
de Hegel, em substituição deste, o curso de filosofia do direito entre 1825 e 1831,  
usando como texto base a Filosofia do direito.  
É, pois, no interior desse quadro geral, sucintamente descrito acima, cujos  
quatro vértices foram Kant, Fichte, Schelling e Hegel, referidos nominalmente, não por  
acaso, na carta de 1837, que Marx, esboçando suas primeiras posições mais nítidas  
frente ao direito, na verdade, se insere no debate alemão e firma sua adesão ao  
pensamento de Hegel. Quando Marx escreve a Carta ao pai, nosso autor já está munido  
do pensamento de Hegel e da crítica desse último a Kant e Fichte. É importante  
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O caminho de Marx para Hegel: a busca do conceito e a crítica do existente  
considerar que a Carta ao pai é um escrito retrospectivo, portanto, quando a escreve,  
nosso autor já fala como um hegeliano.  
Como “vigoroso andarilho”, Marx abriu caminho até Hegel pelas veredas do  
idealismo de Kant e Fichte, sobretudo, pois Schelling, o jovem disse apenas que leu  
como parte dos estudos preparatórios para seu “diálogo de aproximadamente 24  
folhas”. Sinalizando sua chegado a Hegel, Marx afirma, ainda comentando o projeto  
do diálogo, “minha última frase era o início do sistema hegeliano”, sistema que guiará  
os próximos passos de sua caminhada até a próxima inflexão radical ocorrida em 1843,  
quando a crítica ao pensamento de Hegel ocupou sua atenção.  
No momento em que escreve a Carta ao pai, isto é, quando já havia aportado  
na filosofia hegeliana, com a qual encontrou sua nova direção, e procurava explicar a  
antiga posição, rejeitada, de um idealista alimentado por Kant e Fichte, Marx adota  
tom bastante crítico ao idealismo, ou ao então chamado idealismo17.  
A autocrítica do seu trabalho de quase 300 folhas, que ele dividiu em duas  
partes, metafísica do direito e filosofia do direito, dirige-se à emergência  
“perturbadora” da “mesma oposição entre a realidade efetiva [das Wirkliche] e o  
devendo-ser [das Sollende] que é própria ao idealismo” 18, oposição que gerou a  
aludida divisão explicitada acima, a qual Marx avaliou, retrospectivamente, como  
“inadequada e errônea” (MARX, 2018a, p. 426). Tal qual na obra de Fichte, a dedução  
do direito estava apartada “de todo direito efetivo e de cada forma efetiva do direito”  
na parte relativa à metafísica do direito. E a carta segue mostrando que ao final de  
1837 o que interessava a Marx na filosofia era sua capacidade de compreender o  
verdadeiro de maneira imanente, mas isso somente é possível se o “sujeito” não se  
contenta com o “passe[ar] ao redor da coisa, raciocina[ndo] para lá e para cá”, portanto,  
17  
Algo que o leitor contemporâneo pode estranhar é o fato de Hegel não ser tratado como parte do  
idealismo, pois, como explica Michael Heinrich (2018, p. 187), “Igualmente problemática é a  
classificação feita até hoje com a maior naturalidade de Hegel como representante do ‘idealismo  
alemão’. O próprio Hegel, assim como seus contemporâneos, ficaria bastante surpreso com ela. No  
verbete ‘idealismo’ de uma enciclopédia de 1840, as teorias de Johann Gottlieb Fichte são classificadas  
como parte do idealismo filosófico, uma vez que ele interpretava o mundo exterior contraposto ao ‘Eu’  
(o ‘não-Eu’) como uma posição [Setzung: o ato de pôr] do ‘Eu’ (sendo que o ‘Eu’ não é um Eu individual,  
mas, antes, a capacidade de raciocínio inerente a cada indivíduo, por isso a posição do ‘não-Eu’  
tampouco é uma posição individualmente arbitrária). No entanto, o sistema de Hegel foi explicitamente  
excluído do idealismo. O mesmo argumento se encontra na enciclopédia de Wigand, publicada em  
1848.”  
18  
Como Marx não utilizou o infinitivo do verbo Sollen, cuja tradução consagrada é dever-ser, mas  
Sollenden, uso incomum, mas que aparece algumas poucas vezes na Filosofia do direito, de Hegel,  
sempre acompanhado do sein, optamos, como traduzir, também, é escolher, por verter Sollenden por  
devendo-ser, seguindo a tradução de Marcos Lutz Müller da obra hegeliana.  
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sem permitir que a “coisa em si tome forma, vívida, num rico desdobrar-se”, e isso, diz  
Marx, é “a forma não científica do dogmatismo matemático” (MARX, 2018a, p. 427),  
no qual recai o então chamado idealismo.  
Para Barata-Moura, a acusação de dogmatismo matemático19 que o jovem Marx  
faz ao idealismo, e esse como forma de não ciência, poderia ser bem compreendido à  
luz da crítica hegeliana à “importação dos procedimentos construtivo-demonstrativos  
da matemática para o domínio da filosofia, enquanto metodologia de validade  
universal” (BARATA-MOURA, 1994, p. 32). O máximo que se pode dizer é que é  
provável, pois a carta em si não fornece material probatório suficiente para qualquer  
afirmação de certeza. Mas frente à semelhança das posições de Marx e Hegel e da  
adesão explícita do primeiro à filosofia hegeliana, a qual leu do começo ao fim,  
segundo ele próprio afirma na Carta ao pai, a aproximação ganha bastante força. A  
crítica de Marx ao idealismo e seu resultado dogmático, na passagem da carta, faz, no  
mínimo, recordar certo trecho da Fenomenologia do espírito dizemos faz recordar  
justamente por compreender que o estatuto de uma carta não é o mesmo de um texto  
teórico, assim como os rascunhos de um autor não são o mesmo que sua obra teórica  
publicada. Dito isso, na obra hegeliana se lê que:  
O dogmatismo - esse modo de pensar no saber e no estudo da  
filosofia - não é outra coisa senão a opinião de que o verdadeiro  
consiste numa proposição que é um resultado fixo, ou ainda, que é  
imediatamente conhecida. A questões como estas - Quando nasceu  
César? Que estádio era e quanto media? - deve-se dar uma resposta  
nítida. Do mesmo modo, é rigorosamente verdadeiro que no triângulo  
retângulo o quadrado da hipotenusa é igual à soma dos quadrados  
dos catetos. Mas a natureza de uma tal verdade (como a chamam) é  
diferente da natureza das verdades filosóficas. (HEGEL, 2003, p. 49)  
Após referir o dogmatismo matemático como “entrave à compreensão do  
verdadeiro”, o jovem Marx recorre justamente ao exemplo do triângulo20:  
O triângulo permite que o matemático construa e demonstre; ele  
19  
Marx, mesmo depois de passadas décadas, nunca se satisfez com a prova matemática, pois em O  
capital, Livro III, encontramos o seguinte trecho: “Aqui é válido o que diz Hegel com referência a certas  
fórmulas matemáticas, a saber, que aquilo que o senso comum considera irracional é racional, e o que  
ele considera racional é a própria irracionalidade” (MARX, 2017, p. 839).  
20  
Barata-Moura defende que a alusão de Marx ao triângulo teria relação com certa crítica do jovem  
alemão a Savigny, “ora, Friedrich Carl von Savigny, num dos seus textos programáticos de maior  
impacto, em 1814, havia precisamente reivindicado para a ciência jurídica que professava a dignidade  
e o modo de proceder das ‘matemáticas’, chegando mesmo para o efeito a evocar a imagem do  
‘triângulo’” (1994, p. 33). Embora não seja um nenhum disparate considerar que a crítica de Marx  
alcance o autor da Escola Histórica do Direito, como resta comprovado nesta tese, a alusão ao triângulo  
e à matemática parece se ligar inteiramente à sua leitura de Hegel e, portanto, à crítica mais geral do  
idealismo.  
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continua sendo mera representação [Vorstellung] no espaço, não se  
desenvolvendo, não se tornando nada mais. É preciso colocá-lo ao  
lado de outra coisa, assim ele assume outras funções, e essa diferença  
igualada lhe dá diferentes relações e verdades. (MARX, 2018a, 427)  
Eis que a construção e demonstração típicas do matemático não passam de  
“mera representação”, isto é, um momento que mais concerne ao sujeito que “passeia  
ao redor da coisa, raciocina para lá e para cá”, momento externo à coisa, “não é em si  
mesmo o ser” (HEGEL, 1992, p. 72). Já Marx diz que a coisa mesma não tomou “forma,  
vívida, num rico desdobra-se”. Para Hegel:  
Quanto às verdades matemáticas, ainda seria menos tido como um  
geômetra quem soubesse os teoremas de Euclides exteriormente, sem  
conhecer suas demonstrações (ou conhecer interiormente, para  
exprimir-se por contraste). Também não seria considerado satisfatório  
o conhecimento da relação bem conhecida entre os lados do triângulo  
retângulo, se fosse adquirido medindo muitos triângulos retângulos.  
Mas a essencialidade da demonstração não tem ainda, mesmo no  
conhecimento matemático, a significação e a natureza de ser um  
momento do resultado mesmo; ao contrário, no resultado da  
demonstração some e desvanece. Sem dúvida, como resultado, o  
teorema é reconhecido como um teorema verdadeiro. Mas essa  
circunstância, que se acrescentou depois, não concerne ao seu  
conteúdo, mas só a relação para com o sujeito. O movimento da prova  
matemática não pertence àquilo que é objeto, mas é um agir exterior  
à Coisa. Assim não é a natureza do triângulo retângulo que se  
decompõe tal como é representada na construção necessária à  
demonstração do teorema que exprime sua relação; todo o [processo  
de] produzir o resultado é um caminho e um meio do conhecimento.  
(HEGEL, 2003, pp. 49-50)  
O trecho da missiva de Marx faz lembrar a escritura hegeliana, segundo a qual  
“no conhecer matemático, a intelecção é para a Coisa um agir exterior; segue-se daí  
que a verdadeira Coisa é por ele alterada”. O passear ao redor da coisa, na citação de  
Marx, parece ser nada menos que “o movimento do saber [matemático] [que] passa  
por sobre a superfície, não toca a Coisa mesma, não toca a essência ou o conceito”  
(HEGEL, 2003, p. 51). Não há movimento no conhecer matemático, pois, ao vívido  
desdobrar-se da coisa, que é o almejado pelo saber filosófico, contrapõe-se um  
resultado “vazio e morto, no qual as diferenças são igualmente imóveis e sem vida”  
(HEGEL, 2003, p. 51). Por isso, diz Hegel, “com efeito o morto, porque não se move,  
não chega à diferença da essência nem à oposição essencial ou desigualdade e,  
portanto, à passagem do oposto no oposto -, nem à passagem qualitativa, imanente;  
e nem ao automovimento” (HEGEL, 2003, p. 52). É possível que certa apreensão do  
pensamento hegeliano tenha levado Marx a concluir que:  
na expressão concreta do vívido mundo dos pensamentos como são  
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o direito, a natureza e toda a filosofia , deve-se observar o próprio  
objeto em seu desenvolvimento; divisões arbitrárias não se encaixam  
aqui. A razão da própria coisa tem de encontrar sua unidade em si,  
como um desdobrar-se conflituoso (MARX, 2018a, p. 427).  
