DOI 10.36638/1981-061X.2024.29.2.736  
Marx e a crítica ao assim chamado “método” dos  
juristas analíticos  
Marx and the criticism of the so-called “method” of the  
analytical jurists  
Ana Carolina Marra de Andrade*  
Resumo: No presente artigo, iremos analisar a  
crítica feita por Karl Marx em seus Cadernos  
Etnológicos ao assim chamado “método” dos  
juristas analíticos. Para isso, passaremos pelos  
comentários de Marx ao jurista Henry Sumner  
Maine, fazendo um exame extenso de um trecho  
específico, no qual essa crítica aparece de forma  
mais direta. Ao longo de nossa exposição,  
pretendemos demonstrar que a crítica ao  
“método” dos juristas analíticos está inserida na  
perspectiva de uma crítica à teoria do direito  
como um todo. Então, dissecaremos a associação  
feita por Marx entre a economia política e a teoria  
do direito, em especial a de John Austin,  
passando pela crítica ao método da economia  
política com base nos Grundrisse: Manuscritos  
econômicos de 1857-1858, e também pela  
diferenciação entre economia política, economia  
vulgar, e apologética conforme exposta em obras  
anteriores do autor de O capital. O que Maine  
chama de “método” dos juristas analíticos é, para  
Marx, um dogmatismo formalista comum à teoria  
do direito, que traz elementos distorcidos da  
economia política de modo cabalmente  
apologético. A temática perpassa discussões que  
acompanharam Marx por toda sua vida, como a  
relação entre burguesia e a produção científica,  
bem como o papel da teoria do direito na defesa  
de interesses burgueses. Ademais, acreditamos  
que uma leitura dedicada dos Cadernos  
etnológicos tem muito a oferecer para o  
pensamento marxista, e nosso artigo fornece  
algumas pontuais contribuições nesse sentido.  
Abstract: In this article, we will analyze the  
criticism made by Karl Marx in his Ethnological  
Notebooks to the so-called “method” of  
analytical jurists. To do this, we will go through  
Marx's comments to the jurist Henry Sumner  
Maine, making an extensive examination of a  
specific passage, in which this critique appears  
more directly. Throughout our exposition, we  
intend to demonstrate that the criticism of the  
“method” of analytical jurists is inserted in the  
perspective of a critique of the theory of law as  
a whole. Then, we will dissect the association  
made by Marx between political economy and  
the theory of law, especially that of John Austin,  
going through the criticism of the method of  
political economy based on the Grundrisse:  
foundations of the critique of political economy,  
as well as the differentiation between political  
economy, vulgar economics and apologetics as  
exposed in previous works by the author of  
Capital. What Maine calls the “method” of  
analytical jurists is, to Marx, a formalistic  
dogmatism common to legal theory, which  
brings distorted elements of political economy  
in a completely apologetic way. The theme  
permeates discussions that accompanied Marx  
throughout his life, such as the relationship  
between the bourgeoisie and scientific  
production, as well as the role of legal theory in  
defending bourgeois interests. Furthermore, we  
believe that a dedicated reading of the  
Ethnological notebooks has a lot to offer for  
Marxist thought, and our article provides some  
specific contributions in this sense.  
Palavras-chave: Karl Marx; método; juristas  
analíticos; teoria do direito; economia política.  
Keywords: Karl Marx ; method ; analytical jurists;  
theory of law ; political economy.  
*
Mestranda em direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). E-mail:  
Verinotio  
ISSN 1981 - 061X v. 29 n. 2 jul.-dez., 2024  
nova fase  
 
Marx e a crítica ao assim chamado “método” dos juristas analíticos  
Introdução  
No presente artigo, trataremos da crítica feita por Karl Marx ao assim chamado  
método dos juristas analíticos em seus Cadernos etnológicos, mais especificamente na  
parte em que traça comentários à obra Lectures on the early history of institutions  
(1875) de Henry Sumner Maine. Os Cadernos etnológicos de Marx são um conjunto  
de notas deixadas por Marx escritas entre os anos 1879 a 1882, que foram  
compiladas e editadas por Lawrence Krader quase um século depois, sendo publicadas  
somente em 1972. No recorte feito por Krader, estão expostos os comentários, além  
de Maine, acerca dos autores Lewis Henry Morgan, John Budd Phear e John Lubbock.  
Não obstante, nos documentos originais consta um material muito mais  
abrangente, incluindo comentários sobre os autores Maksim Kovalévski, o qual foi  
publicado por Krader separadamente em 1975 (KRADER, 1975, pp. 343-412), e  
outros que ainda não vieram à público, acerca de Karl Bücher, Ludwig Friedländer,  
Ludwig Lange, Rudolf Jhering, Rudolf Sohm e J. W. B. Money. A previsão para a  
publicação integral dos comentários marxianos é até 2025 no volume IV/27 da Marx-  
Engels-Gesamtausgabe (Mega) com o título Antropologia, sociedades não-ocidentais,  
gênero e história da propriedade da terra1.  
Henry Sumner Maine (1822-1888) foi um jurista inglês muito notório na Europa  
do século XIX. Ao longo de sua vida, ocupou os cargos de professor da Universidade  
de Cambridge e da Universidade de Oxford, bem como de conselheiro do governador-  
geral da Índia no período de 1863 a 1869. Maine teve uma grande importância na  
formação do código de leis colonial do Raj britânico, e até hoje é muito retomado ao  
lado dos juristas analíticos John Austin e Jeremy Bentham como um dos expoentes da  
teoria do direito anglosaxã. Sua obra mais renomada é Ancient Law (1861). As  
Lectures on the early history of institutions (1875) comentadas por Marx tratam-se de  
aulas lecionadas pelo jurista nas quais expõe alguns desdobramentos de suas teses  
desenvolvidas em Ancient Law.  
Os Cadernos de Marx são um texto muito negligenciado pela tradição marxista  
ao longo dos anos, especialmente no âmbito da crítica ao direito. Isso pode ser  
entendido como consequência de sua publicação tardia, quando alguns outros textos  
já haviam sido consolidados como cânones do pensamento marxiano, além da  
dificuldade da leitura em razão de seu formato, e por se tratarem de meras anotações  
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Ana Carolina Marra de Andrade  
cuja finalidade original era um estudo pessoal, não sendo destinadas à publicação. No  
entanto, acreditamos que muitas contribuições relevantes podem ser extraídas de uma  
análise atenta dos textos, sobretudo entendendo-os não como um texto a parte, mas  
inserido dentro de uma gama de produções elaboradas ao longo de toda a vida do  
autor. Nesse sentido, ainda que o nosso foco central seja os Cadernos, traremos  
também outros textos de Marx, bem como de alguns comentadores, para auxiliar na  
compreensão de determinados temas mencionados ao longo da exposição.  
Diante disso, é evidente que nosso objetivo não é fazer uma análise detalhada  
do pensamento de Maine, mas das contribuições concretas do próprio Marx nestes  
excertos. Nosso interesse primordial é a crítica marxiana ao assim chamado “método”  
dos juristas analíticos, a qual pressupõe uma crítica à teoria do direito, mais  
especificamente a defendida por Austin, Bentham e, até certo ponto, pelo próprio  
Maine. Conforme veremos ao longo da exposição, não se trata de um método  
propriamente dito, razão pela qual optamos por ressaltar o caráter de assim chamado,  
na medida em que Maine o chama de método.  
Antes de passar para a análise do texto propriamente dito, cabe fazer algumas  
considerações acerca da tradução e do formato das citações que iremos utilizar. Em  
suas notas, Marx sinaliza boa parte de suas intervenções originais, utilizando  
indiscriminadamente parênteses “()” ou colchetes “[]” para indicá-las. No entanto, para  
facilitar a leitura, em nosso trabalho seguiremos a padronização feita por Ripalda na  
edição espanhola com tradução para o castelhano, na qual todas as interpolações  
marxianas são colocadas com colchetes e os parênteses são reservados para frases do  
texto que Marx comenta. Também seguindo a organização de Ripalda, as interpolações  
entre colchetes e colchetes angulares (símbolos de maior/menor que) “<[> <]>”  
indicam uma intervenção de Marx que ele próprio não sinalizou, mas que os editores  
decidiram ressaltar para que não passasse despercebida.  
Na falta de uma edição com tradução para o português, faremos uma tradução  
livre das citações diretas baseada sobretudo na tradução de Ripalda, do castelhano.  
Não obstante, colocaremos em rodapé após todas as citações o trecho em castelhano,  
bem como o original, no qual Marx alterna entre inglês e alemão.  
Maine e os juristas analíticos  
Para trabalhar a crítica de Marx ao chamado método dos juristas analíticos,  
trataremos, primeiramente, de uma visão mais geral da crítica aos juristas analíticos  
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Marx e a crítica ao assim chamado “método” dos juristas analíticos  
conforme exposta em seus Cadernos etnológicos, de modo a colocar o contexto no  
qual a crítica ao método se coloca. Nesse sentido, não abordaremos de todos os  
aspectos referentes à crítica aos juristas analíticos, mas àqueles que culminam na crítica  
ao método. Retomaremos, também, alguns outros textos do autor para auxiliar na  
interpretação do trecho em que ela aparece, sem, é claro, extrapolar os limites  
objetivos do próprio texto que consiste em nosso objeto de análise.  
Desse modo, conforme exposto, nosso objeto central são os Cadernos  
etnológicos, em especial a parte reservada para os comentários acerca da obra  
Lectures on the early history of institutions, do jurista inglês Henry Sumner Maine, na  
qual está contida a crítica aos juristas analíticos em geral. As elaborações teóricas de  
Maine detêm grande influência dessa escola de pensamento. Como o próprio Marx  
ressalta, no cap. XII de suas Lectures ele chega a expressar que “a Inglaterra possui o  
privilégio dos <<juristas analíticos>>, como lá os chamam, cujos representantes mais  
ilustres são Jeremy Bentham e John Austin” (MARX, 1988, p. 287 – tradução livre)2.  
Para Maine, o grande descobrimento de Austin é sua teoria da soberania. Escreve  
Marx, expondo as ideias de Maine sobre “o imenso” John Austin, referindo-se  
ironicamente a sua relevância na obra do autor das Lectures:  
<<Se (diz <[> o imenso John <]>Austin) um determinado superior  
humano que não está em estado de obediência em relação a outro  
superior como ele, é habitualmente obedecido por toda uma  
sociedade, este determinado superior é soberano nessa sociedade e  
a sociedade, incluindo o superior, é uma sociedade política  
independente.>> <<Os restantes membros da sociedade são súditos  
deste superior ou, igualmente, os outros membros da sociedade  
dependem deste superior específico. A posição dos restantes  
membros da sociedade em relação a este determinado superior é um  
estado de sujeição ou um estado de dependência. A relação mútua  
que existe entre aquele superior e eles pode ser chamada de relação  
de soberano e súdito ou relação de soberania e submissão>> (Citado  
em Maine, pp. 348 349 <: 312, 313>). O <<superior humano  
determinado>>, ou soberano, é <<um soberano individual ou  
colegiado. (esta frase para uma pessoa individual ou um grupo é <de  
acordo com Maine> outra invenção de Austin) (349 <: 313>). (MARX,  
1988, pp. 287-8 tradução livre)3  
2 lnglaterra posee el privilegio de los <<juristas analíticos>>, como allí les llaman, cuyos representantes  
más ilustres <son> Jeremy Bentham y John Austin (343 <: 308>). (MARX, 1988, p. 287)  
dass England d. Privileg d. s. dort g. “Analytical Jurists" besitzt, wovon d. bedeutendsten Jeremy  
Bentham u. John Austin. (343). (MARX, 1974, p. 327)  
3
<<Si (dice <[> el inmenso John <]>Austin) un superior humano determinado que no se halla en un  
estado de obediencia respecto de otro superior como él, es habitualmente obedecido por el conjunto  
de una sociedad, este superior determinado es soberano en esa sociedad y la sociedad, incluido el  
superior, es una sociedad política independiente.>> <<Son súbditos de este superior los restantes  
miembros de la sociedad o, lo que es igual, los demás miembros de la sociedad dependen de este  
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Ou seja, a soberania estaria colocada, aqui, como um fato que ocorre quando  
um indivíduo ou um coletivo de indivíduos que não costuma(m) obedecer a nenhum  
outro é(são) habitualmente obedecido(s) por um outro grupo de indivíduos, que estão  
em estado de dependência. O(s) soberano(s) é(são) um ser(es) humano(s) superior(es)  
aos demais, e a junção soberano e súditos conforma uma sociedade política  
independente. O soberano é determinado visto que os súditos devem obedecer  
unicamente a ele (ou ao grupo) e a nenhum outro. Sendo mais de um, os soberanos  
somente podem se constituir enquanto grupo se forem capazes de atuar de forma  
corporativa ou colegiada.  
A concepção austiniana de soberania é de fato um dos corolários de sua  
elaboração teórica, e está diretamente relacionada com sua noção de direito positivo.  