Aqui, é possível estabelecer certa relação com a posição hegeliana quanto aos  
limites das “regras do conhecimento do entendimento”, insuficientes no seu “definir”,  
“dividir” e “concluir”. Marx, na Carta ao pai, reconhece que teria incorrido neste erro,  
por isso, a sua autocrítica. O que pode ser apreendido, também, como resolução do  
modo pelo qual Marx passaria a encarar o direito nos próximos anos, como a busca  
do Conceito, portanto, do direito racional, aquele que encontrou “sua unidade em si”,  
por isso, digno de tal nome21. Marx identificou no idealismo e na oposição que lhe é  
característica entre o real e o dever-ser uma barreira “à compreensão do verdadeiro”,  
o que resulta numa crítica ao modo pelo qual o Naturrecht havia sido apropriado pelo  
idealismo alemão, na filosofia prática de Kant, isto é, fora do âmbito do conhecimento  
científico; e em Fichte, embora no âmbito da filosofia teórica, o direito é deduzido fora  
do âmbito prático e, depois, analisada a sua aplicação. Apesar das diferenças, tanto  
Kant quanto Fichte incorrem na oposição que impede a “compreensão do verdadeiro”,  
portanto, do verdadeiro direito. Nesse sentido, é importante perceber a inflexão que  
Hegel representa no tratamento do direito natural, como destaca Marcos Lutz Müller,  
acerca da Filosofia do direito:  
Esta nova designação [ciência filosófica do direito, ou filosofia do direito],  
substituindo a denominação clássica de ‘direito natural’, causou estranheza  
à época, pois tanto a filosofia política antiga quanto o direito natural  
moderno tratavam o direito no âmbito da questão sobre a melhor  
constituição, isto é, do Estado concebido classicamente como sociedade  
civil [bürgerliche Gesellschaft]. Hegel rompe com esta identidade entre  
Estado e sociedade civil, que remonta a Aristóteles e ainda está presente  
em Kant, estabelecendo a sua diferença conceitual precisa, o que constitui  
uma das teses mais inovadoras da sua filosofia política. (MÜLLER, 2022,  
p. 8)  
Segundo aponta Tertulian, “foi Hegel quem quebrou o círculo de ferro dentro  
do qual Kant havia encerrado a razão e que aboliu o muro entre o mundo fenomenal  
e o mundo numeral, dinamizando as categorias”, e mais, também foi “o autor da  
Fenomenologia do espírito [quem] abriu o caminho ao substrato e à própria matéria  
21  
Aqui, embora reste bastante restringida nossa possibilidade de analisar o que de fato Marx havia  
realizado nas produções comentadas na carta ao pai, afinal, nosso autor se desfez desse material,  
podemos dizer que suas intenções manifestadas na missiva são compatíveis com a filosofia hegeliana,  
a qual toma o Conceito como distinto da Intuição e da Representação. O Conceito se distingue da  
Representação pelo fato de não ser algo que se confunde com uma reflexão dos objetos.  
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O caminho de Marx para Hegel: a busca do conceito e a crítica do existente  
dos processos” (2005, p. 33). Marx percorria o caminho da filosofia alemã, indo de  
Kant a Hegel.  
A mudança designar como filosofia do direito a busca do conceito do direito  
e não mais como direito natural já havia sido preparada por Hegel na sua  
Enciclopédia das ciências filosóficas. Hegel escreveu, no único trecho em que aparece  
a expressão direito natural, que:  
A expressão “direito natural”, que foi corrente para a filosofia do  
direito, encerra a ambiguidade [seguinte]: se é o direito enquanto  
presente no modo natural imediato, ou se ele é visado tal como se  
determina pela natureza da Coisa, isto é, pelo conceito. O primeiro  
sentido era o visado ordinariamente outrora, de modo que se  
imaginou, ao mesmo tempo, um estado de natureza em que devia  
vigorar o direito natural, é oposto a ele, o estado da sociedade e do  
estado que antes exigiria e traria consigo uma limitação da  
liberdade e um sacrifício de direitos naturais. Mas, de fato, o direito e  
todas as suas determinações se fundam unicamente na personalidade  
livre, em uma autodeterminação que é antes o contrário da  
determinação-de-natureza. Por isso, o direito da natureza é o ser-aí  
da força, e o fazer-valer da violência, e um estado-de-natureza é um  
ser-aí da força-bruta e do não-direito, do qual nada melhor se pôde  
dizer senão que preciso sair dele. Ao contrário, a sociedade é antes o  
estado em que somente o direito tem sua efetividade: o que se tem  
de sacrificar é justam ente o arbítrio e a força-bruta do estado de  
natureza. (HEGEL, 1992, p. 112)  
Por isso, qualquer alusão a certo jusnaturalismo em Marx precisa levar em conta  
essa mudança promovida por Hegel e a adesão de Marx ao pensamento hegeliano.  
Nesse momento, a solução, a “nova direção”, passa por Hegel, como é explicitado na  
Carta ao pai, afinal, o pensamento hegeliano é a solução encontrada por nosso autor  
ao problema da oposição entre a efetividade e o deveria ser. Solução que passa pela  
busca do Conceito. A crítica de Hegel ao Sollen, a qual Marx parece seguir na missiva  
de 1837, passa justamente pela compreensão de que o critério para julgar o mundo  
é encontrado no próprio mundo e não fora dele. A tarefa do filósofo é descobrir, no  
mundo, a razão no interior deste mesmo mundo.  
Marx chegou na carta de 1837 ao diagnóstico que havia margeado, segundo  
ele, na sua metafísica do direito, o direito efetivo e cada forma efetiva do direito devido  
àquela oposição problemática entre o mundo e o que ele deveria ser, e que, na  
verdade, o direito é “um mundo de pensamentos vivos”, isto é, que se movem, diria  
Hegel, em passagem já citada aqui, “o morto, porque não se move, não chega à  
diferença da essência nem à oposição essencial ou desigualdade”, e, por que é vivo,  
necessita que o sujeito se detenha a “escutar atentamente o próprio objeto em seu  
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desenvolvimento, sem se empenhar em imputar-lhe classificações arbitrárias, e sim  
deixando que o própria razão da coisa siga seu curso contraditório e encontre em si  
mesma a sua própria unidade” (MARX; ENGELS, 1975b, p. 11, tradução nossa), e sobre  
isso, mais uma vez diria Hegel, eis a passagem “do oposto no oposto”, ou o direito  
tem de ser investigado no seu automovimento e na sua imanência.  
Não foi esse o caminho que ele percorreu naquele seu malbaratado projeto  
acadêmico de 300 folhas, pois somente na segunda parte ele teria tratado “em geral  
de algo real” ao passo que o “conceito de direito” ocupava “toda a primeira parte”.  
Nessa segunda parte, chamada por ele de filosofia do direito, a sua pretensão era  
tratar do “desenvolvimento do pensamento no Direito Positivo romano (não me refiro  
às suas normas puramente finitas)” (MARX; ENGELS, 1975b, p. 11, tradução nossa) e,  
para tanto, pensou na divisão em duas partes, teoria do direito formal e material, o  
que resultou noutra divisão malsucedida, justamente devido à separação entre forma  
e conteúdo, escreve Marx:  
[…] eu dividira a primeira parte em Teoria do Direito Formal e do  
Direito Material: uma procurava descrever a forma pura do sistema em  
seu desenvolvimento e em sua estrutura, a outra ao contrário –  
tentava expor o conteúdo e a condensação, nele, da forma. Um erro  
que compartilho com o sr. Savigny, como mais tarde descobri em sua  
erudita obra sobre a propriedade, ainda que com a diferença […] para  
mim, a forma é a arquitetura necessária das estruturações do conceito  
e a matéria é a qualidade necessária destas estruturações (MARX;  
ENGELS, 1975b, p. 11, tradução nossa).  
Antes de prosseguir, dois apontamentos nos importam: Marx já no final de  
1837 é crítico de Savigny, aspecto que se acentua ao longo do seu itinerário intelectual  
(cf. PEREIRA NETO, 2018). Outro ponto a se notar é que mesmo quando Marx  
reconhece ter compartilhado com Savigny um erro, que descobriu somente meses  
depois ao ler a obra deste sobre a posse, nosso autor não deixa de apontar a diferença  
entre ele e aquele que foi seu professor. Nesse aspecto, é difícil compreender Hasso  
Jaeger quando escreve que:  
Marx manifesta um gosto especificamente savignyano pelos direitos  
antigos, e mesmo arcaicos, buscando expor as origens primordiais da  
propriedade, suas raízes, sua pré-história... sem perder de vista a  
Germânia de Tácito como fez Savigny em sua história acerca dos  
fundamentos jurídicos da nobreza alemã. (JAEGER, 1967, p. 66,  
tradução nossa)  
E o erro, falo-nos o Marx que acabou de ingressar na filosofia hegeliana, embora  
nunca tenha subsumido seu pensamento ao mestre, com quem mantinha relação  
mediata, refletida, como veremos nas próximas páginas: “O erro foi acreditar que um  
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O caminho de Marx para Hegel: a busca do conceito e a crítica do existente  
poderia e deveria desenvolver-se separadamente do outro”, no caso, forma e  
conteúdo, “não contendo, assim”, ao final, “uma forma efetiva, mas, antes, algo como  
uma escrivaninha com gavetas que eu, mais tarde, enchi de areia”, metáfora que  
constata a completa separação entre a forma e o seu conteúdo (MARX; ENGELS,  
1975b, p. 11, tradução nossa). A concepção que melhor explica a nova direção tomada  
pelo nosso jovem autor é aquela contida uma vez mais na obra hegeliana, afinal, Hegel  
defende que “na ciência o conteúdo está essencialmente ligado à forma” (HEGEL,  
2022, p. 122), noção amplamente desenvolvida por Hegel na sua Lógica.  
Puxando um pouco mais esse fio, Marx aprofunda a dicção hegeliana da carta  
ao escrever que “o nexo mediador entre a forma e o conteúdo é, precisamente, o  
conceito”, portanto, enquanto recrimina aquilo que é mera representação na filosofia,  
Marx resolve que a saída verdadeiramente científica, nas pegadas de Hegel, é a procura  
do conceito, isto é, “a verdade só no conceito tem o elemento de sua existência”  
(HEGEL, 2003, p. 28), em oposição a certa filosofia que apela para a intuição e o  
sentimento. A nova direção de Marx segue a partir de então “o princípio central da [...]  
lógica especulativa” hegeliana, qual seja, “a unidade inseparável e essencial da forma  
e do conteúdo” (MÜLLER, 2022, p. 146), princípio anunciado no início do prefácio da  
Filosofia do direito e que é retomado ao final do mesmo prefácio, agora, tendo como  
elo o “conhecer conceitualizante”, pois assim escreve Hegel:  
isso é também o que constitui o sentido concreto do que acima foi  
mais concretamente designado como unidade da forma e do  
conteúdo, pois a forma na sua significação mais concreta é a razão  
enquanto conhecer conceitualizante, e o conteúdo é a razão enquanto  
essência substancial da efetividade tanto ética como natural. A  
identidade consciente de ambas é a ideia filosófica (HEGEL, 2022, p.  
146).  
Não é, portanto, de se estranhar que Marx em seguida afirme que “em um  
desenvolvimento filosófico do direito, um tem que brotar do outro; mais ainda, a forma  
não pode ser mais que o desenvolvimento do conteúdo” (MARX; ENGELS, 1975b, p.  
11, tradução e destaque nosso); e outra vez, a dicção hegeliana é notável, afinal, não  
é o próprio Hegel que inicia sua Filosofia do direito, já no §1, afirmando que “a ciência  
filosófica do direito tem por objeto a ideia do direito, o conceito do direito e a sua  
efetivação” (HEGEL, 2022, p. 149). Segundo Müller, Eduard Gans nas suas preleções  
sobre a Filosofia do direito, após a morte de Hegel, destacava “a ruptura da obra com  
o direito natural” (MÜLLER, 2022, p. 19), a começar, como destacado acima, pela  
modificação da designação, de direito natural para filosofia do direito.  
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Procurando compreender melhor as feições intelectuais do jovem Marx no final  
de 1837, a explicação de Müller ao caput do §1 da Filosofia do direito, citado linhas  
atrás, pode nos ajudar nessa tarefa. Segundo Müller, o escrito na cabeça do §1:  
não só condensa a tese fundamental do idealismo especulativo, como  
também preside a toda a apresentação do sistema enciclopédico e,  
por inclusão, da ciência do direito. Com efeito, basta eliminar do  
enunciado a especificação do conceito de direito para obter-se a tese  
fundamental da dialética especulativa e de seu “método”, que tem na  
ciência da lógica a sua justificação. “A ciência filosófica [...] tem por  
objeto a ideia [...], isto é, o conceito [...] e a sua efetividade”. Essa  
efetivação do conceito, que é ao mesmo tempo o processo de sua  
determinação progressiva, alcança precisamente na ideia a sua  
completude sistemática, a qual, em contrapartida, se põe, então, no  
procedimento “retrocedente” ou “regressivo” da “apresentação”  
[Darstellung], como o fundamento e o sujeito desse processo.  