Não nos deteremos, no presente artigo, em explicitar todos seus elementos, mas em  
ressaltar aqueles que são destacados por Maine conforme ele o concebeu. Segundo  
Marx:  
O senhor Maine continua explicando assim as opiniões de Austin: Se  
a comunidade, violenta ou voluntariamente, divide-se em vários  
fragmentos distintos, no momento em que cada um recupere seu  
equilíbrio talvez depois de um intervalo de anarquiahaverá um  
soberano, que poderá ser descoberto, em cada uma das novas frações  
independentes (H9, 350 <: 313>). Seja o soberano uma pessoa ou  
um grupo de pessoas, a característica comum a todas as formas de  
soberania é que possui um poder irresistível, que não tem necessidade  
absoluta de exercer, mas que pode ser exercido. Se o soberano é uma  
única pessoa, chama-se, segundo Austin, monarca; se um pequeno  
grupo, oligarquia; se um grupo considerável, aristocracia; se <o grupo  
é> muito amplo e numeroso, democracia. [...] A característica comum  
a todas as formas de soberania é o poder (mas não necessariamente  
a vontade) de exercer uma coação ilimitada sobre os súditos ou  
cosúditos (350 <: 314>). Onde não se pode discernir um soberano  
deste tipo, anarquia (351 <: 314>). Determinar seu caráter (do  
superior determinado. La posición de los restantes miembros de la sociedad respecto de este  
determinado superior es un estado de sujeción o estado de dependencia. La relación mutua que existe  
entre ese superior y ellos puede llamarse relación de soberano y súbdito o relación de soberanía y  
sumisión>> (Citado en Maine, pp. 348 349 <: 312, 313>). El <<superior humano determinado>>, o  
soberano, es <<un soberano individual o colegial (esta frase para una persona individual o un grupo  
es <según Maine> otro invento de Austin) (349 <: 313>). (MARX, 1988, pp. 287-8)  
“If (says the immense John Austin) a determinate human superior, not in the habit of obedience to a like  
superior, receive habitual obedience from the bulk of a given society, that determinate superior is  
Sovereign in that society, and the society, including the superior, is a society political and independent.”  
“To that superior the other members of the society are subject; or on that determinate superior the  
other members of the society are dependent. The position of its other members towards that  
determinate superior is a state of subjection or a state of dependence. The mutual relation which subsists  
between that superior and them, may be styled the relation of Sovereign and Subject, or the Relation of  
Sovereignty and Subjection” (citirt bei Maine p. 348, 349) D. “determinate human superior” so der  
Sovereign is “an individual or a collegiate Sovereign” (diese Phrase für single person or group auch eine  
Erfindg d. Austin) (349). (MARX, 1974, pp. 327-8)  
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soberano) [em uma sociedade específica] é sempre uma questão de  
fato, nunca uma questão de direito ou de moral (loc.dr.). (MARX, 1988,  
p. 288 tradução livre, grifos nossos)4  
Um estado de anarquia é um estado, para Austin, de inexistência de soberano.  
Ela pode ocorrer, por exemplo, no momento em que uma sociedade se divide, no qual,  
em razão de um desequilíbrio, passa-se por um período de anarquia momentâneo, de  
modo que ao retornar o equilíbrio poderão ser identificados diferentes soberanos para  
cada fração dessa sociedade, tornando-se um conjunto de sociedades independentes.  
Austin, então, explica as diferentes formas de governo, ou, como as chama, formas de  
soberania, de modo quantitativo: “Se o soberano é uma única pessoa, chama-se,  
segundo Austin, monarca; se um pequeno grupo, oligarquia; se um grupo considerável,  
aristocracia; se <o grupo é> muito amplo e numeroso, democracia”. Ademais, para  
ele, determinar o soberano é uma questão de fato, não de direito ou de moral, até  
porque o direito seria posterior à soberania. A soberania que dá legitimidade ao  
direito, e não o contrário; as leis devem ser determinadas pelo soberano para serem  
válidas, e somente o direito positivo atende a este critério. As leis positivas tratam-se,  
então, de ordens advindas do soberano.  
Consequentemente, duas características são essenciais ao soberano: ser  
obedecido pela maioria da comunidade e ser imune à fiscalização de qualquer outro  
ser humano. O próprio Maine admite que o essencial das ideias de Austin e de  
4
El señor Maine sigue explicando así las opiniones de Austin: Si la comunidad, violenta o  
voluntariamente, se divide en varios fragmentos distintos, en el momento en que cada uno recupere su  
equilibrio quizá después de un intervalo de anarquíahabrá un soberano y será reconocible en cada  
una de las nuevas fracciones independientes (H9, 350 <: 313>). Sea el soberano una persona o un  
grupo de personas, la característica común a todas las formas de soberanía es que se halla en posesión  
de un poder irresistible, que no hay necesidad absoluta de ejercer, pero que puede ser ejercido. Si el  
soberano es una persona única, se llama según Austin monarca; si un pequeño grupo, oligarquía; si un  
grupo considerable, aristocracia; si <el grupo es> muy amplio y numeroso, democracia. [...] La común  
característica de todas las formas de soberanía es el poder (pero no necesariamente voluntad) de ejercer  
una coacción ilimitada sobre los súbditos o cosúbditos (350 <: 314>). Donde no se puede discernir un  
soberano de este tipo, anarquía (351 <: 314>). Determinar su carácter (del soberano) [en una sociedad  
precisa] es siempre una cuestión de hecho ... nunca una cuestión de derecho o de moral (Ioc. dr.). (MARX,  
1988, p. 288)  
Herr Maine erklärt d. Aussichten d. Austin weiter dahin: If the community be violently or voluntarily  
divided into a number of separate fragments, then, as soon as each fragment has settled down (perhaps  
after an interval of anarchy) into a state of equilibrium, the Sovereign will exist and will be discoverable  
in each of the now independent portions. (349, 350) Das gemeinsame Charaktermal aller shapes of dr  
Sove<r>eignty - whether the Sovereign a person or a combination of persons - ist, dass er has* the  
possession of irresistible force, not necessarily exerted but capable of being exerted. Ist d. Sovereign a  
single person, so nennt ihn Austin a Monarch; if a small group - Oligarchy; if a group of considerable  
dimensions, an Aristocracy; if very large and numerous, a Democracy. [...] Was alle forms of Sovereignty  
gemein haben is the power (but not necessarily the will) to put compulsion without limit on subjects or  
fellow-subjects. (350) Wo kein solcher sovereign erkennbar - Anarchie. (351) The question of  
determining his (the Sovereign’s) character [in a given society] is always a question of fact... never a  
question of law or morals. (I.c.). (MARX, 1974, p. 328)  
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Bentham (na medida em que coincidem com Austin) são retiradas de Hobbes:  
O soberano deve ser habitualmente obedecido pela maioria da  
comunidade (353 <:316>). Outra característica dele: sua imunidade à  
inspeção de qualquer outro superior humano (loc. cit. <: 317>).  
(Como o próprio Maine confessa, o essencial dessas ideias de Austin  
e, na medida em que coincidem com ele, de Bentham <vem> de  
Hobbes Leviatã, cap. De cive, publicado pela primeira vez em latim  
nos Elementa Philosophiae ). (MARX, 1988, p. 288 tradução livre)5  
Apesar do reconhecimento de sua influência direta, o autor das Lectures  
entende que a teoria de Hobbes era limitada por sua perspectiva política, a de Austin  
é engrandecida por seu propósito exclusivamente científico. Marx ironiza essa  
constatação:  
Mas Maine diz: Hobbes tinha um propósito político; o propósito de  
Austin era <<estritamente científico>> (355 <: 317 ss.>). [Científico!  
Seja qual for o significado que esta palavra pode ter para os estúpidos  
juristas britânicos, entre os quais são consideradas ciência a  
ultrapassada classificação, a definição, etc. Cf. para o resto, 1º  
Maquiavel e 2º Linguet.] Além disso, Hobbes refletiu sobre as origens  
do Estado (governo e soberania); este problema não existe para o  
jurista Austin; para ele esse fato existe de certa forma a priori. Isso é  
o que Maine diz na. p. 356 <: 318 e segs.>. <[>Nem o infeliz do  
Maine tem ideia de que onde existe um Estado (depois da comunidade  
primitiva, etc.), isto é, uma sociedade politicamente organizada, o  
Estado não é de forma alguma o príncipe, apenas o parece <]>.  
(MARX, 1988, pp. 288-9 tradução livre, grifos nossos)6  
5
El soberano debe ser obedecido habitualmente por el grueso de la comunidad (353 <:316>). Otra  
característica del mismo: su inmunidad a la fiscalización por cualquier otro superior humano (loc. cit. <:  
317>).  
(Como confiesa el mismo Maine, lo esencial de estas ideas de Austin y, en cuanto coinciden con él, de  
Bentham <proviene> de Hobbes Leviatán, cap. De cive, publicado por primera vez en latín en los  
Elementa Philosophiae ). (MARX, 1988, p. 288)  
The Sovereign must receive an habitual obedience from the bulk of the community. (353) Ferneres  
characteristic desselben: is immunity from the control of every other human superior. (I.c.)  
[Dies d. Grundtext nach, wie Maine selbst zugiebt, v. Austin, wie so weit damit identisch, von Bentham  
aus Hobbes (Leviathan: Ch. De Cive, first published in Latin, in the Elementa Philosophiae). (MARX, 1974,  
p. 328)  
6
Pero Maine dice: Hobbes tenía un propósito político; el propósito de Austin era <<estrictamente  
científico>> (355 <: 317 ss.>). [¡Científico! Ya será en el significado que puede tener esta palabra para  
los estúpidos juristas británicos, entre los cuales se tiene por ciencia la anticuada clasificación, la  
definición, etc. Cf. por lo demás 1º Maquiavelo y 2.° Linguet.] Además Hobbes razonaba sobre los  
orígenes del Estado (gobierno y soberanía); este problema no existe para el jurista Austin; para él ese  
hecho existe en cierto modo a priori. Es lo que dice Maine en la. p.356 <: 318 ss.>. <[>Tampoco el  
infeliz de Maine tiene ni idea de que allí donde hay Estado (después de la comunidad primitiva. etc.), es  
decir una sociedad organizada políticamente, el Estado no es de ningún modo el príncipe, sólo lo parece.  
<]>. (MARX, 1988, pp. 288-9)  
Aber sagt Maine: Hobbes’ Object war politisch; das des Austin “strictly scientific” (355) [Scientific! doch  
nur in d. Bdtg, dies dies Wort im Kopf of blockheadish British lawyers haben kann, wo altmodische  
Classification, Definition etc als scientific gilt. Vgl. übrigens I) Machiavelli u. 2) Linguet.] Ferner: Hobbes  
will origin of Staat (Government u. Sovereignty) ergründen; dies Problem existirt für lawyer Austin nicht;  
für ihn dies fact gewisser- massen a priori vorhanden. Dies sagt Maine p. 356. D. unglückliche Maine  
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Desse modo, Marx ridiculariza a concepção de ciência trazida por Maine com  
base em Austin e Bentham, associando-a “a ultrapassada classificação, a definição  
etc.”. Hobbes seria, ainda, superior aos juristas analíticos, ao menos refletindo sobre  
as origens do Estado, do governo e da soberania, enquanto os demais se escondem  
em um suposto propósito científico, mas o tomam como algo dado. Logo em seguida,  
veremos que o critério de cientificidade é relacionado com a existência de um método,  
que se trata, em geral, de um conjunto de dogmas e de suas consequências.  
Vale ressaltar que Marx, com base nas afirmações das próprias Lectures, expõe  
que Maine, assim como Austin, toma a origem do estado como um fato que “existe de  
certa forma a priori”. O “de certa forma” não pode ser desconsiderado. Ambos tratam,  
ainda que brevemente, dessa origem, ainda que considerem que tal reflexão não seja  
de grande relevância. O próprio Maine expõe:  
Outra diferença considerável é esta. Hobbes, é bem sabido, especulou  
sobre a origem do Governo e da Soberania. É o único fato que  
algumas pessoas parecem ter aprendido sobre ele, e parecem pensar  
que sua filosofia é suficientemente condenada por isso. Mas Austin  
mal entra nisso investigação; e de fato ele ocasionalmente, embora  
talvez inadvertidamente, usa uma linguagem que quase parece  
implicar que a Soberania e as concepções dela dependentes têm uma  
existência a priori. Agora, neste assunto eu mesmo defendo que o  
método de Hobbes estava correto. É verdade que nada pode ser mais  
inútil em si mesmo do que a explicação conjectural de Hobbes sobre  
a origem da sociedade e do governo. A humanidade, afirma ele, estava  
originalmente em estado de guerra. Eles então fizeram um pacto sob  
o qual cada homem abandonou seus poderes de agressão, e o  
resultado, era a Soberania, e através da Soberania a lei, a paz e a  
ordem. A teoria está aberta a todo tipo de objeção. Não há evidência  
de qualquer fase da suposta história, e o pouco que sabemos do  
homem primitivo contradiz isso. [...] Mas ainda assim eu acho que  
Hobbes agiu corretamente ao dirigir o problema a si mesmo, embora  
ele tenha feito pouco para resolvê-lo. O dever de perguntar, se não  
como surgiu a Soberania, em todo o caso, por que fases passou, é,  
para mim, indispensável. Somente assim podemos assegurar em que  
grau os resultados da análise austiniana coincidem com os fatos.  
(MAINE, 1914, pp. 356-7 tradução livre)7  
selbst hat keine Ahnung davon, dass da wo Staaten existiren (after the primitive Communities etc) i.e.  
eine politisch organisirte Gesellschaft, der Staat keineswegs d. Prinz ist; er scheint nur só (MARX, 1974,  
pp. 328-9).  
7
Another considerable difference is this. Hobbes, it is well known, speculated on the origin of  
Government and Sovereignty. It is the one fact which some persons seem to have learned about him,  
and they appear to think his philosophy sufficiently condemned by it. But Austin barely enters on this  
enquiry; and indeed he occasionally, though perhaps inadvertently, uses language which almost seems  
to imply that Sovereignty and the conceptions dependent on it have an a priori existence. Now in this  
matter I myself hold that the method of Hobbes was correct. It is true that nothing can be more worthless  
in itself than Hobbes's conjectural account of the origin of society and government. Mankind, he asserts,  
were originally in a state of war. They then made a compact under which every man abandoned his  
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Ou seja, Maine coloca que as reflexões de Hobbes sobre a origem do estado  
são meras especulações, de modo que Austin teria o mérito de, ao não se ocupar  
demasiadamente com este tópico, não cair em conjecturas fantasiosas. Assim, tomando  
o soberano como uma existência até certo ponto apriorística, o jurista analítico  
conseguiria fornecer à sua teoria um critério maior de cientificidade. Para Hobbes, em  
linhas gerais, o estado de guerra de todos contra todos é a condição natural do  
homem, e somente através de um contrato social com transmissão mútua de direitos  
entre uma multidão forma-se um corpo político e é criada a figura do soberano,  
excluído do contrato, do qual os demais indivíduos são súditos. O soberano, então,  
age em nome do povo, sendo dotado de plenos poderes para tal.  
Maine, ainda que defenda que o método geral de Hobbes esteja correto, critica  
a compreensão do autor de Leviatã sobre a origem do estado, alegando que o dito  
estado de guerra nunca existiu na realidade, e a pouca evidência sobre as sociedades  
primitivas que surgiu desde então estaria em desacordo com essa compreensão. Não  
cabe a nós, no presente artigo, entrar em detalhes acerca interpretação dada por Maine  
a Hobbes, mas vale pontuar que é questionável a tese de que, o contratualista, ao se  
referir ao estado de guerra, estaria tratando de uma época necessariamente existente  
da história humana8.  
Não obstante, ao mesmo tempo que Maine crítica o caráter a-histórico e  
powers of aggression, and the result, was Sovereignty, and through Sovereignty law, peace, and order.  
The theory is open to every sort of objection. There is no evidence of any stage of the supposed history,  
and the little we know of primitive man contradicts it. [...] But still I think that Hobbes did correctly in  
addressing himself to the problem, though he did little to solve it. The duty of enquiring, if not how  
Sovereignty arose, at all events through what stages it has passed, is in my judgment indispensable. It  
is only thus that we can assure ourselves in what degree the results of the Austinian analysis tally with  
facts. (MAINE, 1914, pp. 356-7)  
8
Para Maine, o conhecimento sobre as sociedades primitivas de sua época direciona para a ideia de  
que Hobbes estava errado ao falar sobre a origem do estado a partir do estado de natureza. No entanto,  
Hobbes não identifica o estado de natureza como um estágio histórico, mas como um exercício da  
razão. Para Renato Janine Ribeiro (2001), Maine comete um grande erro ao inferir que o homem natural  
de Hobbes é um “selvagem”: “Ao iniciar uma interpretação sociológica do direito, na metade do século  
XIX, Sir Henry Maine por exemplo criticou-os asperamente: seria impossível (dizia) selvagens que  
nunca tiveram contato social dominarem a tal ponto a linguagem, conhecerem uma noção jurídica tão  
abstrata quanto a de contrato, para que pudessem se reunir nas clareiras das florestas e fazerem um  
pacto social. Na verdade (continuava), o contrato só é possível quando há noções que nascem de uma  
longa experiência da vida em sociedade” (RIBEIRO, 2001, p. 53). Ribeiro explica que “Raro, ou nenhum,  
contratualista pensou que selvagens isolados se juntam numa clareira para fazer um simulacro de  
constituinte. [...] Para Hobbes, como para a maior parte dos autores de antes do século XVIII, não existe  
a história entendida como transformando os homens. Estes não mudam”, de modo que o homem natural  
hobbesiano “é o mesmo homem que vive em sociedade” (RIBEIRO, 2001, p. 54). Logo, “o que Hobbes  
pede é um exame de consciência: ‘conhece-te a ti mesmo’” (RIBEIRO, 2001, p. 57), ou seja, o exercício  
de entender como seria um homem em seu estado de natureza é, para Hobbes, olhar para nós mesmos,  
e não para um outro momento histórico ou para indivíduo de outra sociedade, como entende Maine.  
Verinotio  
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nova fase  
 
Marx e a crítica ao assim chamado “método” dos juristas analíticos  
especulativo das considerações hobbesianas sobre a origem do soberano, ele,  
trazendo como base o próprio Austin e o elogiando por tomar o soberano como uma  
existência até certo ponto a priori, não deixa completamente de lado algum tipo de  
reflexão sobre a origem do estado. Na verdade, toma-o como sinônimo de uma  
aglomeração de patriarcas, vejamos a opinião de Maine, a partir da citação feita por  
Marx:  
Austin admite, além disso, a possibilidade teórica de um estado de  
natureza. Não lhe atribui tanta importância como Hobbes e outros;  
mas reconhece sua existência onde vários homens ou vários grupos,  
muito pouco numerosos para serem um conjunto político, não estejam  
submetidos a uma autoridade em comum ou habitualmente em  
exercício (378 <: 339>).  
Austin diz, p. 237, tomo I da 3ª edição:  
“Suponhamos que uma única família de selvagens viva absolutamente  
alienada de qualquer outra comunidade. E suponhamos que o pai,  
chefe dessa família isolada, receba a obediência habitual da mãe e dos  
filhos. Ora, como não é um membro de outra comunidade maior, a  
sociedade formada pelos pais e filhos é claramente uma sociedade  
independente e, como o resto de seus membros obedece  
habitualmente ao seu chefe, essa sociedade independente formaria  
uma sociedade política, caso o número de seus membros não fosse  
extremamente pequeno. Mas como o número de seus membros é  
extremamente pequeno, seria, creio eu, considerada uma sociedade  
em estado de natureza”9; isto é, uma sociedade composta por pessoas  
que não estão em estado de sujeição. Sem a aplicação dos termos,  
que teriam um toque de ridículo, dificilmente poderíamos qualificar a  
sociedade de sociedade política e independente, o pai e chefe  
imperativos monarca ou soberano, ou a mãe obediente e filhos  
súditos”. [muito profundo!]  
[Até aqui tudo vai muito bem para o Maine]: <<pois como diza  
forma de autoridade que concede, a do patriarca ou pater familias  
sobre sua família, é, ao menos de acordo com uma teoría moderna [de  
Maine e companhia] o elemento ou germe a partir do qual se  
desenvolve gradualmente todo poder permanente do homem sobre o  
homem>>. (MARX, 1988, pp. 292-3 tradução livre)10  
9 Ver Austin (1995, p. 177).  
10  
Austin admite, además, la posibilidad teórica de un estado de naturaleza. No le atribuye tanta  
importancia como Hobbes y otros; pero reconoce su existencia dondequiera que varios hombres o  
varios grupos, muy poco numerosos para ser políticos, no se han puesto todavía bajo una autoridad  
común o habitualmente en ejercicio (378 <: 339>).  
Austin dice, p. 237, tomo I de la 3ª edición:  
“Supongamos que una sola familia de salvajes vive en un aislamiento absoluto de cualquier otra  
comunidad. y que el padre, jefe de esta familia aislada, sea habitualmente obedecido por la madre y los  
hijos. Puesto que no forma parte de otra comunidad mayor, la sociedad formada por los padres y los  
hijos es evidentemente una sociedad independiente; y, puesto que todos sus miembros obedecen  
habitualmente al jefe. esta sociedad independiente constituiría una sociedad política, si el número de  
sus miembros no fuera sumamente reducido. Pero puesto que el número de sus miembros es  
sumamente limitado, yo creo que se la debería considerar como una sociedad en el estado de naturaleza,  
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Ana Carolina Marra de Andrade  
Desse modo, aqui Maine ressalta que, ainda que a origem do estado não tenha  
uma importância muito grande em suas reflexões, Austin admite a possibilidade teórica  
da existência de um estado de natureza, única hipótese em que a inexistência de um  
soberano não seria a anarquia, de cunho transicional. Este estado existiria onde “vários  
homens ou vários grupos, muito pouco numerosos para serem um conjunto político,  
não estejam submetidos a uma autoridade em comum ou habitualmente em exercício”.  
Ele se caracterizaria como um conjunto de famílias chefiadas pelo pai, dada a  
submissão natural da mulher e dos filhos ao homem. Nele, não há soberano e não há  
estado de sujeição. Se o grupo se expandisse numericamente, ou seja, se mais famílias  
se juntassem, da subordinação familiar original seria naturalmente criada a  
subordinação ao poder governante, de modo que a família é o “germe a partir do qual  
se desenvolve gradualmente todo poder permanente do homem sobre o homem”.  
Logo, não obstante a crítica feita por Maine pelo suposto caráter especulativo  
da teoria do estado de natureza hobbesiano, ele, baseado em Austin, adota uma  
concepção de estado de natureza ainda mais ilusória na medida em que é uma mera  
derivação da sujeição familiar natural. Austin e Maine fazem uma “robinsonada”11 para  
esto es, como una sociedad compuesta de personas que no se hallan en el estado de sumisión. Pese a  
que la aplicación de estos términos toca de algún modo en lo ridículo, sólo así podemos llamar a esta  
sociedad una sociedad política e independiente, al padre y jefe que manda, monarca o soberano, y a la  
madre e hijos que obedecen, súbditos” [¡Muy profundo!]  
Hasta aquí todo le viene muy bien a Maine, <<pues como dicela forma de autoridad que concede,  
la del patriarca o paterfamilias sobre su familia, es, al menos según una teoría moderna [de Maine y  
compañía] el elemento o germen a partir del qual se ha desarollado gradualmente todo poder  
permanente del hombre sobre el  
hombre>>. (MARX, 1988, pp. 292-3)  
Austin further admits the theoretical possibility of a state of nature; giebt ihm nicht d. Wichtigkeit wie  
Hobbes u. andre, aber allows his existence, wherever a number of men, or of groups not numerous  
enough to be political, have not as yet been brought under any common or habitually acting community.  
(378)  
Austin sagt, p. 237, 1st vol., 3d ed.:  
“Let us suppose that a single family of savages lives in absolute estrangement from every other  
community. And let us suppose that the father, the chief of this isolated family, receives habitual  
obedience from the mother and children. Now , since it is not a limb of another and larger community,  
the society formed by the parents and children, is clearly an independent society, and, since the rest of  
its members habitually obey its chief, this independent society would form a society political, in case the  
number of its members were not extremely minute. But since the number of its members is extremely  
minute, it would, I believe, be esteemed a society in a state of nature” ; that is, a society consisting of  
persons not in a state of subjection. Without an application of the terms, which would somewhat smack  
of the ridiculous, we could hardly style the society a society political and independent, the imperative  
father and chief a monarch or sovereign, or the obedient mother and children subjects” Dies so far  
Wasser auf d. Mühle Maine’s, “since, wie er sagt, the form of authority about which it is made, the  
authority of the Patriarch or Paterfamilias over his family, is, at least according to one (Maine’s u.  
consorts) modern theory, the element or germ out of which all permanent power of man over man has  
been gradually developed” (MARX, 1974, p. 333).  
11 Em linhas gerais, entendemos “robinsonadas”, expressão utilizada pelo próprio Marx em um contexto  
análogo (cf. MARX, 2011, p. 54), como o procedimento de transpor elementos da sociedade civil-  
burguesa até um mundo místico e abstrato. No caso, esse procedimento é feito com a família inglesa, a  
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Marx e a crítica ao assim chamado “método” dos juristas analíticos  
explicar a origem do Estado, e então tomam o problema como resolvido, partindo para  
a reflexão sobre o soberano. A “robinsonada” se trata justamente da transposição da  
família inglesa até uma mística ilha remota que deveria representar as sociedades  
chamadas de “primitivas” (sem estado), mas são apenas a própria sociedade inglesa  
naturalizada. Austin e Maine não percebem que em sua ilha imaginária não se encontra  
ninguém além de uma transposição deles mesmos. Aí reside a suposta superioridade  
dos juristas analíticos diante de Hobbes: na compreensão de que o Estado surge da  
aglomeração de patriarcas. Por esse motivo, como vimos, a teoria da soberania é  
colocada até certo ponto (mas não completamente) de modo apriorístico, dado que o  
soberano é tomado como um ponto de partida, mas há essa breve consideração acerca  
de sua origem.  
Feitas essas considerações acerca das curtas reflexões de Austin e Maine sobre  
a origem do Estado, e portanto do soberano (que, para eles, são sinônimos), voltemos  
à análise da teoria da soberania. Maine sugere que o soberano não é um mero reflexo  
da sociedade. Ele, de fato, tem o papel de direcionar as forças da sociedade, mas não  
o faz por livre e espontânea vontade (como afirmariam alguns sucessores dos juristas  
analíticos), mas seria afetado por diversas forças, as quais detém um caráter sobretudo  
moral:  
É evidente que uma proposição da qual não são responsáveis os  
grandes <<juristas analíticos>>, mas que alguns dos seus discípulos  
não estão longe de afirmar, não está de acordo com os fatos: que o  
soberano individual ou coletivo põe efetivamente em ação, através do  
livre exercício da sua vontade, a força latente da sociedade.  
<<Múltiplas influências, que por brevidade, chamaremos de morais  
[este <<morais>> mostra quão pouca ideia Maine tem do assunto; na  
medida em que essas influências (acima de tudo econômicas) têm um  
modus <<moral>> existência é sempre sobre um modus derivado,  
secundário e nunca prioritário] constantemente modifica, delimita e  
impede o direcionamento efetivo das forças da sociedade pelo  
soberano (359 <: 321>). A teoria da soberania de Austin de fato é  
resultado de uma abstração. (MARX, 1988, p. 289 tradução livre,  
grifos nossos)12  
qual é transportada para uma ilha imaginária e conforma, assim, o estado de natureza. Para entender  
melhor acerca da crítica marxiana às “robinsonadas” feitas por Maine, ver Marra de Andrade (2023).  