Transposta para âmbito da “ciência filosófica do direito”, a tese diz  
que esta não é senão a apresentação do processo de efetivação do  
conceito de direito, concebido num sentido extremamente abrangente  
como objetivação do conceito de vontade livre por isso, coextensivo  
à esfera do espírito objetivo em direção à sua determinação plena  
enquanto “ideia do Estado” e à sua suspensão no “espírito universal  
do mundo” (§§33, 340), que se constitui através da história universal  
(MÜLLER, 2022, p. 150).  
A partir disso, podemos apreender melhor os motivos pelos quais o jovem  
estudante avalia retrospectivamente e em dicção hegeliana que no seu projeto “o  
espírito do direito e sua verdade desapareceram”, e o erro se situa lá no início, naquela  
oposição entre o Wirkliche e o Sollende, “própria ao idealismo” de Kant e Fichte, os  
filósofos que nutriram o idealismo do jovem acadêmico de direito.  
Apenas para que não se deixe passar nada, ao final desses esforços  
malsucedidos, Marx conta ao pai: “isto me permitiu, ao menos de certa maneira,  
apaixonar-me pela matéria e abarcá-la com um olhar panorâmico” (MARX; ENGELS,  
1975b, p. 15, tradução nossa). Essa declaração desbanca mais uma vez a tese  
psicológica de Lyra Filho, como se fosse necessário mais provas do equivocado  
lyrismo. Marx diz ao pai que “na conclusão do direito privado material, vi que o todo  
estava errado em seu fundamento, aproximava-se de Kant”, embora, “na execução,  
divergia completamente dele”, assim, ficava claro que “sem filosofia, não seria possível  
aprofundar o tema”. E, tudo voltou a se repetir, pois tornou a insistir em “escrever um  
novo sistema metafísico”, sobre o qual é impossível tecer maiores comentários, tendo  
em vista que apenas sabemos da sua existência pela menção feita na carta.  
Desafortunadamente, essa nova tentativa o obrigou “a admitir que tanto o sistema  
quanto minhas tentativas anteriores estavam errados” (MARX, 2018a, p. 429), desse  
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O caminho de Marx para Hegel: a busca do conceito e a crítica do existente  
modo, depois de muita luta e resistência, teve que abandonar aquele idealismo de  
Kant e Fichte, procurando uma nova direção, agora, radicalmente diversa da anterior,  
“uma cortina havia caído, tudo o que me era mais sagrado foi despedaçado, e novos  
deuses tinham de ser encontrados” (MARX, 2018a, p. 429). O dito e descrito aqui foi  
explicitado pelo próprio autor ao pai, quando aquele forneceu as coordenadas da sua  
caminhada até Hegel: “A partir do idealismo – comparado e nutrido com ideias  
kantianas e fichtianas, diga-se de passagem , resolvi procurar a ideia na própria  
realidade efetiva. Antes, os deuses moravam acima da Terra; agora, tornaram-se o  
centro dela.” (MARX, 2018a, p. 430) Nessa anunciação da nova direção, volta a  
aparecer a tonalidade hegeliana que marca tão profundamente a Carta ao pai. E para  
provar, muitas passagens de Hegel poderiam ser trazidas à tona, elegemos uma que  
se encontra no prefácio escrito por Hegel à sua Filosofia do direito, na qual esse afirma  
“que a filosofia, porque ela é o perscrutar do racional, é, precisamente por isso, o  
apreender do presente e do efetivo, não o estabelecer de um além” (HEGEL, 2022, p.  
138), por isso “procurar a ideia no própria realidade efetiva” e por isso os deuses não  
moram mais no além, acima da Terra, mas no centro dela. E segue Hegel, explicando  
os motivos de se buscar a ideia naquilo que é efetivo, pois, escreve ele, ainda no  
prefácio, “se, inversamente, a ideia é tida como apenas uma ideia, uma representação  
num opinar, a filosofia, ao contrário, proporciona a intelecção de que nada é efetivo a  
não ser a ideia” (HEGEL, 2022, p. 140), ao que segue Hegel:  
O que importa, então, é conhecer na aparência do temporal e do  
passageiro a substância da ideia, quando na sua efetividade entra ao  
mesmo tempo na existência externa, emerge e sobressai numa riqueza  
infinita de formas, fenômenos e configurações, e envolve seu núcleo  
com a casca colorida em que a consciência inicialmente habita, e que  
só o conceito penetra, a fim de encontrar a pulsação interna e de  
igualmente senti-la ainda batendo nas configurações externas. Mas as  
relações infinitamente variadas que se formam nessa exterioridade  
através do aparecer da essência que nelas brilha, esse material infinito  
e sua organização, não são o objeto da filosofia. (HEGEL, 2022, p.  
140)  
E na sequência, Hegel é explícito ao criticar Fichte, na sua Grundlagen des  
Naturrechts, ao dizer que Fichte poderia ter se abstido “de construir, como se disse, o  
aperfeiçoamento da polícia de passaportes ao ponto de que, no passaporte dos  
suspeitos, devesse não só constar a descrição de seus sinais exteriores, mas também  
que fosse pintado seu retrato” (HEGEL, 2022, p. 141), pois não há filosofia em  
detalhamentos desse tipo. Filosofia não é “ultrassabedoria” nem um “saber-tudo”.  
Assim sendo, Hegel fornece aquela que será a fundamental coordenada a ser seguida  
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por Marx no seu tratamento do estado e do direito até sua ruptura radical com o autor  
da Filosofia do direito:  
Assim, esse tratado [a Filosofia do direito], na medida em que ele  
contém a ciência do Estado, não deve ser outra coisa do que a  
tentativa de conceituar e apresentar o Estado enquanto algo em si  
mesmo racional. Como escrito filosófico, ele deve estar o mais distante  
possível de dever construir um Estado tal como ele deve ser; o  
ensinamento que pode residir nesse tratado não pode pretender  
ensinar ao estado como ele deve ser, porém, antes, como ele, o  
universo ético, deve ser conhecido. (HEGEL, 2022, p. 141)  
Como tratado em outro trabalho dedicado ao período da Gazeta Renana, “a  
recusa ao normativismo abstrato, que constrói ou postula um dever-ser que se situa  
fora e além do presente efetivo” consagrado nesse parágrafo hegeliano é o programa  
das intervenções do jovem Marx no “periódico democrático”, e, como vimos, aqui, a  
adesão a esse programa ocorre em 1837 e se encontra registrado na Carta ao pai,  
quando Marx rejeita aquela oposição característica do idealismo. Como explica Müller,  
“a tarefa da filosofia” em Hegel, e dizemos que isso também se aplica a Marx a partir  
de então, pelos menos até a Gazeta Renana,  
é apreender conceitualmente a racionalidade intrínseca do universo  
ético e do Estado e, na apresentação dessa racionalidade, que é ao  
mesmo tempo uma crítica do apresentado, mostrar os limites das  
figuras historicamente constituídas do estado quando confrontadas  
com essa racionalidade imanente atuante no presente. Sua pretensão  
de ‘ensinar como o estado, o universo ético, deve ser conhecido’ e  
não como ‘ele deve ser’, significa que a filosofia só pode contrapor a  
racionalidade profunda do presente efetivo à realidade faticamente  
existente quando ela assumiu a forma de um ideal (“um reino  
intelectual”), tomando consciência dessa racionalidade profunda que  
excede o presente histórico, “depois que a efetividade completou o  
seu processo de formação” (parágrafo 19) (MÜLLER, 2022, p. 141).  
Na Gazeta Renana, com o perdão da curta digressão, Marx assume tão  
seriamente o programa hegeliano para a filosofia, ao qual ele adere desde a Carta ao  
pai, que suas posições favoráveis ao estado e ao direito racionais e contrárias ao  
estado e ao direito então existentes tem que ser encaradas como posições de alguém  
que se vê naquele momento no qual “a filosofia pinta seu cinza sobre cinza” e “então  
uma figura da vida envelheceu”, no caso, o estado feudal, aristocrático e estamental,  
incapaz de reconhecer outro direito que não seja o da animalidade, “e com cinza sobre  
cinza ela não se deixa rejuvenescer” como era o desejo daqueles que Marx tentou  
combater no período jornalístico, como os conservadores Savigny e Schelling.  
Depois das inúmeras tentativas fracassadas, descritas e analisadas acima, Marx  
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O caminho de Marx para Hegel: a busca do conceito e a crítica do existente  
confessa ao pai que após escrever “um diálogo de umas 24 folhas, intitulado Cleantes,  
ou o ponto de partida e o desenvolvimento necessário da filosofia”, percebeu que  
chegava em Hegel, depois de, como um “vigoroso andarilho”, ter feito uma longa  
caminhada, pois ele “acabava por onde o sistema hegeliano começava”.  
Mas isso não foi fácil de admitir, para tanto, basta recordar a figura que Marx  
fazia de Hegel nos seus escritos ficcionais, cujos últimos são do início de 1837. Diz  
Marx ao pai: “que ainda hoje não posso imaginar como esta obra [Cleantes...], minha  
criatura predileta, engendrada à luz da lua, pôde me jogar, como uma sereia traiçoeira,  
nos braços do inimigo” (MARX; ENGELS, 1975b, p. 16, tradução nossa). Adiante, Marx  
é ainda mais explícito quando diz que foi “consumido pela raiva de ter transformado  
em ídolo uma concepção que eu odiava” (MARX; ENGELS, 1975b, p. 16, tradução  
nossa), antes disso, havia dito ter lido “fragmentos de filosofia hegeliana” e que não o  
agradou sua “grotesca melodia rochosa” (MARX; ENGELS, 1975b, p. 16, tradução  
nossa). Contudo, não teve outra saída, diante do caminho percorrido, senão ingressar  
na “atual filosofia mundana” depois de ler toda a obra de Hegel, o que explica a sua  
rememoração dominada pela dicção hegeliana. Eis passagem anunciadora da sua nova  
direção e, então, o anúncio de sua adesão ao pensamento de Hegel:  
Durante meu mal-estar, conheci Hegel do começo ao fim, bem como  
a maioria de seus alunos. Através de várias reuniões com amigos em  
Stralow, entrei para o clube de doutores, entre os quais havia alguns  
Privatdozenten e meu amigo mais íntimo de Berlim, o Dr. Rutemberg  
aqui, na discussão, muitas visões relutantes se revelaram e eu me  
acorrentei cada vez mais firmemente à filosofia do mundo atual, da  
qual eu pretendia escapar, mas tudo o que era sonoro silenciara, e fui  
tomado por um verdadeiro frenesi de ironia, como facilmente poderia  
acontecer depois de tanta negação. (MARX; ENGELS, 1975b, p. 17,  
tradução nossa)  
A Carta ao pai, embora não possua a estatura de um texto teórico produzido  
para publicação e exposição do pensamento do autor, ilumina o período mais  
incógnito da produção de Marx, sobre o qual nos chegou pouquíssimo material.  
Dela, foi possível apreender, ainda que de modo incerto, que a primeira filiação  
filosófica de Marx foi ao chamado idealismo subjetivo de Kant e Fichte, com o qual  
pretendeu escrever uma obra de filosofia do direito. O seu projeto de filosofia do  
direito esbarrou na oposição, característica desse idealismo, entre ser e dever-ser, pois,  
segundo contou Marx, essa oposição o levou ao formalismo e divisões nas quais o  
direito perdia a sua riqueza como o mundo de pensamento vivos. As diversas  
tentativas de resolver o problema, ainda dentro do idealismo, não resultaram em  
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melhores produtos, o que o levou cada vez mais para perto de Hegel, filósofo que se  
mostrou mais adequado às suas pretensões de procurar a ideia na própria realidade  
efetiva, isto é, imanente ao mundo e não fora dele.  