12 Desde luego no está de acuerdo con los hechos una proposición de la que no son responsables los  
grandes <<jurisconsultos analíticos>> (Bentham y Austin), pero que algunos de sus discípulos no están  
muy lejos de enunciar, a saber; que el soberano individual o colectivo pone efectivamente en acción,  
mediante el libre ejercicio de su voluntad, la fuerza latente de la sociedad. <<Múltiples influencias, que  
para abreviar, llamaremos morales [este <<morales>> muestra la poca idea que tiene Maine del asunto;  
en cuanto estas influencias (ante todo económicas) poseen un modus <<moral>> existencia se trata  
siempre de un modus derivado, secundario y nunca prioritario] modifican, delimitan e impiden  
constantemente la dirección efectiva de las fuerzas de la sociedad por el soberano (359 <: 321>). La  
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Logo, o que impede o soberano de exercer sua vontade, que coincide com a  
“força latente da sociedade”, são influências morais. Então, Marx explicita que Maine  
não tem ideia de como funciona o estado. Contenta-se não só com explicar a existência  
do estado a partir da teoria da soberania de Austin, mas também entende a política a  
partir da moral. Para Marx, no entanto, o que influencia o rumo da política é, sobretudo,  
a economia, enquanto a moral detém no máximo um caráter secundário. Nosso autor  
escreve uma grande intervenção a esse trecho:  
[Maine ignora algo muito mais profundo: que mesmo a existência  
aparentemente suprema e independente do estado nada mais é do  
que uma aparência, e que o estado em todas as suas formas é uma  
excrescência da sociedade. Mesmo sua aparência não se revela até  
que a sociedade tenha atingido um certo nível de desenvolvimento, e  
desaparece<rá> novamente assim que a sociedade atingir um nível  
até então inalcançado. Primeiro, a individualidade é separada dos  
laços que originalmente não eram despóticos (o oposto de como o  
tolo do Maine os entende), mas antes satisfatórios e agradáveis que  
reinavam no grupo, nas comunidades primitivas; assim a  
individualidade passa a ser destacada unilateralmente. Mas a  
verdadeira natureza desta individualidade não é demonstrada até que  
analisemos <<seus>> interesses. Depois descobrimos que estes  
interesses, por sua vez, são interesses comuns a certos grupos sociais  
e característicos deles, interesses de classe, etc., e todos estes são  
baseados, em última análise, em condições econômicas. O estado se  
constrói sobre estas bases e as pressupõe.] (MARX, 1988, p. 289 –  
tradução livre)13  
teoría de Austin sobre la soberanía es realmente... que resulta de la abstracción. (MARX, 1988, p. 289)  
Die assertion which the great “Analytical Jurists” (Bentham u. Austin) cannot be charged with making,  
but which some of their disciples go very near to hazarding, that the Sovereign person or group actually  
wields the stored-up force of society by an uncontrolled exercise of will, is certainly never in accordance  
with fact. The vast mass of influences, which we may call for shortness moral, [dies “moral” zeigt wie  
wenig Maine von der Sache versteht; so weit diese influences (economical before everything else)  
“moral” modus of existence besitzen, ist dies immer ein abgeleiteter, secundärer modus u. nie das prius]  
perpetually shapes, limits, or forbids the actual direction of the forces of society by its Sovereign. (359)  
The Austinian view of Sovereignty really is - that it is the result of Abstraction. (MARX, 1974, p. 329)  
13  
[Maine ignora algo mucho más profundo: que incluso la existencia, aparentemente suprema e  
independiente, del Estado, no es más que una apariencia, y que el Estado en todas sus fonnas es una  
excrecencia de la sociedad. Incluso su apariencia no se presenta hasta que la sociedad ha alcanzado un  
cierto grado de desarrollo, y desaparece<rá> de nuevo en cuanto la sociedad llegue a un nivel hasta  
ahora inalcanzado. Primero la individualidad se escinde de los vínculos originariamente no despóticos  
(al revés de como los entiende el zoquete de Maine) sino satisfactorios y agradables que reinaban en el  
grupo, en las comunidades primitivas; así llega a destacarse unilateralmente la individualidad. Pero la  
verdadera naturaleza de esta individualidad no se muestra hasta analizar <<sus>> intereses. Entonces  
nos hallamos con que estos intereses a su vez son intereses comunes a ciertos grupos sociales y  
característicos de ellos, intereses de clase, etc., y éstos se basan todos, en última instancia, en  
condiciones económicas. Sobre éstas como sus bases se edifica el Estado y las presupone.] (MARX,  
1988, p. 289)  
[Maine ignores das viel Tiefere: dass d. scheinbare supreme selbständige Existenz des Staats selbst nur  
scheinbar u. dass er in allen seinen Formen eine excrescence of society is; wie seine Erscheinung selbst  
erst auf einer gewissen Stufe der gesellschaftlichen Entwicklung vorkömmt, so verschwindet sie wieder,  
sobld d. Gesellscft eine bisher noch nicht erreichte Stufe erreicht hat. Erst Losreissung der Individualität  
von d. ursprünglich nicht despotischen Fesseln (wie blockhead Maine es versteht), sondern  
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Marx e a crítica ao assim chamado “método” dos juristas analíticos  
Aqui Marx deixa bem claro sua compreensão acerca do estado, absolutamente  
distinta do que pregam Austin e Maine. Novamente nosso autor comenta que o jurista  
britânico somente consegue se manter na dimensão das aparências, e assim acaba  
ocultando as bases reais da política, fundadas no interesse de classe, ou seja,  
interesses comuns a certos grupos de indivíduos baseados em condições econômicas.  
Marx, então, ressalta a relevância de voltar-se para uma análise da história e  
compreender o estado a partir de sua gênese real. O estado pressupõe a existência  
de classes sociais e é construído com base nelas, e acrescentamos de modo a  
assegurar o domínio de uma classe sobre a outra. Ele somente desaparecerá quando  
desaparecerem também a base que o conforma, ou seja, as próprias classes sociais,  
um estado que ainda não foi alcançado.  
Continua, então, sua crítica à teoria da soberania de Austin como aderida por  
Maine:  
<<Austin> chegou em <sua teoria da soberania: afastando todas as  
características e atributos do governo e [!] da sociedade com exceção  
de uma só, e relacionando todas as formas de dominação política por  
sua comum disposição de poder [Este não é o fracasso principal, mas  
sim tomar a dominação política, qualquer que seja a sua forma  
característica e qualquer que seja o conjunto dos seus elementos,  
como algo acima da sociedade, baseado em si mesma.] (MARX, 1988,  
p. 289 tradução livre, grifos nossos)14  
Desse modo, o procedimento utilizado por Austin para chegar até sua teoria da  
soberania é: afastar os atributos que ele considera “não essenciais” de todo governo,  
chegando no que seria comum a todos sua disposição pelo poder. Para Maine,  
Austin fracassou ao não considerar também outros elementos na dominação do  
soberano (sobretudo aqueles de cunho moral). Já Marx considera que o principal  
befriedige(ti)den u. gemüthlichen Banden der Gruppe, der primitiven Gemeinwesen, - damit d. einseitige  
Herausarbeitung der Individualität. Was aber die wahre Natur der letzteren zeigt sich erst wenn wir d.  
Inhalt - d. Interessen dieser “letzteren” analysiren. Wir finden dann, dass diese Interessen selbst wieder  
gewissen gesellscftlichen Gruppen gemeinsame u. sie charakterisirende Interessen, Klasseninteressen  
etc sind, also diese Individualität selbst Klassen- etc Individualität ist u. diese in letzter Instanz haben  
alle ökonomische Bedingungen zur Basis. Auf diesen als Basen baut sich der Staat auf u. setzt sie  
voraus.] (MARX, 1974, p. 329)  
14 <<<Austin> ha llegado a <su teoría de la soberanía> apartando todas las características y atributos  
del gobierno y [!] de la sociedad a excepción de uno solo y relacionando conjuntamente todas las formas  
de dominación política por su común disposición del poder. [No es éste el fallo principal, sino tomar  
dominación política, cualquiera que sea su forma característica y cualquiera que sea el conjunto de sus  
elementos, como algo por encima de la sociedad, basado en sí mismo.] (MARX, 1988, p. 289)  
It is arrived at by throwing aside all the characteristics and attributes of Government and (!) Society  
except one, and by connecting all forms of political superiority together through their common  
possession of force. [Das ist nicht der Grundfehler; dieser ist, dass d. political superiority, whatever its  
peculiar shape, and whatever the ensemble of its elements, is taken als etwas über d. Gesellschaft  
stehendes, auf sich selbst beruhendes.] (MARX, 1974, p. 329)  
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fracasso da teoria da soberania de Austin é tomá-la como algo acima da sociedade,  
de modo que, ao fazê-lo, confunde a aparência do estado com a sua essência. O estado  
aparece como o príncipe, mas não o é. Ao deliberadamente se recusar a compreender  
a gênese real da política, Austin, assim como Maine, acaba preso em sua dimensão  
mais superficial. Por isso, o próprio Maine não consegue reconhecer nem mesmo o  
caráter fundamental da dimensão econômica na política.  
Então, continua o jurista inglês acerca do procedimento utilizado por Austin  
para chegar até sua teoria da soberania:  
Este procedimento desconsidera sempre elementos importantes, por  
vezes de importância capital, porque incluem todos os elementos que  
orientam a ação humana, com exceção da força diretamente aplicada  
ou diretamente percebida. [o melhor armamento já é um elemento  
diretamente baseado no progresso dos meios de produção (que, por  
exemplo, na caça e na pesca são idênticos aos meios de destruição,  
de guerra).] Mas a operação de separá-los para fins de classificação é  
perfeitamente legitimado (359 <: 321 ss.>) Por este procedimento de  
abstração que leva à noção de soberania, deixamos de lado... toda a  
história de cada comunidade... a forma como o resultado foi alcançado  
(360 < :322>). (MARX, 1988, pp. 289-90 tradução livre, grifos  
nossos)15  
Maine está criticando Austin por desconsiderar, além da influência da moral,  
uma série de elementos particulares de cada comunidade para alcançar a soberania,  
com exceção da força diretamente aplicada, a qual reconhece como um elemento geral.  
Porém, o que Maine deixa de considerar, segundo Marx, é que a existência de  
armamento, base material da força diretamente aplicada, já pressupõe um certo nível  
de desenvolvimento dos meios de produção, seja para a subsistência através da caça  
e pesca, ou diretamente para a guerra e destruição. Para Marx, a crítica de Maine a  
Austin é muito superficial. Expõe em seguida:  
15  
Este procedimiento desdeña elementos siempre importantes, algunas veces de importancia capital,  
porque comprenden todos los elementos que dirigen la acción humana a excepción de la fuerza  
directamente aplicada o directamente percibida. [el mejor armamento es ya un elemento directamente  
basado en el progreso de los medios de producción (que, v.g. en la caza y la pesca son idénticos a los  
medios de destrucción, de guerra).] Pero la operación de separarlos con un fin clasificatorio se legitima  
perfectamente (359 <: 321 ss.>) Por este procedimiento de abstracción que conduce a la noción de  
soberanía, dejamos fuera ... la historia entera de cada comunidad... el modo como se ha alcanzado el  
resultado. (360 <:322>) (MARX, 1988, pp. 289-90)  
The elements neglected in the process are always important, sometimes of extreme importance, for they  
consist of all the elements controlling human action except force directly applied or directly  
apprehended. [Z.B. die bessere Bewaffnung ist schon ein direct auf Fortschritt in d. Productionsmitteln  
(diese fallen z.B. bei Jagd u. Fischfang direct zusammen mit Zerstörungsmitteln, Kriegsmitteln)  
berühendes Element.] but the operation of throwing them aside for purposes of classification is ...  
perfectly legitimate.” (359) We reject in the process of abstraction by which the conception of  
Sovereignty is reached ... the entire history of each community ... the mode in which the result has been  
arrived at. (360) (MARX, 1974, p. 330)  
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Marx e a crítica ao assim chamado “método” dos juristas analíticos  
<[>A superficialidade de sua crítica, escondida sob uma fraseologia  
parcialmente boa, começa a se desdobrar na seguinte frase:<]> <<É  
a sua história (da comunidade), toda a soma de seus antecedentes  
históricos, que determina em cada comunidade como o soberano deve  
exercer, ou deixar de exercer, seu irresistível poder coercitivo>> (360  
<: 322>); Mas toda essa história é reduzida no Maine, como ele diz,  
a <<elementos morais>>, já que, seja como jurista ou como ideólogo,  
ele imediatamente continua assim: <<Os juristas analíticos não levam  
em conta todos esses elementos: o enorme amontoado de opiniões,  
sentimentos, crenças, superstições e preconceitos de toda espécie,  
hereditários ou adquiridos, alguns provenientes de instituições, outros  
da própria natureza humana; Parece que, dentro das restrições  
contidas na sua definição de soberania, a rainha e o parlamento do  
nosso país poderiam ordenar que todas as crianças fracas fossem  
condenadas à morte ou estabelecer um sistema de lettres de cachet  
(ordens secretas). (360 <: 322>). [Como os ingleses acabaram de  
estabelecer através de sua coercion bill <lei de repressão> na Irlanda;  
anotado em junho de 1881.] [Um bom exemplo é o meio louco Ivan  
IV. Quando ele se enfurece contra os boiardos e também contra a  
plebe de Moscou, ele tenta e tem que fazê-lo apresentar-se como  
um defensor dos interesses do campesinato.] (MARX, 1988, p. 290 –  
tradução livre, grifos nossos)16  
Logo, a crítica de Maine se resume ao fato de que os juristas analíticos deveriam  
considerar, em sua noção de soberania, “o enorme amontoado de opiniões,  
sentimentos, crenças, superstições e preconceitos de toda espécie, hereditários ou  
16  
<[>La superficialidad de su critica, oculta bajo una fraseología en parte biensonante, comienza a  
desplegarse en la siguiente frase:<]> <<Es su historia (de la comunidad), la suma entera de sus  
antecedentes históricos, la que determina en cada comunidad cómo tiene que ejercer el soberano, o  
dejar de ejercer, su irresistible poder coercitivo>> (360 <: 322>); pero toda esta historia se reduce en  
Maine, como dice, a <<elementos morales., toda vez que, sea como jurista o como ideólogo, continúa  
acto seguido así: <<Los juristas analíticos no tienen nada en cuenta todos estos elementos: el enorme  
montón de opiniones, de sentimientos, de creencias, de supersticiones y de prejuicios de toda especie,  
hereditarios o adquiridos, procedentes unos de las instituciones, otros de la misma naturaleza humana;  
de suene que, ateniéndonos a las restricciones contenidas en su definición de la soberanía, la reina y el  
parlamento de nuestro país podrían ordenar que se diera muerte a todos los niños débiles o establecer  
un sistema de lettres de cachet <órdenes secretas>. (360 <: 322>). [Como los ingleses acaban de  
establecer por su coerción bill <ley de represión> en Irlanda; anotado en junio de 1881.] [Buen ejemplo  
el medio loco lván IV. Cuando <se pone> furioso contra los boyardos, y también contra la plebe  
moscovita, intenta y tiene que hacerlopresentarse como defensor de los intereses del  
campesinado.] (MARX, 1988, p. 290)  
Seine flache Kritik,89 die er unter zum Theil richtig klingender Phraseologie verbirgt, windet sich ab  
erstens in folgender Phrase: “It is its history (des Gemeinwesens), the entire mass of its historical  
antecedents, which in each community determines how the Sovereign shall exercise or forbear from  
exercising his irresistible coercive power,” (p. 360) aber diese ganze Geschichte löst sich bei Maine in  
so called “moral elements” auf, denn er fährt wieder, als either Jurist od. Ideolog unmittelbar fort: “All  
that constitutes this - the whole enormous aggregate of opinions, sentiments, beliefs, superstitions, and  
prejudices of all kinds, hereditary and acquired, some produced by institutions and some by the  
constitution of human nature - is rejected by the Analytical Jurists. And thus it is that, so far as the  
restrictions contained in their definition of Sovereignty are concerned, the Queen and Parliament of our  
own country might direct all weakly children to be put (to) death or establish a system of lettres de  
cachet” (p. 360) (such as the English now have established by their coercion bill in Irld. Dies geschrieben  
Juni 1881)92 [Gutes Beispiel d. halb verrückte Iwan IV. Whd wüthend gegen Bojaren u. auch gegen  
rabble in Moskau, sucht er, u. muss er, sich halten als Vertreter d. Bauerninteressen.] (MARX, 1974, p.  