Quando Marx escreve a Carta ao pai, na primeira quinzena de novembro, o  
percurso rememorado já havia sido realizado, portanto, nosso autor já estava nos  
braços daquele que havia sido seu inimigo, como provam suas produções literárias e  
sua resistência a Hegel assumida pelo próprio autor na carta, além disso, não há  
menções a Hegel, por exemplo, na correspondência do seu pai. Foi, pois, já como  
discípulo de Hegel que o autor alemão escreveu sua carta, por isso, a dicção tão  
marcadamente hegeliana. Como foi possível reter, Marx chega ao final de 1837  
decidido a procurar a ideia na própria realidade efetiva, o que o levará ao  
aprofundamento de suas posições frente à filosofia e a tarefa dessa no mundo.  
O seu programa para a filosofia, como chamamos aqui, será devidamente  
exposto no próximo tópico a partir da análise de sua tese doutoral e dos seus materiais  
preparatórios. Acreditamos que o período acadêmico de Marx é fundamental para bem  
compreender a defesa do estado e do direito racional realizada na Gazeta Renana,  
bem como sua virada crítica no período posterior ao seu desligamento periódico.  
Marx e o programa de crítica ao existente  
Embora Michael Heinrich considere somente a Carta ao pai, com exceção dos  
escritos ficcionais, como produção preservada dos tempos acadêmicos de Marx, neste  
trabalho, encaramos os escritos preparatórios e a tese doutoral como produções  
acadêmicas do autor. Esse material é parte constituinte da sua vida universitária, pois  
marcam a conclusão do período acadêmico e o requisito para o ingresso na carreira  
docente. Já na carta de 28 de dezembro de 1836, seu pai refere a pretensão do filho  
de seguir carreira acadêmica, “devo perguntar-lhe se você sabe quantos anos deve ter  
para ocupar um cargo acadêmico” (MARX; ENGELS, 1975b, p. 303, tradução nossa).  
Mais adiante, em 3 de fevereiro de 1837, seu pai o aconselha quanto à escrita,  
voltando a referir sua carreira acadêmica, agora, ele trata diretamente do posto de  
professor. Nessa mesma carta, ele ainda aponta para certa carreira na imprensa  
periódica, um presságio daquela que será a profissão de toda a vida do filho:  
[...] portanto, a única coisa que resta é escrever. Mas como começar?  
Essa é uma pergunta difícil, mas há outra que a precede: você  
conseguirá ganhar a confiança de um bom editor? Pois isso pode  
muito bem ser a coisa mais difícil. Se você tiver sucesso nisso - e, no  
geral, você é o favorito da fortuna - então surge a segunda questão.  
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O caminho de Marx para Hegel: a busca do conceito e a crítica do existente  
Algo filosófico ou jurídico, ou ambos juntos, parece excelente para  
assentar uma base. A boa poesia pode muito bem ficar em segundo  
plano, e isso nunca prejudica a reputação de alguém, exceto, talvez,  
aos olhos de alguns poucos pedantes. Artigos polêmicos leves são os  
mais úteis, e com alguns bons títulos, se eles são originais e têm um  
novo estilo, você pode decentemente e seguramente aguardar um  
cargo de professor etc. etc. etc. (MARX; ENGELS, 1975b, pp. 305-6,  
tradução nossa).  
Em 16 de setembro de 1837, o assunto é retomado noutra carta paterna. O  
plano de exercer a docência universitária se torna mais concreto e palpável a cada  
carta. Heinrich Marx que aplaudia a decisão do filho de tomar “o ensino acadêmico  
como seu objetivo, seja na Jurisprudência ou na Filosofia”, ainda acrescenta que “o  
último [é] mais provável”; e termina dizendo que “estava suficientemente ciente da  
dificuldade desta carreira”, pois aprendeu “particularmente sobre isso recentemente  
em Bad Ems”, onde, escreve ele, “tive a oportunidade de ver um bom número de  
professores da Universidade de Bonn” (MARX; ENGELS, 1975b, p. 317, tradução  
nossa). Na carta anterior, escrita entre 12 e 14 de agosto de 1837, enviada de Bad  
Ems, onde Heinrich Marx passou o mês de agosto, ele diz acreditar ser muito  
importante que o filho consiga “uma reputação como crítico” (MARX; ENGELS, 1975b,  
p. 312, tradução nossa), pois isso o auxiliaria na carreira docente.  
O assunto não permaneceu restrito à comunicação paterna. Na correspondência  
com Bruno Bauer, e a primeira carta que temos data de dezembro de 1839, embora  
Bauer seja citado pela primeira vez na Carta ao pai de 1837, quando, provavelmente,  
Marx o conheceu. Na correspondência dos amigos, há algumas menções à tese  
doutoral de Marx, sendo possível perceber certa urgência para obter o título de doutor,  
requisito necessário para que nosso autor assumisse o mais rápido possível uma  
cátedra universitária. Na carta de março de 1840, Bauer a termina dizendo: “Ponha  
fim à sua procrastinação e ao seu tratamento hesitante de bobagens e meras farsas,  
como é o exame [doutoral]” (MARX; ENGELS, 1975b, p. 341, tradução nossa). Em outra  
missiva, do final de março daquele mesmo ano, Bruno Bauer é ainda mais enfático e  
explícito com relação ao que seria o plano de Marx:  
Agora, você pode se informar com precisão diplomática sobre os  
trâmites do doutorado. O colóquio é apenas uma formalidade que se  
resolve em um quarto de hora. Portanto, não há mais nada a fazer  
além de fazer o exame em Berlim. Não sei nem se você precisa dizer  
ao corpo docente de Berlim que quer se qualificar como professor,  
para ter que fazer o Exame pro licentia docendi. Não há nenhuma  
menção a isso nos estatutos aqui. Todo doutor tem essa licença. Mas  
você pode dizer a Gabler sua intenção, e ele ficará ainda mais inclinado  
e feliz durante o exame quando ver mais um hegeliano chegando para  
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uma cátedra. O exame, como ouvi de Möller aqui, gira principalmente  
e regularmente em Berlim, em torno de Aristóteles, Spinoza e Leibnitz  
- nada mais. Apenas faça! (MARX; ENGELS, 1975b, p. 342, tradução  
e grifo nosso)  
O trecho supracitado deixa bastante explícita as intenções compartilhadas por  
Marx e reverberadas nas cartas de Bauer: finalizar a tese doutoral e, com isso, habilitar-  
se ao posto de docente universitário, embora Marx já apresente aquela hesitação tão  
própria da sua personalidade intelectual, que o impediu de finalizar diversas obras ao  
longo da vida. Esta carta nos ajuda a compreender a existência dos cadernos de Berlim,  
formado por um conjunto de excertos de Aristóteles, Spinoza, Leibnitz e outros. Ainda  
no trecho acima, percebe-se a autodeclaração de Bauer como hegeliano e a  
incorporação de Marx nesse círculo, algo que será inteiramente explicitado pelo  
próprio autor na sua tese. Bruno Bauer, isso é inegável, foi um grande entusiasta do  
ingresso de Marx na carreira docente, chegando a copiar, em carta de 28 de março de  
1841, trechos inteiros do estatuto de Bonn para a habilitação do amigo como  
Privatdozent (MARX; ENGELS, 1975b, p. 352), cargo inicial no qual o professor deve  
receber o pagamento das turmas, claro, se formasse turma, algo bastante corriqueiro  
na Alemanha daquele tempo, bastando lembrar que Kant foi Privatdozent por um  
longo tempo, quinze anos, precisamente. Desse modo, parece-nos bem justificado que  
a tese e o seu material preparatório, em discordância com o biógrafo Michael Heinrich,  
sejam incluídos no período acadêmico de Marx.  
Eis que, após mostrarmos na análise da Carta ao pai a reviravolta sofrida pelo  
pensamento de Marx, naquela sua “primeira crise intelectual” (HEINRICH, 2018, p. 221)  
que delineou o caminho do autor alemão até Hegel, resultando na crítica do idealismo  
que separa ser e dever-ser e na busca do Conceito na própria realidade, passamos a  
analisar a tese doutoral de Marx e os seu materiais preparatórios, os quais registram  
a adoção de certo programa filosófico que procura a ideia na própria realidade efetiva  
por meio da crítica ao existente, pois o que existe na Alemanha de então se tornou  
velho e anacrônico. Portanto, não corresponde às exigências do tempo.  
Marx, diversamente daquilo que era planejado, conforme se depreende da sua  
correspondência com Bruno Bauer, não apresenta a tese na Universidade de Bonn,  
mas na Universidade de Jena. Em carta de 31 de março de 1841, Bauer escreve a  
Marx: “imagine só, anteontem alguém veio ao meu bar, se anunciou como conhecido  
seu e de Köppen, e quem é? Neur. Aliás, ele já tinha ficado sabendo em Coblenz que  
você ia fazer o doutorado em Jena” (MARX; ENGELS, 1975b, p. 355, tradução nossa).  
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O caminho de Marx para Hegel: a busca do conceito e a crítica do existente  
No dia 12 de abril de 1841, Bauer escreve em tom bastante aflito, possivelmente  
devido à demora de Marx para entregar seu trabalho imortal, como Bauer jocosamente  
se refere à tese. Implora Bauer:  
Dê a ele [Edgar Bauer] o manuscrito de sua obra imortal, deixe-o  
imprimir e revisar e enviar as coisas para Jena para que o diploma  
possa ser enviado a você em Bonn ou Trier, ou Edgar pode recebê-lo  
em Berlim e depois enviá-lo para você onde quer que você queira  
enviar. Você não precisa esperar por essas coisas em Berlim. (MARX;  
ENGELS, 1975b, p. 358, tradução nossa)  
O que Bauer não sabia é que Marx já havia enviado sua tese em 6 de abril  
daquele ano, como prova a carta enviada a Karl Friedrich Bachmann, na qual o jovem  
acadêmico anuncia, para fins de doutoramento, o envio de uma “dissertação sobre a  
diferença entre a filosofia da natureza de Demócrito e Epicuro”, além do texto, como  
anexo, ele “incluiu a litterae petitoriae, o curriculum vitae, [seus] certificados de  
conclusão das universidades de Bonn e Berlim e, finalmente, as taxas estatutárias de  
Friedrichsdors” (MARX; ENGELS, 1975b, p. 19, tradução nossa). Ao final da carta, Marx  
pede urgência na apreciação:  
Ao mesmo tempo, solicito sinceramente que, caso meu trabalho  
satisfaça o corpo docente, a concessão do doutorado seja agilizada o  
mais rápido possível. Por um lado, só posso ficar mais algumas  
semanas em Berlim, por outro lado, as circunstâncias externas tornam  
altamente desejável que eu obtenha um doutorado antes de minha  
partida. (MARX; ENGELS, 1975b, p. 19, tradução nossa)  
É compreensível a urgência sentida na correspondência dos dois amigos e  
discípulos de Hegel. A virada da década de 1830 para a de 1840 é de relutante  
desilusão com o caminho tomado pelo estado prussiano. A euforia que supostamente  
tomou conta da intelectualidade alemã, com a chegada ao trono, em 1840, de  
Friedrich Wilhelm IV, visto por muitos como um esclarecido, sucessor de Friedrich  
Wilhelm III, que faleceu em 6 de junho de 1840, logo passou, e a dura realidade se  
impôs.  
Segundo Michael Heinrich, “num primeiro momento, ele [Friedrich Wilhelm IV]  
também pareceu realizar tais esperanças”, pois Ernst Moritz Arndt, que havia sido  
perseguido, “voltou para a sua cátedra na Universidade de Bonn – ele foi demitido no  
período de ‘perseguição aos demagogos’”, e mais, “os irmãos Grimm, que pertenciam  
aos sete de Göttingen e que haviam perdido suas cátedras, foram convocados à  
Universidade de Berlim”; no início do seu reinado, “graças a uma anistia, muitos presos  
políticos foram liberados”. Acreditou-se “que Friedrich Wilhelm IV por fim introduziria  
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a Constituição prometida no dia 22 de maio de 1815” (HEINRICH, 2018, p. 289). No  
entanto, como destaca o biógrafo de Marx, “já em outubro de 1840, Friedrich Wilhelm  
IV deixou claro que não pretendia trabalhar na criação de uma constituição, tampouco  
de um parlamento prussiano que fosse além dos parlamentos provinciais” (HEINRICH,  
2018, p. 289), as chamadas Dietas, contra as quais Marx tanto lutou nos tempos da  
Gazeta Renana.  