330)  
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adquiridos, alguns provenientes de instituições, outros da própria natureza humana”,  
ou seja, o que ele define como elementos de cunho moral. Marx então coloca que para  
o jurista inglês a história se reduz a esses elementos morais, o que revela o caráter  
ideológico de sua elaboração teórica. Ideológico, aqui, parece ser colocado de modo  
pejorativo, remetendo para uma defesa insustentada, e até certo ponto hipócrita, das  
instituições burguesas. Não obstante suas (superficiais) críticas à Austin pautada na  
suposta falta de consideração dos elementos de cunho moral na constituição do  
estado, Maine adere fortemente à teoria da soberania. Chega a dizer que a  
determinação de soberania deve preceder necessariamente ao direito é uma das  
afirmações de Austin que são “proposições evidentes por si mesmas” por ser obtida  
agrupando todas as formas de governo e destruindo-as de seus atributos específicos  
(exceto a força coercitiva, comum a todos eles):  
Por outro lado, as <<afirmações>> de Austin tornam-se  
<<proposições evidentes por si mesmas>> na medida em que se  
reconheceu que <<em seu sistema a determinação da soberania deve  
necessariamente preceder ao Direito>>, quando se entendeu < << >  
que a ideia de soberania de Austin é obtida agrupando mentalmente  
todas as formas de governo depois de despojá-lo de todos os outros  
atributos, exceto a força coercitiva>> e [aqui as orelhas do burro  
aparecem novamente] < << >quando alguém compreendeu  
completamente a ideia de que, pela própria natureza do caso, as  
deduções extraídas de um princípio abstrato nunca se mostram  
completamente realizadas nos fatos. (362 <: 323 ss.>) (MARX, 1988,  
p. 290 tradução livre, grifos nossos)17  
As “orelhas de burro” de Maine aparecem no momento que diz: “quando  
alguém compreendeu completamente a ideia de que, pela própria natureza do caso,  
as deduções extraídas de um princípio abstrato nunca se mostram completamente  
realizadas nos fatos”. Para Maine, as situações concretas nas quais a teoria da  
17  
En cambio las <<afirmaciones>> de Austin se convienen en <<proposiciones evidentes por sí  
mismas>> en cuanto se ha reconocido que <<en su sistema la determinación de la soberanía debe  
preceder necesariamente a la del Derecho>>, cuando se ha comprendido < << >que la idea que tiene  
Austin de la soberanía se obtiene agrupando mentalmente todas las formas de gobierno después de  
haberlo despojado de todo otro atributo menos la fuerza coactiva>> y [aquí asoman de nuevo las orejas  
de burro] < << >cuando uno se ha penetrado bien de la idea que, por la misma naturaleza del caso,  
las deducciones sacadas de un principio abstracto no se muestran nunca completamente realizadas en  
los hechos. (362 <: 323 ss.>) (MARX, 1988, p. 290)  
Daggen werden d. “assertions” des Austin “self evident propositions”, sobld man weiss dass “in his  
system the determination of Sovereignty ought to precede the determination of Law”, it being once  
understood that the Austinian conception of Sovereignty has been reached through mentally uniting all  
forms of Government in a group by conceiving them to be stripped of every attribute except coercive  
force”, and (hier zeigt sich wieder der Eselsfuss) when it is steadily born(e) in mind that the deductions  
from an abstract principle are never from the nature of the case completely exemplified in facts.” (362)  
(MARX, 1974, p. 330)  
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Marx e a crítica ao assim chamado “método” dos juristas analíticos  
soberania não se aplica não a invalidam, pois um princípio abstrato não precisa se  
realizar na realidade. Essa afirmação é absurda, de modo que o que define a validade  
de uma abstração é sua razoabilidade conforme a realidade concreta, do contrário  
tenta-se moldar a realidade para fazê-la caber em princípios abstratos, distorcendo-a.  
Assim, ao admitir que a teoria da soberania é insuficiente para explicar certas  
conformações sociais, Maine não percebe que está expondo sua própria fragilidade  
em sua falta de capacidade de explicar a realidade em sua complexidade.  
Em suma, a teoria da soberania é uma das proposições autoevidentes que  
conformam o que Marx chama ironicamente de dogmas de Austin, conforme exposto  
no seguinte trecho:  
<[>Outros dogmas de Austin:<]> <<Jurisprudência é a ciência do  
direito positivo (Positive Law). As leis positivas (Positive Laws) são  
ordens dirigidas pelos soberanos aos seus súditos, impondo-lhes um  
dever, ou uma condição de obrigação, e ameaçando-os com sanção  
ou punição em caso de desobediência às suas ordens. Um direito  
(Right) é a faculdade ou poder conferido pelo soberano a certos  
membros da comunidade para aplicar a sanção a outro sujeito que  
não cumpre um dever>> (362 <: 324). (MARX, 1988, p. 290 –  
tradução livre, grifos nossos).18  
Ressaltamos a diferença entre direito como law que denota um caráter mais  
objetivo do direito, vinculado à lei (law também pode significar lei dependendo do  
contexto); e direito como right, que destaca seu caráter subjetivo. O conjunto desses  
dogmas e de suas consequências seriam o que o autor das Lectures chama de  
“método” dos juristas analíticos:  
<[>Todas essas trivialidades pueris a autoridade suprema é quem  
tem o poder de se impor, as leis positivas são ordens da autoridade  
aos seus súditos; com ele impõe obrigações a esses súditos e isso é  
um dever, e ameaça com punições a desobediência às ordens; a lei é  
o poder que transfere autoridade a certos membros da sociedade para  
que eles castiguem os membros da sociedade que agem contra o seu  
dever essa infantilidade e muito mais, nem mesmo um Hobbes foi  
capaz de extrair da mera teoria do poder soberano. E esse  
dogmatismo seriamente pregado por John Austin é chamado por  
18  
<[>Otros dogmas de Austin:<]> <<La jurisprudencia es la ciencia del Derecho positivo. Las leyes  
positivas son órdenes dirigidas por los soberanos a sus súbditos, imponiéndoles un deber o la condición  
de obligados a  
una obligación, y amenazándoles con una sanción o castigo, caso de desobediencia a sus órdenes. Un  
derecho es la facultad o poder conferido por el soberano a ciertos miembros de la comunidad para  
aplicar la sanción a otro súbdito que no cumple un deber>>. (362 <: 324) (MARX, 1988, p. 290)  
Weitere Dogmen des Austin: “Jurisprudence is the science of Positive Law. Positive Laws are Commands,  
addressed by Sovereigns to their Subjects, imposing a Duty, or condition of obligedness, or obligation,  
on those Subjects, and threatening a Sanction, or Penalty, in the event of disobedience to Command. A  
Right is the faculty or power conferred by the Sovereign on certain members of the community to draw  
down the sanction on a fellow-subject violating a Duty.” (362) (MARX, 1974, pp. 330-1)  
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Maine de <<método>> dos juristas analíticos, muito análogo àquele  
seguido pela matemática e economia política e estritamente científico!  
Em tudo isso se trata apenas do aspecto formal, que sempre <é>  
naturalmente o principal para um jurista <]>. (MARX, 1988, p. 290 –  
tradução livre)19  
Os dogmas são, em linhas gerais, os pressupostos e as consequências da teoria  
da soberania, sejam eles: “a autoridade suprema é quem tem o poder de se impor, as  
leis positivas são ordens da autoridade aos seus súditos; com tal poder impõe  
obrigações a esses súditos e isso é um dever, ameaçando com punições a  
desobediência às ordens; o direito [right] é o poder que transfere autoridade a certos  
membros da sociedade para que eles castiguem os membros da sociedade que agem  
contra o seu dever”. Ou seja, todos os aspectos que vinham sendo desenvolvidos  
acerca da explicação austiniana para a existência do Estado e para a legitimidade do  
direito.  
Marx traz que o que Maine chama “método” dos juristas analíticos não são mais  
que trivialidades pueris, dogmatismos pregados por Austin, e seria então “muito  
análogo àquele seguido pela matemática e economia política e estritamente científico”.  
Conforme exposto anteriormente, apesar de Maine frequentemente reforçar o caráter  
supostamente científico das elaborações dos juristas analíticos, Marx não vê nada de  
científico em suas proposições, criticando inclusive a concepção que eles apresentam  
de ciência. Temos, então, que “estritamente científico”, aqui, está colocado de forma  
irônica, ao menos no que diz respeito especificamente ao método dos juristas  
analíticos.  
Nesse sentido, Marx parece apontar que tanto os economistas políticos quanto  
19 <[>Todas estas trivialidades pueriles la suprema autoridad es quien tiene el poder de imponerse,  
las leyes positivas son órdenes de la autoridad a sus súbditos; con ello impone a estos súbditos  
obligaciones y esto es un deber, y amenaza con castigos la desobediencia a las órdenes; el derecho es  
el poder que transfiere la autoridad a ciertos miembros de la sociedad para que castiguen a los  
miembros de la sociedad que obren contra su deberesta puerilidad y mucho más no se la ha podido  
sacar ni siquiera un Hobbes de la mera teoría del poder soberano. ¡Y este dogmatismo seriamente  
predicado por John Austin lo llama Maine el <<método>> de los juristas analíticos, muy análogo al que  
siguen las matemáticas y la economía política y estrictamente científico! / En todo esto sólo se trata del  
aspecto formal. que siempre <es> naturalmente, lo principal para un jurista <]>. (MARX, 1988, p. 290)  
Alle diese kindischen Trivialitäten - Höchste Obrigkeit ist wer d. Macht hat zu zwingen, Positive Gesetze  
sind Befehle der Obrigkeit an ihre Unterthanen; sie legt dadurch diesen Unterthanen Verpflichtungen  
auf, u. dies ist Pflicht, u. droht mit Strafe für Ungehorsam gegen d. Befehl; Recht ist die Macht welche d.  
Obrigkeit gewissen Gliedern der Gesellscft überträgt pflichtwidrig handelnde Gesellscftsglieder zu  
strafen - dies Kindische, u. viel mehr kann selbst ein Hobbes aus der blossen obrigkeitlichen  
Gewaltstheorie nicht herausklauben - dies von John Austin ernsthaft doctrinair gepredigte nennt Maine  
eine “Procedur” der analytischen Juristen, die closely analog sei mit der in Mathematik u. d. Politischen  
Oekonomie befolgten u. "strictly scientifick”! | Alles dreht sich hier nur um d .formelle Seite, die natürlich  
für einen Juristen überall d. Hauptsache. (MARX, 1974, p. 331)  
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Marx e a crítica ao assim chamado “método” dos juristas analíticos  
os juristas analíticos pretendiam trazer um caráter de cientificidade para suas  
elaborações teóricas, que não necessariamente se realiza de fato (ou, ao menos, não  
no último caso). Os juristas analíticos ainda dão destaque para os aspectos formais,  
ou seja, para o papel do próprio direito. Além de que, conforme exposto anteriormente,  
tomariam como ciência a mera classificação e a definição. A aproximação de ambos os  
métodos com a matemática também parece ter a ver com o critério de cientificidade  
da matemática, que funciona para a matemática, mas não necessariamente para outras  
áreas em linhas gerais, trata-se de partir de axiomas gerais para chegar a conclusões  
lógicas particulares de modo dedutivo. Para entender melhor a aproximação por  
analogia entre o método dos juristas analíticos e o método da economia política,  
traremos alguns elementos da crítica ao método da economia política conforme  
elaborados por Marx em seus manuscritos econômicos de 1857-58.  
O método da economia política e o método dos juristas analíticos  
Nos manuscritos econômicos de 1857-1858, ou esboços da crítica da  
economia política que ficaram conhecidos como Grundrisse, Marx traz uma crítica ao  
método da economia política, começando por uma crítica a um de seus pontos de  
partida, mais comum no século XVII, a população:  
Parece ser correto começarmos pelo real e pelo concreto, pelo  
pressuposto efetivo, e, portanto, no caso da economia, por exemplo,  
começarmos pela população, que é o fundamento e o sujeito do ato  
social de produção como um todo. Considerado de maneira mais  
rigorosa, entretanto, isso se mostra falso. A população é uma  
abstração quando deixo de fora, por exemplo, as classes das quais é  
constituída. Essas classes, por sua vez, são uma palavra vazia se  
desconheço os elementos nos quais se baseiam. P. ex., trabalho  
assalariado, capital etc. Estes supõem troca, divisão do trabalho, preço  
etc. O capital, p. ex., não é nada sem o trabalho assalariado, sem o  
valor, sem o dinheiro, sem o preço etc. Por isso, se eu começasse pela  
população, esta seria uma representação caótica do todo e, por meio  
de uma determinação mais precisa, chegaria analiticamente a  
conceitos cada vez mais simples; do concreto representado [chegaria]  
a conceitos abstratos [Abstrakta] cada vez mais finos, até que tivesse  
chegado às determinações mais simples. Daí teria de dar início à  
viagem de retorno até que finalmente chegasse de novo à população,  
mas desta vez não como a representação caótica de um todo, mas  
como uma rica totalidade de muitas determinações e relações. (MARX,  
2011, p. 54)  
Para Marx, parece ser necessário um ponto de partida real e concreto, um  
pressuposto efetivo. Logo, alguns economistas políticos tomam, por exemplo, a  
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população20 como um conceito base, como sujeito do ato social de produção, o que  
parece coerente com a ideia do ponto de partida concreto. No entanto, a população  
não é uma categoria tão simples quanto aparenta ser, mas uma abstração grotesca,  
irrazoável, uma “representação caótica do todo”, de modo que pressupõe uma série  
de outras categorias que são ocultadas quando a tomamos como ponto de partida,  
fazendo com que as conclusões tomadas com esta base incidam em erro.  
Partindo da população, duas vias se colocam: ou percorre-se um caminho até  
conceitos cada vez mais abstratos até que chegue novamente a determinações simples,  
ou vai além e retorna novamente à população, sendo forçado a explicar as  
determinações que a conformam enquanto totalidade. A primeira via corresponde ao  
método da economia política, enquanto a segunda é o método cientificamente correto:  
A primeira via foi a que tomou historicamente a economia em sua  
gênese. Os economistas do século XVII, p. ex., começam sempre com  
o todo vivente, a população, a nação, o estado, muitos estados etc.;  
mas sempre terminam com algumas relações determinantes, abstratas  
e gerais, tais como divisão do trabalho, dinheiro, valor etc., que  
descobrem por meio da análise. Tão logo esses momentos singulares  
foram mais ou menos fixados e abstraídos, começaram os sistemas  
econômicos, que se elevaram do simples, como trabalho, divisão do  
trabalho, necessidade, valor de troca, até o estado, a troca entre as  
nações e o mercado mundial. O último é manifestamente o método  
cientificamente correto. O concreto é concreto porque é a síntese de  
múltiplas determinações, portanto, unidade da diversidade. Por essa  
razão, o concreto aparece no pensamento como processo da síntese,  
como resultado, não como ponto de partida, não obstante seja o  
ponto de partida efetivo e, em consequência, também o ponto de  
partida da intuição e da representação. (MARX, 2011, p. 54)  
O concreto é a síntese de múltiplas determinações, a unidade da diversidade, e  
como o pensamento é um processo de síntese, o concreto aparece no pensamento  
como um resultado, não como ponto de partida, não obstante seja o ponto de partida  
efetivo, justamente na medida em que “o todo como um todo de pensamentos, tal  
como aparece na cabeça, é um produto da cabeça pensante que se apropria do mundo  
do único modo que lhe é possível, um modo que é diferente de sua apropriação  
artística, religiosa e prático-mental” (MARX, 2011, p. 79). Ou seja, em geral o todo  
aparece como produto do pensamento, como resultado, não como início, de modo que  
a economia política se mantém presa a este modo superficial de olhar para a  
20  
O exemplo escolhido por Marx é uma referência aos fisiocratas (antecessores da economia política  
em seu sentido clássico, e neste textos também considerados parte da economia política) que não raro  
tomavam a população (dentre outros conceitos, como: o todo vivente, a nação, o estado etc.) como  
ponto de partida.  
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Marx e a crítica ao assim chamado “método” dos juristas analíticos  
totalidade.  
Nesse sentido, J. Chasin expõe acertadamente que:  
assim, é arguido que partindo do todo imediato, manifesto por seus  
complexos parciais (cidade, campo, produção, população, classes etc.),  
desemboca-se numa “representação caótica do todo”, pois a  
totalidade ou cada parte abordada redunda em simples abstração, se  
desconsiderados os vetores que a integram, por exemplo, a população  
sem as classes (CHASIN, 2009, pp. 126-7).  
Consequentemente, partindo do concreto como síntese de múltiplas  
determinações, desembocamos em uma representação da totalidade caótica, que não  
compreende todos os fatores que a integram. O que Marx denomina como “método  
cientificamente exato” toma as abstrações (razoáveis) como ponto de partida da  
elaboração teórica, e concreto como resultado (cf. CHASIN, 2009, p. 127), de modo  
antagônico ao que é feito pela economia política. As abstrações, é claro, não surgem  
do nada, elas partem do não-abstrato, do concreto, que é o “ponto de partida efetivo,  
e, em consequência, também o ponto de partida da intuição e da representação”. Ou  
seja, Marx defende aqui dois movimentos essenciais: do concreto imediato e caótico  
chega-se às abstrações razoáveis, e delas, então, retornamos ao concreto em toda a  
sua multiplicidade de determinações evidenciadas, e assim o concreto imediato se  
torna concreto mediado (pelas categorias abstratas) e não mais caótico.  
A razoabilidade das abstrações se coloca na medida em que destaca aspectos  
reais “comuns às formas temporais de entificação dos complexos fenomênicos  
considerados” (CHASIN, 2009, p. 124), a saber, revela aquilo que é comum ao todo  
do que se refere, sem obscurecer a diferença específica dos complexos que o compõe.  
A produção em geral, por exemplo, é, para Marx, uma abstração razoável:  
A produção em geral é uma abstração, mas uma abstração razoável,  
na medida em que efetivamente destaca e fixa o elemento comum,  
poupando-nos assim da repetição. Entretanto, esse Universal, ou o  
comum isolado por comparação, é ele próprio algo multiplamente  
articulado, cindido em diferentes determinações. Algumas  
determinações pertencem a todas as épocas; outras são comuns  
apenas a algumas. [Certas] determinações serão comuns à época mais  
moderna e à mais antiga (MARX, 2011, p. 56).  
E sua razoabilidade expressa aquilo que há em comum à produção universal,  
mas não pode ser sinônimo de tomar a produção capitalista como uma produção  
eterna, como fazem os economistas modernos:  
As determinações que valem para a produção em geral têm de ser  
corretamente isoladas de maneira que, além da unidade decorrente  
do fato de que o sujeito, a humanidade, e o objeto, a natureza, são os  
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mesmos , não seja esquecida a diferença essencial. Em tal  
esquecimento repousa, por exemplo, toda a sabedoria dos  
economistas modernos que demonstram a eternidade e a harmonia  
das relações sociais existentes. (MARX, 2011, p. 57)  
Marx reforça a historicidade dos fenômenos sociais ao se contrapor ao método  
da economia política, a partir dos economistas do século XVII, explicitando que “as  
próprias categorias mais abstratas, apesar de sua validade para todas as épocas –  
justamente por causa de sua abstração , na determinabilidade dessa própria  
abstração, são igualmente produto de relações históricas e têm sua plena validade só  
para essas relações e no interior delas” (MARX, 2011, pp. 83-4). Os economistas  
políticos, tomando como exemplo aqueles do século XVII, como Marx coloca, não  
compreendem que “categorias expressam formas de ser, determinações de existência,  
com frequência somente aspectos singulares, dessa sociedade determinada, desse  
sujeito” (MARX, 2011, p. 59).  
Desse modo, Marx, ao criticar o método da economia política, defende um  
procedimento oposto, que parte de abstrações razoáveis até o concreto como  
resultado, podendo então voltar-se para a articulação entre as diferentes categorias,  
de modo a verificar a compatibilidade a partir de suas diferenças específicas. Nas  
palavras de Chasin:  
Desde logo porque a articulação, fase conclusiva do processo  
analítico, é também uma exigência de delimitação, levando em conta  
que as abstrações razoáveis, umas em face das outras, têm de ser  
compatibilizadas entre si, o que implica recíprocas determinações  
delimitadoras, pelas quais são estabelecidas as proporções com que  
integram a reprodução final do objeto investigado. (CHASIN, 2009, p.  
130)  
Não iremos mais além no debate acerca da existência ou inexistência de uma  
questão do método no pensamento de Marx21, apenas pontuando elementos de sua  
crítica ao método da economia política, que é importante para nós na justamente  
medida em que é comparada ao chamado “método” dos juristas analíticos.  
De uma forma semelhante aos economistas políticos em geral, os juristas  
analíticos partem de categorias irrazoáveis, que pressupõem uma série de outras  
categorias, ocultando-as, ainda que os primeiros consigam chegar a resultados  
científicos, por mais que limitados ao horizonte burguês, e os segundos não só não  
conseguem como representam, no máximo, uma repetição apologética dos primeiros.  
21 Para aprofundar no debate, ver Chasin (2009).  
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Marx e a crítica ao assim chamado “método” dos juristas analíticos  
Se os economistas políticos do século XVII, partem, por exemplo, da população; os  
segundos partem de uma ideia de príncipe ou soberano que possui súditos obedientes  
e emana ordens que preveem sanções. A população deixa de fora as classes, que  
deixam de fora o trabalho assalariado e o capital, que pressupõem troca, divisão do  
trabalho, preço, além de trabalho assalariado e valor. Vale mencionar que Smith e  
Ricardo, representantes da economia política clássica, não deixam essas categorias  
específicas de lado. Ao contrário, estabelecem certas relações históricas próprias da  
sociedade civil-burguesa como naturais. No próximo tópico, desenvolveremos as  
diferenças específicas entre fisiocracia, economia política clássica e economia vulgar,  
de modo a esclarecer o caráter de vulgarização presente na analogia com o método  
dos juristas analíticos.  
De modo semelhante ao exemplo, o soberano (que, para Marx, trata-se do  
estado em sua aparência), pressupõe a existência de relações de poder, de mando e  
obediência, que também pressupõem a separação dos interesses individuais do  
interesse comum, que também pressupõe a existência de classes sociais nas quais são  
colocados indivíduos com interesses em comum que se contrapõem entre si, e as  
classes pressupõem a divisão do trabalho, dentre outras condições econômicas em  
geral, considerando a historicidade das formas de apropriação, as quais estão expostas  
de forma mais detalhada nos Grundrisse.  
A teoria da soberania está, ainda, aquém da economia política, ocultando a  
gênese do estado e sua relação com as classes sociais e, portanto, também a produção  
e os fatores econômicos em geral. Para Marx, a teoria da soberania de Austin  
compreende o estado a partir de sua aparência, de sua dimensão mais superficial, e  
então coloca o soberano como algo acima da sociedade, de modo a inverter sujeito e  
predicado na relação entre estado e sociedade. Como em 1844 Marx já anunciava, do  
mesmo modo que na religião cristã o ser humano aparece como criatura e Deus como  
seu criador, sendo que esta relação decorre exatamente do oposto, a sociedade  
também cria o Estado, e não o contrário — e então “A crítica do céu transforma-se,  
assim, na crítica da terra, a crítica da religião, na crítica do direito, a crítica da teologia,  
na crítica da política” (MARX, 2013, p. 146). O ser humano é fundamento de si mesmo,  
e “não é um ser abstrato, acocorado fora do mundo. O homem é o mundo do homem,  
o estado, a sociedade” (MARX, 2013, p. 145). Os juristas analíticos incorrem neste  
mesmo erro, tratando o soberano como uma entidade quase religiosa, sobre-humana,  
ocultando suas bases sociais.  
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Não satisfeito, Maine tenta resolver as deficiências da teoria da soberania  
adicionando elementos de cunho moral como influências determinantes na atuação do  
soberano, ao que Marx acrescenta que são influências no máximo secundárias,  
derivadas, tratando-se sobretudo de influências econômicas que podem ter um modus  
moral existência. Além de que, conforme vimos no tópico anterior, o destaque da moral  
para explicar o desenvolvimento do estado demonstra o caráter ideológico, no sentido  
pejorativo, de sua elaboração teórica, de modo que reduz toda a história do Estado e  
seu desenvolvimento a elementos morais.  
Como já tratamos, Marx também traça raciocínio semelhante ao que elabora  
nos Grundrisse ao tratar da forma como a teoria da soberania de Austin depende da  
existência de uma força que o jurista chama de diretamente aplicada ou diretamente  
percebida. Para nosso autor, essa noção pressupõe a existência de armamento, o qual  
pressupõe um progresso dos meios de produção tal que a produção não se volta  
somente para a subsistência, que já deve estar garantida (como meios para a pesca e  
para a caça), mas para a destruição e para a guerra. Assim, oculta-se também que a  
própria existência do soberano já pressupõe um estágio de desenvolvimento humano  
no qual foram criadas armas de guerra, as quais só são desenvolvidas após a  
elaboração de armas utilizadas para encontrar alimentos.  