Em 14 de maio de 1840, Altenstein, que era ministro da cultura e considerado  
um dos grandes apoiadores dos hegelianos nas universidades da Prússia, faleceu,  
sendo, então, substituído pelo conservador Eichhorn. Um ano antes, havia falecido  
Eduard Gans, nome importante da chamada ala liberal alemã, e Stahl foi nomeado para  
substituí-lo, “em sua primeira aula, no dia 26 de novembro de 1840”, este último  
“começou atacando com dureza Hegel e Gans; os estudantes reagiram com vaias, e  
houve certo tumulto” (HEINRICH, 2018, p. 289). E com a morte de Gans, Savigny e  
sua escola acabaram por dominar mais facilmente o debate jurídico. Continuando a  
composição conservadora e reacionária do estado prussiano, em 1841, houve a  
convocação de Schelling para Berlim, onde ocupou a cátedra de Hegel e combateu a  
sua filosofia e seus seguidores como parte da missão estatal que lhe foi conferida. Por  
fim, completando o quadro tenebroso no qual Marx concluiu seus estudos acadêmicos,  
com a tese doutoral, e se inseriu, posteriormente, no debate público como redator da  
Gazeta Renana, Savigny, seu professor dos tempos universitários, é nomeado, em  
1842, Ministro para a Reforma da Legislação Prussiana (HEINRICH, 2018, pp. 286-  
90). Se houve euforia com a chegada do novo rei, como conta Michael Heinrich, ela  
deve ter sido causada mais por ilusões ingênuas do que por motivos reais. Já em uma  
carta datada de 30 de março de 1840, é possível sentir o clima de hostilidade e  
desconfiança em que viviam os hegelianos naquela Alemanha dividida e dominada pela  
Prússia. Na referida carta, do punho de Bauer, lemos longo excerto em que o amigo  
de Marx aborda o clima de desconfiança em Bonn e procura alertá-lo para a sua  
chegada ao local:  
Quando você chegar aqui, não deve falar com ninguém daqui sobre  
nada além do tempo e coisas do gênero até que tenhamos  
conversado. Eu tenho que estragar todo o mundo local para você  
antes que você possa entrar. Do coração, ou seja, das coisas mentais  
e espirituais, não se deve deixar cair uma palavra, as pessoas, ou seja,  
apenas os mais inteligentes, os mais ativos, têm horror ao diabo, mas  
os pobres tolos não sabem como deixar isso claro para si mesmos. O  
que é a filosofia e seu significado atual, apenas um vago sentimento  
de ansiedade lhes diz, mas eles não podem interpretá-lo. Até agora  
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O caminho de Marx para Hegel: a busca do conceito e a crítica do existente  
eu tenho - devo elogiar a mim mesmo - me comportado com cautela  
inabalável. Apenas uma vez, e isso ainda parte meu coração, eu me  
perdi. Eu estava com Kilian no Carnaval em Colônia, voltamos sozinhos  
à noite e deixei esse homem sem caráter me tentar a dizer uma palavra  
sobre a atual relação entre o Estado e a filosofia. Ainda me irrita! Este  
homem - um segundo sobrinho de Rameau - é sem nenhuma  
convicção e como eu sei com certeza ele levou as poucas palavras  
distorcidas para todos os teólogos [...]. Você vê o quão cuidadoso e  
equilibrado você tem que ser aqui, mas também vê a tortura que  
suporto aqui e quanto tempo desejo poder sentar-me com você [...].  
Meu princípio é: abra apenas no púlpito! Pratiquei neste inverno e vou  
treinar e seguir cada vez mais, porque aquele lugar é o único onde se  
pode falar diretamente do peito dessa situação. Além disso, é claro:  
viva a caneta! Mas simplesmente não fale com essas pessoas sobre  
coisas maiores, elas não entendem! Ou são tacanhos! (MARX; ENGELS,  
1975b, p. 343, tradução nossa)  
Foi nesse contexto de enorme desconfiança e perseguição que Marx escreveu  
sua tese doutoral. Mas como é típico desse autor, os tempos de urgência não o  
impediram de mergulhar profundamente nos seus objetos de investigação, afinal, o  
rigor exige paciência, talvez essa tenha sido a lição hegeliana que Marx mais assimilou.  
Conforme nos mostra Michael Heinrich, “um dos motivos da demora foi o fato de Marx  
não ter se dedicado exclusivamente à tese nesse período”, ele “estudou com afinco  
temas filosófico-religiosos, além de ter planejado a publicação não só de artigos  
avulsos, mas de um livro inteiro (sobre o hermesianismo)” (HEINRICH, 2018, p. 365),  
temática que é levantada na carta de Bruno Bauer, datada de 25 de julho de 1840. E,  
nessa missiva, Bauer se revela bastante desconfiado com o novo rei e pede cautela a  
Marx nos seus planos de publicação. Diz Bauer:  
Pelo que tenho visto aqui, no entanto, não seria o momento certo,  
nomeadamente sob o novo governo, para submeter o hermesianismo  
à crítica filosófica. Ainda não se sabe como o atual rei vai lidar com  
ele, tudo é possível. Então seria melhor esperar. É inoportuno criticar  
uma escola de filosofia que é oprimida pelo Estado e ainda não se  
enraizou na mente do povo. Foi diferente sob o antigo rei, quando  
parecia a todo momento que o hermesianismo poderia alcançar a  
vitória de forma decisiva. A crítica deve ser dirigida contra a felicidade,  
isto é, contra o que já desmoronou por dentro. Escreva sobre isso.  
(MARX; ENGELS, 1975b, pp. 349-50, tradução nossa)  
Fica nítido na carta de Bauer que a esperança com o novo rei era menor que a  
desconfiança. É provável que o tema do hermesianismo tenha chegado a Marx via  
Bruno Bauer, que já havia levantado o assunto brevemente na carta de primeiro de  
março de 1840 (MARX; ENGELS, 1975b, pp. 340-1, tradução nossa) e voltou a instigá-  
lo na correspondência de 30 de março daquele mesmo ano. Você, diz Bauer a Marx,  
“deve ler sobre isso, deve porque você fala sobre esse assunto há muito tempo”  
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(MARX; ENGELS, 1975b, p. 344, tradução nossa). Outro motivo para a demora na  
conclusão da sua tese foi “o fato de Marx abordar seu tema de maneira muito mais  
profunda do que era comum na época” (HEINRICH, 2018, p. 365). Essa temática já  
havia sido abordada por Friedrich Köppen, cujo livro foi dedicado a Marx. Nesse livro,  
Köppen escreve sobre Friedrich Wilhelm II, rei admirado por ser esclarecido22. Além  
disso, “estoicismo, epicurismo e ceticismo são considerados fontes das concepções  
filosóficas de Frederico II da Prússia”. Segundo Michael Heinrich, “Köppen traçou um  
paralelo entre o iluminismo do século XVIII e epicuristas enquanto ‘iluministas da  
Antiguidade’” (HEINRICH, 2018, p. 368), posição similar àquela adotada por Marx na  
tese doutoral quando refere Epicuro como “o maior Aufklärer grego” (MARX; ENGELS,  
1975a, p. 57, tradução nossa).  
Marx tinha a intenção de abordar as três grandes filosofias pós-aristotélicas,  
como ele mesmo cita na tese, pedindo ao leitor que “considere este tratado apenas  
como um precursor de um trabalho maior no qual apresentarei detalhadamente o ciclo  
da filosofia epicurista, estoica e cética em sua conexão com toda a especulação grega.  
As deficiências deste tratado na forma e afins serão eliminadas lá” (MARX; ENGELS,  
1975a, p. 13, tradução nossa). Assim, diante do clima de incertezas e perseguições,  
após mais de dois anos de pesquisa os primeiros rascunhos datam de 1839 , não  
era possível esperar um mês sequer, por isso, Marx teve que enviar um trabalho parcial,  
extraído daquele plano geral, como sua tese doutoral.  
Encontramos na tese de Marx, bem como nos seus cadernos preparatórios, o  
desenvolvimento e o aprofundamento das posições filosóficas hegelianas anunciadas  
na Carta ao pai. Desse modo, com a análise da tese, pensamos rebater devidamente  
certas afirmações que aludem para um Marx nutrido, ainda, por Kant e Fichte, que  
sequer foi hegeliano, pois, ao abandonar o barco do idealismo kantiano-fichtiana, Marx  
teria imediatamente se jogado nas águas quentes de Feuerbach23; e, também, aqueles  
22 Impossível esquecer os altos elogios feitos por Kant (2011) ao Friedrich Wilhelm II no seu pequeno e  
marcante texto, Resposta à pergunta: o que é esclarecimento?  
23 A tese do Marx kantiano-fichtiana, até onde fomos capazes de localizar, encontra-se desenvolvida em  
Althusser: “as obras do primeiro momento [até 1842] supõem uma problemática de tipo kantiano-  
fichtiano. Os textos do segundo momento [de 1842 a 1845] repousam, ao contrário, na problemática  
antropológica de Feuerbach. A problemática hegeliana inspira um texto absolutamente único, que tenta  
de maneira rigorosa operar, no sentido estrito, a ‘inversão’ do idealismo hegeliano no  
pseudomaterialismo de Feuerbach: são os manuscritos de 44. Excetuando o exercício ainda escolar da  
Dissertação [aqui, chamada de tese], chega-se ao resultado paradoxal de que, para falar com  
propriedade, salvo no quase último texto do seu período ideológico-filosófico, o jovem Marx jamais foi  
hegeliano. De início kantiano-fichtiano; depois, feuerbachiano. A tese, tão correntemente espalhada, do  
hegelianismo do jovem Marx, em geral, é pois um mito” (2015, pp. 25-6).  
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O caminho de Marx para Hegel: a busca do conceito e a crítica do existente  
que ligam Marx ao jusnaturalismo24. Contrapondo certas leituras acerca do  
pensamento de Marx no período estudado, procuramos expor a posição firmada por  
Marx na tese quanto ao papel da filosofia no mundo. Para isso, procuramos mostrar o  
que Marx entendia por realidade efetiva e contradição entre existência e conceito, algo  
fundamental para bem caracterizar as críticas de Marx às legislações debatidas na  
Dieta Renana e, ainda, sua defesa do Estado e do direito racional nas páginas da  
Gazeta Renana. A tese doutoral é um texto fundamental para o devido esclarecimento  
das posições firmadas por Marx no tempo em que esteve à frente do “periódico  
democrática”. Na tese, o autor alemão produziu, ao comparar os antigos com os  
modernos, importante diagnóstico de época e, portanto, das realizações exigidas pelo  
seu tempo. A devida compreensão deste diagnóstico se faz imprescindível àquele que  
procure identificar a fisionomia intelectual de Marx nesse momento, além de aclarar o  
pensamento do autor nos tempos da Gazeta Renana, quando Marx afirmou, por  
exemplo, que sua época é o “tempo das leis universais” (MARX; ENGELS, 1975a, p.  
206, tradução nossa), afirmação que somente pode ser bem compreendido à luz do  
citado diagnóstico de época iniciado na tese doutoral.  