Como vimos, Maine ainda tenta defender que as abstrações não precisam se  
adequar à realidade concreta, admitindo a existência de sociedades em que a teoria  
da soberania não se aplica. Então, ao invés de tomar isso como uma falha, Maine se  
vangloria por naturalizar aspectos do estado que aparecem em um determinado  
momento histórico por se tratar de um princípio abstrato que, portanto, não precisa  
se adequar à realidade como tal, eximindo-se da necessidade de explicar por que eles  
não se colocam em outras formas de sociedade.  
Diferente do realizado tanto pelos juristas analíticos quanto pelos economistas  
políticos, o mais próximo de um “método cientificamente exato” seria, então, o caminho  
no qual se toma o concreto enquanto ponto de partida efetivo até as abstrações  
razoáveis, a partir das quais se retorna ao concreto, só então ocupando-se da  
articulação entre as diferentes categorias; e não se trata, portanto, de um método em  
seu sentido rígido e estrito.  
Além da analogia entre o método dos juristas analíticos e aquele da economia  
política, temos também uma aproximação de ambos com a matemática, a qual  
podemos entender melhor após compreender também qual é suposto método da  
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Marx e a crítica ao assim chamado “método” dos juristas analíticos  
economia política. Diz Marx, conforme exposto: “E esse dogmatismo seriamente  
pregado por John Austin é chamado por Maine de <<método>> dos juristas analíticos,  
muito análogo àquele seguido pela matemática e economia política e estritamente  
científico!” (MARX, 1988, p. 290 – tradução livre). A partir de nossas reflexões,  
podemos inferir que a aproximação entre esses três métodos é a seguinte: todos  
partem, em geral, de um conceito (que se coloca enquanto um axioma) para então  
tomar conclusões de caráter dedutivo, ou seja, partir de um princípio, que é um dogma,  
do qual, a partir dele, tira-se um conjunto de derivações e conclusões.  
Nesse sentido, também é interessante pontuar uma aproximação com o que  
Marx trata no Livro III de O capital, “Aqui é válido o que diz Hegel com referência a  
certas fórmulas matemáticas, a saber, que aquilo que o senso comum considera  
irracional é racional, e o que ele considera racional é a própria irracionalidade” (MARX,  
2017a, p. 839). Aqui, Marx está falando como que, na efetividade, há categorias  
irracionais que operam em nosso cotidiano; vejamos o que ele diz logo antes para  
entender melhor seu contexto:  
A relação entre uma parte do mais-valor, a renda em dinheiro pois  
este é a expressão autônoma do valor e o solo é absurda e irracional,  
pois aqui se medem entre si grandezas incomensuráveis: por um lado,  
um valor de uso determinado, um terreno com tantos pés quadrados;  
por outro, valor, especialmente mais-valor. De fato, isso expressa  
apenas que, sob as condições dadas, a propriedade desses pés  
quadrados de solo capacita o proprietário a apoderar-se de uma  
quantidade determinada de trabalho não pago, que o capital realizou  
nos pés quadrados como um porco entre as batatas {neste ponto do  
manuscrito, lê-se entre parênteses, porém riscado: “Liebig”}. Prima  
facie, no entanto, a expressão é a mesma que se empregaria para falar  
da relação entre uma cédula de £5 libras e o diâmetro da Terra. As  
mediações das formas irracionais em que se apresentam e se resumem  
determinadas condições econômicas não importam nada aos agentes  
práticos dessas condições econômicas em sua atividade cotidiana, e  
estes, por estarem acostumados a se mover no interior delas, não  
ficam nem um pouco escandalizados com isso. Uma absoluta  
contradição não tem nada de misterioso para eles. Dentro das formas  
de manifestação que, abstraídas de seu contexto e tomadas  
isoladamente, são absurdas, eles se sentem tão à vontade quanto um  
peixe na água. Aqui é válido o que diz Hegel com referência a certas  
fórmulas matemáticas, a saber, que aquilo que o senso comum  
considera irracional é racional, e o que ele considera racional é a  
própria irracionalidade. (MARX, 2017a, p. 839)  
Nesse sentido, ao tratar da renda da terra e sua relação com o preço da terra,  
Marx chega até categorias que são irracionais, mas efetivas, ou seja, que medem  
grandezas incomensuráveis, não podendo ser expressas pela matemática, tal qual a  
relação entre uma cédula de £ 5 e o diâmetro da Terra, mas que atuam sobre a  
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realidade. A relação entre a renda em dinheiro e o solo é absurda, contraditória e  
irracional, mas é real e trata de categorias com as quais lidamos em nosso cotidiano.  
Nesse sentido, o senso comum não se escandaliza quando um proprietário de terra  
pode se apropriar de determinada quantidade de trabalho não-pago (uma parcela do  
mais-valor, expressa pela renda em dinheiro), somente por ser um proprietário passivo  
de determinado terreno com determinada quantidade de metros quadrados, mas isso  
não torna esta relação racional, muito menos passível de ser mensurada. Então, o que  
é considerado racional, muitas vezes é irracional; e o considerado irracional (como  
algumas fórmulas matemáticas), pode ser racional. De modo semelhante, para nós, em  
seus Cadernos, Marx não está traçando uma crítica à matemática ou a sua posição  
enquanto ciência, mas questionando o uso de determinações típicas de uma ciência  
não-empírica para uma análise da sociedade, na qual vigoram categorias que são  
irracionais, o que já impossibilita que a matemática compreenda relações sociais  
efetivas, sem retirar seu mérito para tratar daquelas que são, de fato, racionais.  
Não pretendemos nos estender, aqui, acerca de questões relativas à filosofia da  
matemática e a seus estudos doutrinais, como a discussão se os axiomas são ou não  
evidentemente verdadeiros (questionada sobretudo a partir do século XIX).  
Pretendemos demonstrar tão somente que a aproximação feita por Marx parece levar  
em consideração justamente o modo como tanto os economistas políticos quanto os  
juristas analíticos parecem tentar trazer uma forma de raciocínio matemática para a  
análise da sociedade, no sentido de partir de axiomas, os últimos inclusive utilizando-  
a para reforçar um caráter supostamente científico de sua elaboração teórica.  
Considerações finais  
Passaremos, agora, para algumas considerações finais, que não se colocam,  
rigorosamente, enquanto uma conclusão. Conforme coloca Chasin, neste momento  
“não caberia o que tradicionalmente é entendido por uma conclusão; no caso seria  
uma redundância empobrecida, pois não seria mais do que um simples resumo,  
enquanto a análise imanente propriamente dita, a seu plano, é conclusiva no seu  
próprio decurso” (CHASIN, 1978, p. 604). Nesse sentido, entendemos que as  
conclusões são elaboradas no curso da argumentação, e que cabe agora acrescentar  
apenas algumas observações que se relacionam com o texto, sem meramente resumi-  
lo.  
Ao longo de nossa exposição, demonstramos de que maneira existe, para Marx,  
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Marx e a crítica ao assim chamado “método” dos juristas analíticos  
uma analogia entre o método da economia política e o método dos juristas analíticos,  
conforme exposto nos Cadernos, a qual se coloca tendo em vista as categorias que  
são utilizadas enquanto ponto de partida efetivo em cada caso específico. Não  
obstante, acreditamos que há uma decadência na teoria dos juristas analíticos que não  
existe na economia política, ao menos em sua forma clássica. Conforme vimos, os  
juristas analíticos partem de categorias que pressupõem muito mais do que as  
categorias que são o ponto de partida da economia política, nem mesmo reconhecendo  
a influência dos fatores econômicos na formação do soberano. Ao tomar como  
fundamento a aparência do Estado já autonomizado ocultam não só todos os fatores  
econômicos, mas também diversos fatores da própria ordem política. Ou seja, ainda  
que o método dos juristas analíticos e o dos economistas políticos seja essencialmente  
o mesmo: partir de conceitos que se colocam enquanto dogmas para traçar conclusões  
dedutivas, os juristas analíticos utilizam este método partindo de uma representação  
caótica do todo mais geral que a economia política do século XVII, e mais próxima da  
economia vulgar, conforme veremos em seguida.  
Em A ideologia alemã, Marx e Engels tratam do jurista analítico Bentham como  
o primeiro filósofo que se coloca como defensor do modo de vida burguês como  
universal:  
pela primeira vez, em Bentham, no momento em que a burguesia,  
depois da Revolução Francesa e do desenvolvimento da grande  
indústria, não aparece mais como uma classe particular mas como a  
classe cujas condições são as condições de toda a sociedade. Depois  
de criadas as paráfrases sentimentais e morais que, nos franceses,  
formavam todo o conteúdo da teoria da utilidade, para o  
desenvolvimento ulterior dessa teoria faltava apenas saber como os  
indivíduos e as relações seriam utilizados, explorados. A resposta a  
essa questão já havia sido dada, nesse meio tempo, pela economia  
política; o único progresso possível se encontrava na incorporação do  
conteúdo econômico. Bentham consumou esse progresso. Na  
economia, porém, já se havia declarado que as principais condições  
da exploração, independentemente da vontade dos indivíduos, eram  
determinadas pela produção em geral e encontradas já prontas pelos  
indivíduos isolados. À teoria da utilidade não restava, assim, nenhum  
outro campo de especulação a não ser o da posição ocupada pelos  
indivíduos nessas grandes relações: o da exploração privada, por  
indivíduos isolados, de um mundo encontrado pronto (ENGELS; MARX,  
2007, pp. 398-9).  
Ou seja, para Marx e Engels, em Bentham o desenvolvimento burguês é tomado  
como o desenvolvimento da sociedade em geral, como um mundo encontrado pronto.  
Isso se dá a partir de um momento histórico em que a burguesia, após a Revolução  
Francesa, já está consolidada enquanto classe dominante. O jurista analítico traz,  
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assim, o ponto de partida do indivíduo atomizado, que se torna o ponto de partida da  
teoria burguesa. Nesse sentido, Bentham, em sua teoria da utilidade (ou utilitarismo),  
incorpora os elementos da economia política de modo a enfatizar o caráter da  
exploração privada, por indivíduos isolados. Os indivíduos aparecem como objetos a  
serem utilizados, maximizando o caráter da exploração a nível particular.  
Em O capital: crítica da economia política parte I: o processo de produção do  
capital, Marx explica o que é a teoria da utilidade de Bentham. Em suas palavras:  
Jeremy Bentham é um fenômeno puramente inglês. Mesmo sem  
excetuar nosso filósofo Christian Wolf, em nenhuma época e em  
nenhum país o lugar-comum mais simplório se difundiu com tanta  
convicção. O princípio da utilidade não é uma invenção de Bentham.  
Este se limitou a reproduzir, sem espírito, o que Helvetius e outros  
franceses do século XVIII haviam dito espirituosamente. Se, por  
exemplo, queremos saber o que é útil a um cachorro, temos de  
investigar a natureza canina. É impossível construir essa natureza a  
partir do “princípio da utilidade”. Aplicado ao homem, isso significa  
que, se quiséssemos julgar segundo o princípio da utilidade todas as  
ações, movimentos, relações etc. do homem, teríamos de nos ocupar  
primeiramente da natureza humana em geral e, em seguida, da  
natureza humana historicamente modificada em cada época. Bentham  
não tem tempo para essas inutilidades. Com a mais ingênua aridez,  
ele parte do suposto de que o filisteu moderno, e especialmente o  
inglês, é o homem normal. O que é útil para esse homem exemplar e  
seu mundo é útil em si e para si. De acordo com esse padrão, Bentham  
julga, então, o passado, o presente e o futuro. Por exemplo, a religião  
cristã é “útil” porque repudia religiosamente os mesmos delitos que o  
código penal condena juridicamente. A crítica da arte é nociva porque  
perturba o deleite que as pessoas honestas encontram em Martin  
Tupper etc. E foi com todo esse lixo que nosso bom homem, cuja  
divisa é nulla dies sine linea, encheu montanhas de livros. Tivesse eu  
a coragem de meu amigo H. Heine, chamaria o sr. Jeremy de gênio na  
arte da estupidez burguesa. [Nulla dies sine linea (nenhum dia sem  
uma linha): frase atribuída ao pintor Apeles (IV a. C.), que colocara  
para si a obrigação de trabalhar todos os dias em suas pinturas. (N.  
T.)] (MARX, 2017, p. 685)  
Ou seja, o princípio da utilidade parte do filisteu individual, em especial o inglês,  
e o toma como padrão de ser humano individual, e então toma este paradigma, tido  
como a natureza humana universal, para julgar tudo que é útil ou inútil, dado que o  
que é útil ao indivíduo, seria também útil em si. É nesse sentido que Bentham traz o  
ponto de partida do indivíduo atomizado, o qual posteriormente se popularizou na  
filosofia burguesa, e assim consuma o processo ideológico que vinha se conformando  
desde o nascimento da emergente sociedade civil-burguesa, o qual, já com a burguesia  
como a classe dominante, solidifica a defesa da burguesia enquanto como a classe  
cujas condições são as condições de toda a sociedade.  
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Marx chega a chamar Bentham de “oráculo insipidamente pedante e fanfarrão  
do senso comum burguês do século XIX” (MARX, 2017, p. 684). Não iremos nos  
aprofundar na crítica feita por Marx a Bentham. O que nos interessa aqui é que,  
primeiramente, a história não é colocada na teoria do direito dos juristas analíticos,  
seja em Bentham ou em Austin. A escola analítica do direito já nasce trazendo uma  
naturalização do modo de vida burguês, no caso de Bentham, ao partir do filisteu  
individual; de Austin, com sua teoria da soberania e do estado como aglomeração de  
patriarcas; e de Maine, como sucessor destas ideias. Ainda que a jurisprudência  
analítica tenha um método análogo ao da economia política, já pressupõe um horizonte  
muito mais limitado de análise da realidade. Se a economia burguesa nasce, em seu  
período clássico, com uma análise genuína, ainda que limitada, da realidade, chegando  
a uma série de conclusões válidas, após a tomada do poder político pela burguesia na  
Inglaterra e na França, ela abandona seu caráter científico:  
Na França e na Inglaterra, a burguesia conquistara o poder político. A  
partir de então, a luta de classes assumiu, teórica e praticamente,  
formas cada vez mais acentuadas e ameaçadoras. Ela fez soar o dobre  
fúnebre pela economia científica burguesa. Não se tratava mais de  
saber se este ou aquele teorema era verdadeiro, mas se, para o capital,  
ele era útil ou prejudicial, cômodo ou incômodo, se contrariava ou não  
as ordens policiais. O lugar da investigação desinteressada foi  
ocupado pelos espadachins a soldo, e a má consciência e as más  
intenções da apologética substituíram a investigação científica  
imparcial. (MARX, 2017, p. 86)  
Ou seja, há um processo de deterioração contínua da economia política, na qual  
a apologética vai substituindo a cientificidade. Para Vitor Sartori, nesse sentido, o  
método dos juristas analíticos partiria, a rigor, da economia política já vulgarizada:  
O tom de Marx é bastante duro, portanto: [...] Austin, por sua vez,  
traria somente o “método dos juristas analíticos”, e este, em verdade,  
seria “muito análogo” àquele da economia política; mas com um  
detalhe importante: ele se voltaria somente a seu elemento  
apologético, já que a gênese tratada por meio de robinsonadas  
pelos economistas políticos (cf. MARX, 2011) nunca chega a ser uma  
preocupação do autor que se coloca como alguém central à teoria do  
direito. Ou seja, para que sejamos rigorosos, pode-se dizer que, de  
acordo com Marx, a economia política que fornece o seu procedimento  
a Austin já é apologética, tratando-se da economia vulgar. [...] Trata-  
se, portanto, do desenvolvimento de uma teoria em consonância com  
o pior das formas ideológicas que aparecem como centrais ao  
desenvolvimento da sociedade capitalista: o caráter a-histórico seria  
patente, bem como o procedimento “vulgar” e unilateral. (SARTORI,  
2018 p. 203)  
Para entender um pouco mais essa afirmação, e de que modo “a economia  
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política que fornece o seu procedimento a Austin já é apologética, tratando-se da  
economia vulgar”, devemos primeiro entender a diferença traçada pelo próprio Marx  
entre economia política clássica, economia vulgar e apologética. A primeira,  
representada pelos economistas clássicos como Adam Smith e Ricardo, detém um  
caráter científico, ainda que restrito ao horizonte burguês. As demais não são  
científicas. A economia vulgar, representada principalmente por Bastiat, já contém em  
si um elemento apologético, ainda que não se restrinja à pura e simples apologia da  
sociedade civil-burguesa. A economia apologética em seu sentido estrito é  
representada por Thomas Robert Malthus.  
Acerca da diferença entre economia política e economia vulgar, Marx expõe:  
Para deixar esclarecido de uma vez por todas, entendo por economia  
política clássica toda teoria econômica desde W. Petty, que investiga  
a estrutura interna das relações burguesas de produção em  
contraposição à economia vulgar, que se move apenas no interior do  
contexto aparente e rumina constantemente o material há muito  
fornecido pela economia científica a fim de fornecer uma justificativa  
plausível dos fenômenos mais brutais e servir às necessidades  
domésticas da burguesia, mas que, de resto, limita-se a sistematizar  
as representações banais e egoístas dos agentes de produção  
burgueses como o melhor dos mundos, dando-lhes uma forma  
pedante e proclamando-as como verdades eternas. (MARX, 2017, p.  
156)  
Isto é, enquanto a economia política clássica investiga a estrutura interna das  
relações burguesas de produção, a economia vulgar se mantém meramente no âmbito  
das aparências, de modo que perde seu caráter científico. A economia vulgar  
pressupõe a existência da economia política e representa uma deterioração da  
produção burguesa, que destaca elementos fornecidos pela economia política, e os  
transforma em dogmas, apresentando representações medíocres e sistematizadas dos  
agentes de produção burgueses como um mundo ideal. Logo, como coloca Cotrim,  
Marx critica a economia política, mas sua crítica “reconhece o estatuto científico da  
economia política no interior de seu limite ou, o que é o mesmo, do patamar de  
possibilidade delimitado pela perspectiva de classe, pelo horizonte burguês” (COTRIM,  
s/d, p. 13).  
Nesse sentido, nem toda defesa da sociedade civil-burguesa é meramente  
apologética. Ricardo, por exemplo, defende o capitalismo a partir do interesse do  
desenvolvimento das forças produtivas, que coincide com o interesse da burguesia  
industrial:  
Marx escreve: “Com razão para seu tempo, Ricardo considera o modo  
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de produção capitalista o mais vantajoso para a produção em geral, o  
mais vantajoso para a geração de riqueza. Quer a produção pela  
produção, e está certo” (TMV I, p. 549). A razão e a correção de  
Ricardo, restritas historicamente, expressam que seu ponto de partida,  
o princípio ao qual subordina sua investigação, é científico, na visão  
de Marx. Na medida em que desenvolve o seu princípio, a investigação  
de Ricardo produz resultados científicos, ainda que estes expressem  
uma defesa dos interesses capitalistas. Por exemplo, quando Ricardo  
justifica a exploração da classe trabalhadora em nome da ampliação  
da riqueza em geral (mas que de fato é apropriada pelas classes  
dominantes), isto é parte de sua ciência, não de qualquer tese vulgar  
ou apologética (COTRIM, s/d, p. 14).  
O procedimento adotado por Ricardo, então, ainda que limitado e passível de  
críticas, detém um caráter científico. Ele se diferencia não somente da economia vulgar,  
que se mantém no nível das aparências e dogmatiza contribuições de seus  
predecessores, mas também da mera apologética, que apresenta uma defesa do  
capitalismo como finalidade.  
Por outro lado, vale mencionar que já Malthus, por exemplo, é nada mais que  
um plagiador e um apologeta, que frequentemente faz uso de malabarismos teóricos  
para “tirar conclusões agradáveis a seus protetores” (MARX, 1980, p. 1.069). Malthus  
representa um retrocesso para a economia, procurando “fazer a economia recuar às  
ideias anteriores a Ricardo e mesmo a Smith e aos fisiocratas” (MARX, 1980, p. 1.071).  
Diz Marx:  
O livro de Malthus On Population, de caráter panfletário, atacava a  
revolução francesa e as ideias de reforma na mesma época na  
Inglaterra (Godwin etc.). Era uma apologia da miséria das classes  
trabalhadoras. Teoria plagiada de Townsend etc.  
Seu Essay on Rent, de tom panfletário, era a favor dos donos as terras  
e contra o capital industrial. Teoria de Anderson. Em seus Princ. of Pol.  
Ec. polemizava em defesa dos interesses dos capitalistas, contra os  
trabalhadores, e em prol dos interesses da aristocracia, da Igreja, dos  
devoradores de impostos, dos serviçais, etc., contra os capitalistas.  
Teoria extraída de A. Smith. É lamentável o que ele mesmo cria. Ao  
desdobrar a teoria tem por base Sismondi. (MARX, 1980, p. 1.116).  
É nesse sentido que Cotrim explica a diferença entre as teorias vulgares  
daquelas meramente apologéticas:  
As teorias vulgares não constituem conhecimento científico por não  
romperem o nível da aparência; as apologéticas, mais do que simples  
expressões sem conteúdo científico, são elaboradas em prol da defesa  
de classes sociais específicas, subordinando a pesquisa científica a  
interesses alheios a ela. (COTRIM, s/d, p. 1)  
Logo, retomando nosso raciocínio anterior, é a partir deste processo de  
derrocada do pensamento econômico, conforme colocado por Marx, que devemos  
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entender a associação feita por Sartori entre o método dos juristas analíticos e a  
economia vulgar, mais ainda que a economia política entendida em seu período  
clássico. Nesse sentido, acrescenta, com base nos trechos analisados por nós dos  
Cadernos etnológicos:  
Segundo Marx, o caso dos “juristas analíticos” é, porém, muito pior:  
conforma-se como uma teoria em que a ausência de um  
desenvolvimento histórico, seja ele mistificado ou unilateral, é tido  
como a quintessência da “cientificidade” e, deste modo, há um  
elemento apologético calcado na ausência total de crítica diante da  
historicidade da atual sociedade bastante consciente e que se  
manifesta de modo direto em autores como Austin.  
De acordo com Marx, eles deixam de lado “elementos importantes”,  
por vezes, “de importância capital” e, com isso, isolam de modo  
abstrato e arbitrário um elemento da sociabilidade, no caso, “aquilo  
de comum no uso do poder”, e vêm a tratar do estado e do direito  
como algo que, tanto em relação à sociedade quanto no que diz  
respeito ao desenvolvimento histórico, aparecem como por si  
subsistentes. Austin e Bentham desenvolvem seu método  
“estritamente científico” deixando de lado “todos os elementos que  
dirigem a ação humana, com exceção da força diretamente aplicada”  
e, para Marx, isto é justamente o que caracteriza a apologia do  
existente.  
Para o autor de O capital, a “força diretamente aplicada” – que é  
isolada de modo abstrato pelos “juristas analíticos” –, certamente, não  
poderia ser deixada de lado. No entanto, ela não é tanto o “princípio”  
de uma ciência ou o ponto de partida para a compreensão da real  
tessitura da sociedade; antes, ela é o ponto terminal de complexas  
relações entre a sociedade civil-burguesa e o estado e, neste sentido,  
não pode ser desconsiderada, mas, para compreendê-la, é necessário  
fazer o oposto do que fazem Bentham e Austin. Ou seja, o  
procedimento destes autores, como um todo, é rechaçado por Marx.  
Eles, é verdade, estão bastante relacionados à tradição inglesa, de que  
provêm grandes autores da economia política (Smith e Ricardo, por  
exemplo), mas também grandes expoentes da filosofia política.  
(SARTORI, 2018 p. 204)  
Essa compreensão está de acordo com o que vínhamos analisando até então,  
isto é, de que a analogia entre o método da economia política e dos juristas analíticos  
já pressupõe uma economia vulgarizada. Ou seja, ainda que o método, em si, seja o  
mesmo, os juristas analíticos ocupam um posto já inferior aos economistas políticos,  
pois já há neles um elemento apologético que não existia nos economistas políticos  
(incluindo os fisiocratas) quando partiam, por exemplo, da população para analisar a  
sociedade. Tal percepção também corrobora o fato de que a categoria da qual parte  
Austin, o soberano, oculta muito mais determinações do que as categorias das quais  
partem os economistas políticos. Assim, toma-se o estado e o direito como entidades  
permanentes e superiores à própria sociedade.  
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Desse modo, há uma diferença entre a teoria dos economistas políticos  
e a teoria dos juristas analíticos, a qual não pode ser explicada por uma diferença de  
método, que é o mesmo. A depender do momento histórico em que o pensador está  
inserido e de sua perspectiva de classe, o mesmo método (em seu sentido mais  
abrangente) pode estar envolvido em teses com caráter científico ou teses meramente  
apologistas de certos grupos da classe dominante (no caso de Maine, também da  
nação inglesa).  
Ou seja, o mesmo método em conjunturas diversas, para objetos diversos, pode  
gerar conclusões díspares (uma científica, outra não), e os juristas analíticos já estão  
em um momento no qual burguesia ocupa o poder político, em que “o lugar da  
investigação desinteressada foi ocupado pelos espadachins a soldo, e a má consciência  
e as más intenções da apologética substituíram a investigação científica imparcial”  
(MARX, 2017, p. 86). Se Ricardo, por exemplo, defende o capitalismo, pois o considera  
vantajoso para a produção em geral (e, como Marx disse, nesta perspectiva está  
correto), Maine e os juristas analíticos defendem as instituições burguesas como um  
fim em si mesmo, já num momento histórico em que não cabem mais ilusões sobre o  
domínio da burguesia, que já se efetivou, somente uma má-intenção apologética.  
Desse modo, estão mais próximos da economia vulgar, que já é apologética, do que  
da economia política clássica, que é científica. Isto corrobora a afirmação de Marx de  
que Bentham, e estendemos também para Austin e Maine, é nada mais que um “gênio  
na arte da estupidez burguesa”, como coloca Marx; ele não tem tempo para as  
“inutilidades” das quais se ocuparam os economistas políticos clássicos ao elaborar  
um pensamento propriamente científico, ainda que com as restrições do horizonte  
teórico burguês, e resolvem as lacunas de suas teses com “robinsonadas” mais ou  
menos elaboradas, na melhor das hipóteses.  
Ao longo de nosso artigo, procuramos demonstrar como a crítica marxiana à  
teoria do direito leva em consideração todos esses elementos, diretamente  
relacionados com o curso da ciência burguesa na história. Nesse sentido, acreditamos  
que os Cadernos são um texto altamente rico, e retornar a eles pode contribuir muito  
para a tradição de crítica marxista ao direito ainda hoje.  
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RIBEIRO, Renato Janine. Hobbes: o medo e a esperança. In.: WEFFORT, Francisco  
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SARTORI, Vitor Bartoletti. Marx e Hegel: três momentos da crítica marxiana ao direito.  
Verinotio - Revista on-line de Filosofia e Ciências Humanas, Rio das Ostras, ano XIII,  
v. 24, n. 1, abr./2018.  
Como citar:  
ANDRADE, Ana Carolina Marra de. Marx e a crítica ao assim chamado “método” dos  
juristas analíticos. Verinotio, Rio das Ostras, v. 29, n. 2, pp. 68-102; jul.-dez., 2024.  
Verinotio  
102 |  
ISSN 1981 - 061X v. 29, n. 2, pp. 68-102 jul.-dez., 2024  
nova fase