Comecemos, então, por mostrar a linha de continuidade entre a Carta ao pai e  
as posições de Marx quanto aos filósofos Kant, Fichte e Hegel na sua tese. Na tese e  
nos cadernos preparatórios, Kant e seus discípulos são referidos apenas cinco vezes e  
em nenhuma delas de forma elogiosa. Definitivamente, Marx não aceitava os limites  
impostos por Kant ao conhecimento da coisa, posição que nosso autor encarava como  
impotência e espécie de apologia à ignorância. Em uma das cinco menções a Kant e  
seus seguidores, Marx chega a acusá-los de serem “sacerdotes contratados da  
24  
Aqui, aludimos à posição de Marcio Bilharinho Naves (2014, p. 10, grifo nosso), que chega a ser  
desleixada ao afirmar: “daí o eterno retorno aos textos não marxistas de Marx, nos quais ele aparece  
como representante do direito natural, como uma espécie improvável de Grotius ou de Kant, já meio  
fora de lugar em uma Prússia inteiramente fora de lugar. E não foram poucos os que julgaram ter  
descoberto uma teoria marxista do direito ali onde somente havia ecos distantes da ideologia jurídica  
burguesa”. Naves divide a juventude de Marx em: fase jusnaturalista e liberal radical, que perpassa in  
nuce o período da Gazeta Renana, e uma segunda fase, marcada pelo Humanismo e democratismo  
extremo (Sobre a questão judaica), bem como pelo comunismo especulativo (MEF de 1844), a qual  
perfaz os anos de 1843-1844. Em relação ao direito, a sistematização feita pelo autor brasileiro é a  
seguinte: I) jusnaturalismo e “defesa de um estado de direito(NAVES, 2014, p. 17). Ainda sobre a tese  
de Naves, lemos: “Marx foi, de fato, adepto do jusnaturalismo e, com base nele, sustentava todo um  
conjunto de reivindicações políticas democrático-radicais contra o Estado prussiano. Seus textos  
apoiam-se em uma teoria racionalista do Estado em que este tem por finalidade a realização da  
liberdade. [...] para Marx, uma lei só pode ser admitida como lei se ela for o reconhecimento da lei  
natural que a precede e da qual ela deve ser a expressão necessária. Assim, a lei só pode ser reconhecida  
com tal, ser verdadeira lei, quando ‘ela é a existência positiva da liberdade’,” (NAVES, 2014, pp. 18-9)  
Diante da falta de provas fornecidas pelo autor brasileiro, só podemos pensar que o critério da verdade  
é o grau de convicção com que alguém é capaz falar.  
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ignorância”. Importa notar, também, que o jovem Marx direciona seu ataque mais aos  
kantianos do que ao próprio Kant, afinal, o embate filosófico e político se dava naquele  
momento justamente contra os seguidores do autor da Crítica da razão pura, o que  
não prejudica sua crítica ao criticismo, o qual é atingido no âmago. Isso pode ser  
percebido no excerto abaixo:  
os epicuristas consideram o conhecimento das coisas, como uma  
alteridade do espírito, impotente para realçar a sua realidade  
[Realitas]; os pirrônicos consideram a impotência da mente para  
apreender as coisas como seu assunto essencial, uma energia real  
dela. Mesmo que ambos os lados sejam degradados e não apareçam  
no frescor filosófico da antiguidade, há uma relação semelhante entre  
os fanáticos e os kantianos em sua atitude em relação à filosofia. Os  
primeiros renunciam ao conhecimento por piedade, ou seja,  
acreditam, com os epicuristas, que o divino no homem é a ignorância,  
que essa divindade, que é a preguiça, é perturbada pelo conceito. Os  
kantianos, por outro lado, são, por assim dizer, os sacerdotes  
contratados da ignorância, sua ocupação diária é rezar um rosário  
[Rosenkranz]25 sobre sua própria impotência e a potência das coisas  
(MARX; ENGELS, 1976, p. 37, tradução nossa).  
Nos quase dois anos que separam a Carta ao pai e o início dos estudos para a  
tese doutoral, não parece que Marx tenha alterarado sua posição com relação a Kant,  
pois, como escreveu na carta, a oposição típica desse idealismo, entre o efetivo e o  
dever-ser, faz com que o sujeito deslize em torno da coisa, raciocinando de um lado a  
outro, mas sempre na superfície dela, o que impõe um limite ao conhecimento da  
própria coisa, que não toma forma nem se desdobra, portanto, não é efetivamente  
conhecida. Marx estava convencido, naquele momento, que era possível conhecer a  
realidade efetiva, e o papel da filosofia não era pregar a ignorância e a impotência,  
mas medir o existente pelo efetivo, que deveria ser conhecido pela filosofia. Nesse  
sentido, a posição kantiana de indiferença frente ao sujeito empírico se encontra muito  
afastada daquilo que o jovem Marx almejava, “procurar a ideia no próprio real”. Tal  
ponto é exposto quando, nos cadernos preparatórios, Marx escreve que para Kant, ao  
elaborar o imperativo categórico, não importa como o “sujeito empírico” se relaciona  
com esse imperativo (MARX; ENGELS, 1976, p. 44, tradução nossa). Portanto, o  
existente não é medido pelo efetivo.  
No apêndice de sua tese, “Crítica à polêmica de Plutarco contra a teologia de  
Epicuro”, Marx volta a referir Kant quando aborda a questão que envolve a prova da  
25  
Marx faz um jogo de palavras, provavelmente, ironizando o principal kantiano da época, Karl  
Rosenkranz, de quem leu a sua Geschichte der Kantschen Philosophie, como é possível averiguar nos  
excertos do caderno de Berlim (MARX; ENGELS, 1976, p. 277).  
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nova fase  
 
O caminho de Marx para Hegel: a busca do conceito e a crítica do existente  
existência de Deus. E, mais uma vez, não concede uma linha de razão ao criticismo:  
As provas da existência de Deus não passam de tautologias vazias -  
por exemplo, a prova ontológica não significaria nada além de: "O que  
eu represento como real (realer) para mim é uma representação real  
para mim", isso me afeta e, nesse sentido, todos os deuses, tanto  
pagãos como cristãos, tiveram uma existência real. O velho Moloch  
não reinou? O Apolo de Delfos não era um poder real na vida dos  
gregos? A crítica de Kant também não significa nada aqui. Se alguém  
imagina possuir cem táleres, se essa representação não é arbitrária,  
subjetiva, se ele acredita nela, então os cem táleres imaginários valem  
o mesmo que cem táleres reais. Por exemplo, ele incorrerá em dívidas  
com sua imaginação, que funcionará como quando toda a humanidade  
contraía dívida com seus deuses. Pelo contrário. O exemplo de Kant  
poderia ter reforçado a prova ontológica. Táleres reais têm a mesma  
existência que deuses imaginários. Um táler real tem outra existência  
que não seja na representação, mesmo que seja na representação  
geral, ou melhor, comunitária, das pessoas? Leve papel-moeda para  
um país onde esse uso de papel é desconhecido e todos vão rir de  
sua representação subjetiva. Vá com seus deuses para um país onde  
outros deuses são cultuados e você verá que sofre de delírios e  
abstrações. Com razão. Qualquer um que trouxesse um deus Wendish  
para os antigos gregos teria encontrado provas da inexistência desse  
deus. Pois para os gregos ele não existia. O que um país determinado  
é deuses estrangeiros determinados, a terra da razão é para Deus em  
geral, uma região onde sua existência cessa. (MARX; ENGELS, 1975a,  
p. 90, tradução nossa)  
Como já havíamos demonstrado na carta de 1837, Marx, seguindo de maneira  
própria as lições hegelianas, pretende um conhecimento mais profundo que meras  
representações das coisas, um conhecimento que seja, portanto, imanente e objetivo.  
Marx encerra esse trecho de sua tese com a anunciação daquela que é a sua solução  
tanto para o problema da prova da existência de Deus quanto para o problema mais  
geral da possibilidade de conhecimento da coisa: a autoconsciência. Diz Marx: “ou as  
provas da existência de Deus nada mais são do que provas da existência da  
autoconsciência humana essencial, explicações lógicas dela. Por exemplo, a prova  
ontológica. Que ser é imediato enquanto pensado? A autoconsciência” (MARX;  
ENGELS, 1976, p. 91, tradução nossa). Pois, como bem explica Albinati, o ponto de  
partida da tese “é a observação de que, embora Demócrito e Epicuro professem a  
mesma ciência, o atomismo, eles se distinguem radicalmente no que diz respeito à  
verdade, à possibilidade do conhecimento, à relação entre o pensamento e a realidade,  
e ao próprio sentido da ciência” (ALBINATI, 2007, p. 118). O que está em jogo na tese  
de Marx é, principalmente, como fundamentar a possibilidade da subjetividade se  
elevar ao nível do conhecimento objetivo da realidade efetiva, por isso, Marx encarava  
Kant e os kantianos como “sacerdotes contratados da ignorância”, pois renunciaram a  
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essa pretensão filosófica fundamental, que é conhecer o que é, pois a filosofia “é o  
perscrutar do racional [...], o apreender do presente e do efetivo” (HEGEL, 2022, p.  
138). A crítica de Marx a Kant e aos kantianos, presente na carta ao pai e na sua tese,  
não deixa espaço algum para a defesa althusseriana do Marx kantiano no período pré-  
1843, pois, como é possível perceber, as críticas do jovem Marx atingem o cerne do  
criticismo kantiano, aquilo que poderíamos chamar de sua teoria do conhecimento.  
Sobre o Marx fichtiano, a tese também nos fornece elementos suficientes para  
afastar tal defesa. Vasculhando os cadernos preparatórios e a tese, encontramos  
apenas uma menção de Marx a Fichte. E semelhante ao que ocorre com Kant, essa  
menção é negativa e ataca frontalmente o núcleo da filosofia fichtiana, o seu Eu. Na  
passagem encontrada, Marx chega a mencionar um, à época, conhecido polemista  
alemão chamado Friedrich Nikolai, quem havia publicado duras críticas a Kant e a  
Fichte26. Escreve Marx:  
Mas em termos de objetividade, em termos de conteúdo, Heráclito é  
tão bom, que não só despreza como odeia o senso comum, é o  
próprio Tales que ensina que tudo é água, enquanto todo grego sabia  
que não poderia viver de água, é Fichte com seu Eu criador de mundo,  
enquanto até mesmo Nikolai percebeu que não poderia criar um  
mundo, todo filósofo que afirma a imanência contra a pessoa empírica  
é um ironista. (MARX; ENGELS, 1976, pp. 102-3, tradução nossa)  
Segundo Michael Heinrich, ao contrário do que se poderia pensar, isto é, que o  
destaque dado a autoconsciência significaria uma volta à filosofia fichtiana, na verdade,  
esse destaque seria “uma primeira tentativa de esclarecimento pós-hegeliano: o que  
26  
Conforme Alexandre Hahn (2017, p. 213), “Friedrich Nicolai (1733-1811), além de livreiro, editor,  
historiador, crítico literário e escritor bem-sucedido de romances satíricos, notabilizou-se como  
expoente da filosofia popular, e representante de primeira ordem do Iluminismo berlinense. Almejando  
dar voz a esse movimento, fundou e editou por 40 anos o periódico de resenhas Allgemeine deutsche  
Bibliothek. Nesse espaço, filósofos populares podiam combater tanto a autoridade religiosa, como  
aquilo que entendiam se tratar de extravagâncias do movimento romântico literário Sturm und Drang,  
e do classicismo de Weimar, representado por figuras como Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832)  
e Friedrich Schiller (1759-1805)”. Ainda segundo Hahn (2017, p. 215), “Johann Gottlieb Fichte (1762-  
1814) foi alvo dos ataques mais violentos. Sua reação veio em 1801, com a obra Vida e opiniões  
extravagantes de Friedrich Nicolai, cujo título parodia dois trabalhos de Nicolai (1773 e 1798). Nessa  
obra, além de acusar Nicolai de ter atacado sua honra, em uma resenha sobre o livro Sistema do  
idealismo transcendental de Friedrich Wilhelm Joseph Schelling (1775-1854), Fichte ironiza o princípio  
a partir do qual o mesmo teria derivado todas suas críticas. Segundo ele, Nicolai considera infalível sua  
avaliação pessoal acerca de toda ciência e conhecimento, e supõe que ela ‘deveria servir de guia e  
padrão para o juízo de todos outros seres racionais’. De acordo com esse diagnóstico, o citado editor  
teria a presunção de que todo conhecimento estaria nele compreendido e resumido, bem como que  
tudo que não compreendesse seria ‘ininteligível e absurdo, e que a mera expressão da sua opinião  
adversa era suficiente para aniquilar completamente todos os oponentes’. A reação de Nicolai a Fichte  
veio em um longo suplemento ao volume 61 do seu Neue allgemeine deutsche Bibliothek, no qual  
também critica Johann Friedrich Cotta (17641832), editor do referido trabalho de Fichte, por  
supostamente buscar apenas o lucro com a publicação de uma obra como essa.”  
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O caminho de Marx para Hegel: a busca do conceito e a crítica do existente  
impulsionaria a história não seria o movimento de uma racionalidade abstrata e geral  
- esse impulso estaria, antes, imediatamente no próprio ser humano” (HEINRICH, 2018,  
p. 393). Para Heinrich, o relevo dado por Marx à figura de Prometeu e a “reivindicação  
do reconhecimento da autoconsciência como ‘divindade suprema’ evidenciam que essa  
referência ao ser humano por meio da autoconsciência era vista por Marx como avanço  
radical” (HEINRICH, 2018, p. 393). Posição que Marx já havia enunciado brevemente  
na carta ao pai, “antes, os deuses moravam acima da Terra; agora, tornaram-se o centro  
dela”. Para Albinati:  
Analisando o texto da tese doutoral, a referência a Prometeu que ali  
comparece como uma espécie de epígrafe da intenção do autor, vem  
no sentido de afirmar o homem como criador de si mesmo, o que  
constitui de fato um aspecto assumido ao longo de sua obra. Mas ali  
mesmo, neste texto inaugural, embora a ênfase do autor recaia sobre  
o papel da subjetividade, sobre o princípio da autoconsciência, tal  
como explicitada na filosofia epicúrea, Marx já questiona a ideia de  
uma liberdade como atributo do indivíduo-átomo, questionando os  
limites de uma filosofia que parte do indivíduo em contrapartida ao  
social. A noção de uma liberdade negativa, como autonomia de se  
recusar às determinações naturais ou sociais, que se deriva da ideia  
do "clinamen", é, ao final da tese, colocada em questão, deixando em  
aberto a maneira pela qual Marx prosseguiria no equacionamento da  
relação entre o singular e o universal, entre o indivíduo e a sociedade.  
(ALBINATI, 2007, p. 59)  
Não é, por isso, um retorno a Fichte via filosofia da autoconsciência, trata-se,  
de fato, de um aprofundamento na filosofia de Hegel, que comporta certa posição  
crítica do discípulo frente ao pensamento do mestre. Marx nunca foi um hegeliano tout  
court, e isso se deveu justamente o seu modo de encarar a relação entre os discípulos  
e o mestre. Mais adiante, trataremos detidamente desse ponto, agora voltemos à  
relação de Marx com Fichte. A aludida relação de oposição é explicitada e ganha novo  
desdobramento na passagem da tese em que Marx é direto com relação à filosofia do  
Eu, quando acusa Fichte de ser irônico. Diz o contrário do que deveria ser, por isso é  
ironista, além disso opõe os lados que deveria acolher. No trecho supramencionado,  
o uso do termo Ironiker por Marx se aproxima bastante do modo como Hegel utiliza o  
termo e encara a ironia, pois este último “raramente emprega a palavra ‘ironia’, salvo  
para criticar as opiniões de outros” (INWOOD, 1997, p. 195). Não é mera coincidência  
que, no principal parágrafo da Filosofia do direito no qual encontramos um tratamento  
de Hegel sobre a ironia e quando, também, tematiza a autoconsciência, encontramos  
a mesma relação com Fichte. Escreve Hegel, sobre “ponto de vista supremo da  
subjetividade”:  
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Essa forma é agora a ironia, a consciência de que com tal princípio da  
convicção não se vai muito longe e de que nesse critério supremo só  
o arbítrio domina. Esse ponto de vista proveio propriamente da  
filosofia fichtiana, que exprime o eu como o absoluto, isto é, como a  
certeza absoluta, como a egoidade universal, que pelo seu  
desenvolvimento ulterior avança até a objetividade. não se pode  
propriamente dizer que Fichte tenha venha convertido no domínio  
prático o arbítrio do sujeito em princípio, mas, posteriormente, esse  
mesmo particular, no sentido da egoidade particular, foi divinizado  
por Friedrich von Schlegel, no que se refere ao bem e ao belo, de  
sorte que o objetivamente bom seria somente um construto da minha  
convicção, só de mim receberia o seu suporte, e que eu, enquanto o  
senhor e mestre, posso fazê-lo surgir e desaparecer. quando me  
relaciono a algo objetivo, ele ao mesmo tempo já só soçobrou para  
mim, e eu pairo sobre um espaço enorme, evocando e destruindo  
figuras. (HEGEL, 2022, p. 393)  
Interessante perceber que a crítica de Marx a Fichte segue na mesma rota da  
sua crítica a Kant, isto é, acusa a indiferença de ambos ao elemento empírico, ao  
existente. Como se verá adiante, isso não significa que Marx se alinhe aos positivistas  
e eleve o empírico ao nível da efetividade, mas que não há imanência sem  
conhecimento do empírico. Se tomarmos a defesa de Marx do direito racional e da  
codificação como positivação da liberdade, vemos de maneira exemplar que a relação  
entre o empírico e a razão não é meramente de oposição, mas, pode ser, de aparência  
e essência, onde esta última se revela naquela. Afastamos, com isso, aquele mitológico  
Marx fichtiano.  
No capítulo relativo às “Dificuldades quanto à identidade da filosofia da  
natureza de Demócrito e Epicuro”, temos a revelação daqueles que são os temas mais  
importantes para Marx e sobre os quais nosso autor se posicionou. Trata-se da relação  
dos filósofos antigos com a verdade, a certeza, a aplicação da ciência e a relação entre  
ideia e realidade efetiva. Dizendo de outro modo, a tese nos permite apreender o que  
Marx entendia por verdade, certeza e ciência, bem como, o que é fundamental, aquilo  
que nosso autor entendia da relação entre ideia e realidade efetiva. Relação que desde  
a carta de 1837 causou a primeira grande inflexão no seu pensamento, quando chegou  
à conclusão que a oposição entre ideia e realidade efetiva conduzia ao formalismo,  
decidindo-se, então, pela busca da ideia na própria realidade efetiva, o que o levou, a  
contragosto, aos braços do seu inimigo, Hegel.  
Sustentamos que a partir da confrontação das filosofias da natureza de  
Demócrito e Epicuro é possível captar o próprio pensamento de Marx sobre aqueles  
temas supracitados, tendo em vista o modo como Marx encarava as filosofias pós-  
aristotélicas e as de seu tempo, pós-Hegel. Marx encontrava muitas similitudes nessas  
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duas épocas. Ele via no crepúsculo da filosofia antiga, ainda, um feixe de luz capaz de  
iluminar o cinza sobre cinza da era que sucedeu a filosofia de Hegel, pois escreve  
Marx:  
Assim como há pontos nodais na história da filosofia que a elevam à  
concretude em si mesma, que abarcam os princípios abstratos numa  
totalidade e assim interrompem a progressão da linha reta, assim  
também há momentos em que a filosofia volta seus olhos para o  
mundo exterior, não mais para concebê-lo, mas como pessoa prática,  
por assim dizer, tecendo intrigas com o mundo, saindo do reino  
transparente de Amenthes e se jogando no coração da sereia  
mundana. Esta é a época carnavalesca da filosofia, quando ela se  
disfarça de cachorro como o cínico, com uma batina como o  
alexandrino ou com um vestido primaveril perfumado como o  
epicurista. É essencial que ela coloque máscaras de personagem.  
Como nos é narrado que Deucalião atirou pedras para trás na criação  
dos homens, a filosofia lança seus olhos para trás (os ossos de sua  
mãe são olhos brilhantes) quando seu coração é forte o suficiente para  
criar um mundo; mas como Prometeu, que roubou o fogo do céu,  
começa a construir casas e se estabelecer na terra, assim a filosofia,  
que se expandiu para o mundo, se volta contra o mundo como ele  
aparece. O mesmo agora ocorre com a filosofia de Hegel. (MARX;  
ENGELS, 1976, p. 99, tradução nossa)  
Marx, na tese, visava estudar os sistemas dos epicuristas, dos estoicos e dos  
céticos como as filosofias da autoconsciência, momento no qual a filosofia assume sua  
“forma subjetiva” nos seus portadores intelectuais, os filósofos. O que significa dizer  
que a “importância histórica” atribuída a esses sistemas não estava exatamente no  
conteúdo que professavam, na sua forma objetiva, mas na “forma subjetiva” que  
assumiram. Parece-me, escreve Marx, que:  
se os sistemas anteriores são mais importantes e interessantes pelo  
conteúdo, os pós-aristotélicos, e preferencialmente o ciclo das escolas  
epicuristas, estoica e cética, o são pela forma subjetiva, pela índole da  
filosofia grega. Mas a forma subjetiva, a portadora espiritual dos  
sistemas filosóficos, foi até agora quase completamente esquecida  
devido às suas determinações metafísicas (MARX, 1975a, p. 23).  
Marx adota posição semelhante ao abordar a filosofia pós-Hegel. O paralelo  
entre Aristóteles e Hegel é explícito no texto da tese, precisamente, no final das notas  
do capítulo intitulado “Diferença fundamental geral entre a filosofia da natureza de  
Demócrito e a de Epicuro”. Essa postura de Marx revela o caráter nuançado da sua  
adesão à filosofia hegeliana, sempre apropriada de modo mediato, o que permitiu ao  
autor, também, desenvolver um pensamento próprio diante das questões. Desse  
capítulo e do Capítulo V, somente restaram as notas, que, normalmente, são postas,  
pelas edições, no corpo do texto, pois os capítulos se perderam. No caso do Capítulo  
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IV da primeira parte, quase a totalidade das notas explicativas, aquelas que não são  
apenas citações, tratou da relação dos hegelianos com o mestre, bem como, e isso é  
fundamental, da filosofia com o mundo.  
Tendo isso em vista, é possível que a relação que ora levantamos tenha sido  
explicitada com maiores detalhes no texto integral, perdido. Marx imediatamente  
depois de tratar da divisão da escola hegeliana, das alas positivistas e liberais, ponto  
que abordaremos em seguida, afirma que há muito tempo que “figuras concretas  
submissas, reclamonas e sem individualidade [...] se colocam atrás de uma figura  
filosófica gigante do passado”, no entanto, “logo se dá conta do burro vestido na pele  
do leão, e a voz chorosa de um manequim de hoje e de ontem geme em cômico  
contraste por trás da voz poderosa e centenária de, por exemplo, Aristóteles” (MARX,  
1975a, p. 69). Marx encarava o período posterior a Hegel, essa “figura filosófica  
gigante do passado”, como o tempo da autoconsciência na filosofia, e a divisão em  
dois partidos como consequência do que ele chamou de “dualidade da autoconsciência  
filosófica” (MARX; ENGELS, 1975a, p. 69, tradução nossa) que se manifesta em duas  
tendências opostas.  
Nesse momento, Marx se posiciona pela primeira vez de maneira mais taxativa  
frente à escola hegeliana e, consequentemente, em relação à filosofia do mestre. Marx  
acusa os alunos de Hegel de aderirem, “em pouco tempo, como pode ser claramente  
demonstrado por seus próprios escritos, [...] com entusiasmo a toda a sua  
unilateralidade” (MARX; ENGELS, 1975a, p. 67, tradução nossa), portanto, procuram  
se relacionar com a filosofia do mestre de maneira “imediata, substancial” (MARX;  
ENGELS, 1975a, p. 67, tradução nossa), como se fossem o próprio Hegel, mas  
esquecem, diz Marx, que a relação que estabelecem com aquela filosofia é uma  
“relação refletida” (MARX; ENGELS, 1975a, p. 67, tradução nossa), isto é, mediata.  
Marx critica o deslumbramento de parte dos hegelianos, cuja adesão é “ingênua e  
acrítica”, direta, pois acreditam ter recebido do mestre uma ciência pronta e acabada,  
os quais não tiveram “escrúpulos [de] imputar uma intenção oculta atrás da noção do  
mestre”, e, por isso, explicam as acomodações de Hegel, como diz Marx, “moralmente”  
(MARX; ENGELS, 1975a, p. 67, tradução nossa). Nosso autor, parecendo seguir de  
perto o prefácio da Filosofia do direito, defende que para Hegel “não se tratava de  
uma ciência recebida, mas de uma ciência em formação, imbuída de sua própria força  
vital espiritual até o último capilar” (MARX, 2018c, p. 56).  
Na tese, Marx defende que os discípulos devem ter um papel ativo no  
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“progresso do conhecimento” em contraponto àquela posição “ingênua e acrítica” que  
acaba cindindo o mestre em dois, um exotérico, portanto, público e externo, e outro  
esotérico, que oculta intenções que somente seus discípulos são capazes de revelar,  
aqueles que são capazes, pode-se dizer, de chegar às intenções morais do mestre.  
Contra esse corte, Marx explica que é compreensível que um filósofo, pela sua relação  
de imediatez com sua própria filosofia, ao incorrer “em uma ou outra aparente  
inconsequência em decorrência desta ou daquela acomodação”, e ainda que tenha  
consciência disso, “não tem consciência de que a possibilidade dessa aparente  
acomodação tem suas raízes mais profundas em uma deficiência ou em uma  
formulação deficiente de seu próprio princípio”, e, nesse ponto, Marx atinge o núcleo  
da cisão ao passo que determina a tarefa dos discípulos é: explicar a acomodação com  
base na “sua consciência interior essencial” e ir além da filosofia do mestre. Agora, na  
dicção da tese:  
Portanto, se um filósofo realmente se tornasse acomodado, seus  
alunos teriam que explicar a partir de sua consciência interior essencial  
o que para ele próprio tinha a forma de uma consciência exotérica.  
Dessa forma, o que parece ser um avanço da consciência é também  
um progresso do conhecimento. A consciência particular do filósofo  
não é suspeitada, mas sua forma essencial de consciência é  
construída, elevada a uma forma e significado específicos e, assim, ao  
mesmo tempo ultrapassada. (MARX; ENGELS, 1975a, p. 67, tradução  
nossa)  
Marx considera esse movimento necessário da filosofia hegeliana como uma  
“virada não filosófica” da filosofia que conduz à “transição da disciplina para a  
liberdade”, isto é, a teoria abandona o círculo fechado de uma filosofia de escola e se  
converte em “energia prática” que se volta, “na condição de vontade”, isto é, de  
liberdade, contra “a realidade mundana”, o que é um modo próprio de encarar o  
desenvolvimento da filosofia e sua forma de se realizar no mundo. Nesse momento, a  
filosofia se tornou crítica do existente, pois, “na condição de vontade”, ela “se volta  
contra o mundo fenomênico”. A filosofia se torna ela mesma “um aspecto do mundo  
que se confronta com outro” aspecto, o fenomênico, “inspirada pelo impulso de  
realizar-se, ela entra em tensão com o outro. A autossuficiência interior e a rotundidade  
foram rompidas. O que era luz interior tornou-se chama devoradora que se volta para  
fora”. Agora, notemos, Marx via na filosofia hegeliana, no seu curriculum vitae, não a  
indiferença com relação ao fenômeno, como em Kant e Fichte, mas a qualidade de  
confrontar-se com o mundo fenomênico, uma filosofia que se tornava um aspecto do  
mundo contra outro aspecto desse mundo, uma filosofia que encontrou sua  
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“determinidade imanente” e o seu “caráter histórico mundial” (MARX, 2018c, p. 57).  
O resultado disso, sintetiza Marx, na tese:  
é que o tornar-se filosófico do mundo é concomitantemente um  
tornar-se mundano da filosofia, que sua realização é, ao mesmo  
tempo, sua perda, que aquilo que ela combate fora dela é sua própria  
deficiência interior, que precisamente na luta ela incorre nos danos  
que combate como danos no opositor e que ele só consegue suprimir  
esses danos na medida em que neles incorre. Aquilo com que se  
depara e o que ela combate sempre é o mesmo que ela é, mas com  
chaves invertidas (MARX, 2018c, p. 58).  
Esse é o lado “puramente objetivo” da “realização imediata da filosofia”; há,  
contudo, um “lado subjetivo” que envolve “a relação entre o sistema filosófico que  
está concretizado e seus portadores intelectuais, as autoconsciências individuais em  
que aparece seu progresso”. Pois, nesse seu realizar-se, “tornar-se filosófico do  
mundo” e “tornar-se mundano da filosofia”, o confronto com o mundo fenomênico  
aparece do lado subjetivo na divisão da autoconsciência em dois partidos opostos, um  
que “se volta contra o mundo e o outro contra a própria filosofia”. Esses partidos  
formulam uma “exigência e ação duplas que se contradizem”, no caso da Alemanha,  
Marx faz referência ao “partido liberal” e à tendência ligada à “filosofia positiva”.  
Nenhuma dessas tendências, que fique claro, segundo Marx defende na tese, superou  
teoricamente o sistema hegeliano, “elas apenas sentem a contradição” – consequência  
direta da sua realização – “com a identidade plástica do sistema consigo mesmo e não  
sabem que, ao voltar-se para esse sistema, só realizam dele os momentos individuais”  
(MARX, 2018c, p. 58), sendo ambas, portanto, unilaterais e parciais. É importante  
salientar que essa abordagem do problema é própria de Marx, que já estava, em  
alguma medida, pensando na superação do sistema hegeliano, embora ainda como  
papel do discípulo diante do mestre, pois mantem com esse último uma relação  
refletida.  
Mas uma dessas tendências era capaz de progresso teórico e prático, afinal,  
conforme a concepção de Marx à época, a “própria práxis da filosofia é teórica”. A ação  
do partido liberal é encarada como “crítica e, portanto, exatamente o voltar-se para  
fora da filosofia”, compreendendo que o papel da filosofia já se completou e que, por  
isso, a deficiência está no mundo que necessita “ser tornado filosófico”, isto é,  
corresponder ao Conceito. É um passo para fora do círculo da filosofia, haja vista que  
a tarefa desta “é conceituar o que é [...] pois o que é”, diz o filósofo, “é a razão” (HEGEL,  
2022, p. 142), nesse sentido, segue a lição de Hegel, “enquanto pensamento do  
mundo”, a filosofia “aparece no tempo somente depois que a efetividade completou o  
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seu processo de formação e se tornou acabada” (HEGEL, 2022, p. 148), por isso, o  
pulo para fora da filosofia se converte na disputa pelo tornar efetivo o mundo  
fenomênico; é um salto, podemos dizer, para a política, o que pode ser encarado como  
um passo, também, além do que pretendia Hegel. Já a “filosofia positiva” ao insistir  
em filosofar, em um “votar-se para dentro de si da filosofia”, transfere a deficiência  
que é do mundo para a própria filosofia, encara, pois, essa deficiência “como algo  
imanente à filosofia”, torna-se desvairada. A contraposição é bem clara, e a posição de  
Marx nesse confronto também, quando identificamos o partido liberal como o partido  
do conceito e o partido da filosofia positiva como o partido do “não-conceito”, isto é,  
do “momento da realidade fenomênica [Realität]” (MARX; ENGELS, 1975a, p. 69,  
tradução nossa).  
Por isso, diz Marx, “apenas o partido liberal, por ser o partido do conceito”, isto  
é, o lado que combate pelo conceito, confrontando-se com a realidade fenomênica  
[Realität], pode produzir transformações reais. Mesmo sabendo das unilateralidades,  
Marx via no partido liberal a “consciência do princípio em geral e de sua finalidade”, a  
crítica do existente, do mundo fenomênico, portanto, uma ala que luta por tonar o  
existente o mais próximo possível do Conceito. Ou, podemos dizer, que busca ensinar  
o mundo a ser aquilo que o tempo exige que ele seja.  
Considerações finais  
Ao longo do texto foram produzidas sínteses arrematadoras e conclusivas, por  
isso, poupamos o leitor de repetições e procuramos destacar nesta conclusão os  
ganhos interpretativos alcançados pelo nosso trabalho.  
Estes ganhos iluminam o caminho posterior de Marx, isto é, após concluir sua  
tese doutoral, quando seguiu carreira na imprensa periódica como umas das penas  
mais afiadas contra o estado de coisas que se estabeleciam na Alemanha do Vormärz.  
Para exemplificar a importância adquirida por nosso autor, bastaria, neste momento,  
recordar que Marx foi um dos alvos da censura prussiana, pois, do censor, St. Paul,  
nós lemos que “o doutor Marx é [...] o centro doutrinário, a fonte viva das teorias do  
periódico” (ST. PAUL, 1982, p. 699). São inúmeros os predicados utilizados pelo  
censor para caracterizar, sobretudo, a personalidade a o papel exercido por Marx no  
cenário alemão, dentre todos os redatores da Gazeta Renana, nosso autor é “o mais  
influente de todos”, “espírito reto de toda a imprensa”; sobre sua personalidade, diz  
o censor que Marx “se mataria por suas ideias, presas nele como convicções” (ST.  
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PAUL, 1982, p. 699). Por fim, aludindo ao pedido de demissão de Marx, escreve St.  
Paul (1982, p. 699) que “depois da partida do doutor Marx, não há em Colônia  
realmente nenhuma personalidade capaz de manter o periódico em sua odiosa altura  
anterior e de sustentar com energia sua tendência”.  
Além de nosso trabalho esclarecer, o máximo possível, a fisionomia intelectual  
de Marx quando termina sua vida acadêmica e passa a se dedicar à crítica jornalística,  
este trabalho afasta o mito do Marx kantiano, fichtiano e até schellinguiano. Sobre a  
recusa de enxergar o hegelianismo do jovem Marx, um mito, segundo Althusser, a tese  
doutoral atua, então, na desmitologização do mito, pois fornece provas mais que  
suficientes para desbancar o autor francês. É certo que, conforme apontamos neste  
texto, a posição de Marx em relação a Hegel é bastante nuançada, visto que não é o  
caso de adesão sem mais, do tipo tudo ou nada. Como o próprio Marx escreve na tese  
doutoral, a posição que os discípulos devem guardar em relação ao mestre é reflexiva.  
Ainda mais se considerarmos que tal adesão significava, precisamente, uma posição  
frente à cisão da escola hegeliana em dois partidos.  
Marx segue para a Gazeta Renana com o seguinte programa filosófico: “é a  
crítica que mede a existência individual pela essência e a realidade particular pela  
ideia”. Pelo dito acima, defendemos que a tese doutoral de Marx revela o modo pelo  
qual Marx aderiu à filosofia hegeliana de um modo próprio, abrindo caminho para a  
crítica pública como redator do “periódico democrático”. Sua defesa do estado e do  
direito racional é a confrontação aberta com aquele direito então existente na Prússia  
e, particularmente, aquele direito produzido pela Dieta Renana. O estado e o direito  
racional sobre os quais nos fala Marx no aludido periódico é a medida do Estado e do  
direito existentes, que não correspondem, sequer, minimamente ao Conceito. A crítica  
empreendida por Marx nas páginas do jornal em que foi redator-chefe e que atraiu  
para si os olhares da censura prussiana não é outra senão aquela que explicitamos  
neste trabalho, a crítica que mede a realidade pela ideia.  
As posições de Marx nos tempos da Gazeta Renana, quando procurou nas suas  
intervenções publicísticas “produzir progressos reais”, tendo em vista que “a prática  
da filosofia é em si teórica”, portanto, crítica, ocorrem no âmago dessa posição frente  
à filosofia de seu tempo e à filosofia hegeliana, em particular. É esse, e não outro, todo  
o sentido da defesa de Marx do estado e do direito racional; e é essa, e não outra, a  
sua crítica à existência individual e à realidade particular do estado e do direito  
prussiano. Sobre os tempos da Gazeta Renana, publicamos um artigo detalhado neste  
Verinotio  
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ISSN 1981 - 061X v. 29, n. 2, pp. 172-219 jul.-dez., 2024  
nova fase  
O caminho de Marx para Hegel: a busca do conceito e a crítica do existente  
mesmo número da Verinotio.  
O que defendemos aqui, e que atravessa todo este trabalho e os próximos, é  
que o itinerário intelectual de Marx é uma das chaves mais importantes para a devida  
compreensão do pensamento do autor alemão.  
Agradecimentos  
O autor agradece ao Programa Institucional de Apoio à Pesquisa (PAPq) da  
Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg) pela concessão da Bolsa de Professor  
Orientador (BPO), referente ao Edital PAPq/Uemg nº 1/2022.  
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Verinotio  
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nova fase  
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Como citar:  
PEREIRA NETO, Murilo Leite. O caminho de Marx para Hegel: a busca do conceito e a  
crítica do existente. Verinotio, Rio das Ostras, v. 29, n. 2, pp. 172-219; jul.-dez.,  
2024.  
Verinotio  
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